Em cinco anos, 774 mulheres que praticaram aborto passaram a responder criminalmente, diz DataJud
Uma mulher provoca um aborto, tem complicações e precisa ir ao hospital. Lá, os médicos desconfiam que a interrupção da gravidez não ocorreu de forma espontânea e a denunciam para as autoridades, quebrando o sigilo médico. A cena, segundo especialistas, não é incomum e se tornou responsável por parte dos processos contra o público feminino por esse tipo de crime. Também haveria denúncias de escolas e conselhos tutelares, dizem.
Dados compilados pela coluna no DataJud, plataforma do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mostram que 774 processos criminais foram protocolados entre 2020 e 2024 contra mulheres que abortaram ou que consentiram com a interrupção da gravidez. Na média, é como se fossem três ações a cada semana. O recorde foi em 2024, com 211 processos.
“Tem muitos profissionais de saúde que confundem seu papel e acham que devem fazer papel de polícia e investigar ou tentar obter provas através dos exames, muitas vezes, se eles encontram algum medicamento ou mesmo uma confissão”, explica Beatriz Galli, assessora sênior de Políticas e Advocacy do Ipas, uma ONG internacional que busca aumentar o acesso a abortos seguros e a contraceptivos no mundo.
O artigo 73 do Código de Ética Médica versa sobre o sigilo médico. O texto proíbe revelar informações obtidas na profissão “salvo por motivo justo, dever legal ou consentimento, por escrito, do paciente”.Play Video
Perfil das mulheres processadas por aborto
Além desses dados, há 1.171 autos por aborto praticado por terceiros, mais 160 de aborto qualificado, isto é, quando há complicações ou morte da gestante e outros 60 de abortamento como ato infracional, durante esses 5 anos. A soma alcança 2.165 processos.
“As pessoas que são punidas em caso de aborto são aquelas que estão em situação de maior vulnerabilidade, são as mulheres em situação mais frágil”, afirmou a diretora do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea), Guacira Cesar de Oliveira.
A socióloga complementa que até mesmo mulheres que sofrem um aborto espontâneo e vão a uma unidade de saúde chegam a ser, de certo modo, criminalizadas, como se o tivessem provocado. “Porque ela está abortando, ela está absolutamente suspeita de ser uma criminosa, uma pecadora. E ela é tratada como tal”, disse Oliveira.
O tempo médio de julgamento de aborto praticado por mulheres, de acordo com o DataJud, alcança 685 dias, o equivalente a quase 1 ano, 10 meses e 20 dias.
Esses processos não incluem aborto legal. O tema repercutiu nas últimas semanas, depois que o governo publicou uma resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda). O texto – que define diretrizes sobre esses casos em crianças e adolescentes vítimas de violência sexual – passou a vigorar após idas e vindas entre governo federal e movimentos conservadores, além de judicialização.
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