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 Foi justa a decisão do PT, acompanhada pelo PSOL e o PCdoB, de não comparecer à cerimônia de investidura do governo da extrema direita.
É o primeiro ato de uma Resistência que nas novas circunstâncias se afigura prolongada, complexa e sinuosa.
A situação política criada com a eleição do governo de extrema direita é por si só anormal, agravada pelo fato de ser um governo resultante da fraude e do engodo.
Sua posse não será uma cerimônia, uma festa, um protocolo, uma juramentação constitucional, mas o ato oficial de inauguração de uma nova época política. Ilusão pensar que em Primeiro de Janeiro procede-se a uma mera alternância de governo.
O regime de extrema direita é a imagem e semelhança das classes dominantes reacionárias e de potências imperialistas vorazes. Sua essência é antidemocrática, antipopular, antissocial, antinacional. Um regime de exceção, baseado na perseguição judicial e incriminação dos partidos progressistas, da luta social, que encontra sua maior expressão no encarceramento do maior líder popular da história nacional, por quem os politiqueiros de direita, procuradores, juízes e generais que agora assumem o posto de comando político nutrem medo pânico. Um regime que à partida se revela facinoroso, pela vocalização do titular e de seus principais porta-vozes, que incluem o extermínio da esquerda na estratégia de liquidação da democracia, aniquilação dos direitos sociais e vilipêndio da soberania nacional.
Um regime que enverga a fantasia da teocracia neopentecostal, de catolicismo anacrônico, com apego a valores vigentes em tempos idos. Por serem anacrônicos não se podem impor a não ser pela disseminação do ódio, a cizânia, ameaça, força, violência e morte.
Um regime que subordina o Brasil ao imperialismo estadunidense, isola a nação dos amigos que conquistou pelo mundo e situa-se na contramão das tendências contemporâneas.
Um regime de entrega das riquezas nacionais, do arrocho para o povo e desbragada cedência ao capital monopolista-financeiro nacional e internacional.
Assim, soam patéticas as críticas em setores da própria esquerda à decisão de não comparecer à posse. Baseiam-se num institucionalismo de fancaria, num democratismo de fachada, numa exaltação abstrata ao Estado, num culto ao social-liberalismo, em apelos inócuos ao diálogo, em considerações descontextualizadas sobre a nova correlação de forças, no reconhecimento passivo da derrota eleitoral. Só falta a congratulação efusiva e o beija-mão ao vencedor.
Antes de investir contra a unidade do campo democrático-popular oposicionista, pergunte-se primeiro quem rompeu a institucionalidade democrática, violou a Constituição, vilipendiou o Estado democrático de direito.
Sobre a correlação de forças e as táticas correspondentes, tempo haverá para debater e compreender a fundo as causas da derrota estratégica, tarefa que incumbe às forças da esquerda política e social, bom tema para as direções partidárias e a Frente Brasil Popular. Mas o ponto de partida do debate não pode ser a capitulação nem muito menos a adesão ao regime.
Este não conseguirá no médio e longo prazos sustentar sua “popularidade” apenas com denuncismo aos imimigos e demagogia. A usina de mentiras e tergiversações tende a se esboroar na medida em que o exercício do poder acarretar desgastes. Inevitavelmente, a contrarrevolução política e o retrocesso econômico e social engendrarão conflitos, e mesmo contradições internas, que por sua vez apresentarão novos desafios. É uma questão de tempo histórico. A esquerda consequente não se deve deixar levar pelo imediatismo nem a impaciência.
Popularidade de um momento pós-eleitoral, comparecimento em massa a uma cerimônia na Esplanada não significam necessariamente a expressão da vontade do povo. Seus interesses fundamentais, como as aspirações profundas dos trabalhadores e o sentimento patriótico emanam de outras determinações. Revelam-se quando menos se espera, percorrendo acidentados caminhos, sorteando ínvias encruzilhadas.
As forças que compõem a esquerda hoje são legatárias de um patrimônio histórico formado em longo percurso de vitórias e derrotas, fluxos e refluxos das lutas sociais. É o que lhes imprime caráter, identidade, responsabilidade, experiência e visão estratégica. Não é raro que a elas se incorporem marinheiros de primeira viagem, pretensos profissionais que deploravelmente mareiam ante a primeira procela. É que a luta política e social não cabe num protótipo de congressos estudantis nem nas coxias da vida parlamentar e governativa. Obedece a outras determinações que olhos pragmáticos não conseguem enxergar.
A decisão de não ir à posse foi, sim, madura e carregada de conteúdo. É o primeiro ato de uma longa Resistência. Sinaliza para a formulação de uma estratégia e tática de combate, em cuja execução serõo indispensáveis partidos de combate, frentes de combate, blocos de combate, bancadas parlamentares de combate e movimentos sociais de combate, como premissas para reconquistar a democracia e fazer valer os direitos do povo.
Se há alguém pretendendo costear e saltar o alambrado que o faça. A esquerda, não!
Por José Reinaldo Carvalho, para o Jornalistas pela Democracia