“Delação de Cid é como as Mil e Uma Noites de Sherazade: não termina nunca”, diz Lenio Streck ao DCM
O jurista Lenio Streck falou ao DCMTV de sua “carta ao Papai Noel”, em que ele pediu “uma bola, luvas e uma camisa de goleiro” na época da ditadura militar.
Neste fim de 2023, Streck pediu, na verdade, que os golpistas do 8 de janeiro sejam efetivamente punidos ou que a delação de Mauro Cid tenha um fim.
Ele acredita que a delação do ex-ajudante-de-ordens de Bolsonaro se transformou na obra “As Mil e Uma Noites”, clássico da literatura árabe composto por uma coleção de contos escritos entre os séculos XIII e XVI. O rei da Pérsia é traído pela esposa, manda matá-la e decide passar cada noite com uma mulher diferente, degolada na manhã seguinte.
Sherazade, a mais esperta, sobrevive contando uma história que nunca tinha fim. O jurista também questiona realmente se o ex-presidente será processado pela tentativa de golpe de Estado.
Veja os principais trechos da entrevista ao DCMTV.
Cadê a delação de Cid?
Meu pedido para o Papai Noel: queria que ele dissesse para nós quando é que vai terminar a delação do [Mauro] Cid.
Falo de como gosto do futebol e tenho esperança que isso tenha solução. A Polícia Federal diz que está trabalhando para concluir no início do próximo ano os inquéritos das fake news e das milícias digitais.
Minha grande preocupação é que você leva um ano para dizer que estão concluindo coisas de quatro anos atrás. Se leva um ano para tentar indiciar, vai levar 10 anos para tentar condenar?
Esse é um país chamado Brasil. Aqui as coisas acontecem de modo diferente. Passou um ano e Bolsonaro sequer é indiciado.
Cadê? Como está o andamento do processo do ex-ministro da Justiça que foi encontrado com uma minuta do golpe em casa? Nessa democracia de 210 milhões de habitantes, nós tivemos um ministro da Justiça, como esse Anderson Torres, que guardou uma minuta de golpe.
Depois surge a delação do [Mauro] Cid. É uma delação que funciona como a história das Mil e Uma Noites de Sherazade. Ela não termina nunca.
Passamos um ano todo e nenhum militar foi envolvido. Enquanto eles lançaram manifesto para vitaminar o 8 de janeiro golpistas.
Eu pago para algo acontecer na delação de Cid. Assim como eu pago para ver Sergio Moro perder realmente o mandato. Pago para ver Bolsonaro ser preso ou ser processado efetivamente.
Tô pagando para vê-lo condenado.
O meu realismo está sustentado em cinco séculos. O Brasil faz um esforço bárbaro para as coisas darem errado. Não é fácil. Como dizia Nelson Rodrigues: Para dar nisso é muito esforço e não é brincadeira. Precisa de muito esforço.
Gente, passou um ano. Um ano e o Bolsonaro anda por aí lépido e fagueiro pelo Brasil. Foi até o exterior. Ficou um mês nos Estados Unidos e depois foi até a posse e, por pouco, não saiu na foto do presidente Javier Milei em sua posse.
Nós temos no Brasil esse aparato todo desse sistema de Justiça, mas nem ouvimos os três militares para saber por que eles fizeram aquele manifesto do 11 de novembro para vitaminar uma tentativa de golpe.
Eu quero elementos que me façam ser otimista com o futuro desse sistema. Gostaria de elementos objetivos, porque olhando assim, não sei. A coisa não vai bem.
Lula quer fazer um ato pela democracia no próximo dia 8 de janeiro. É pouco do ponto de vista até da simbologia disso. Não se puniu de fato. Pegaram os bagrinhos só. O Bolsonaro está solto.
Isso é simplesmente confirmar a tese de que o Direito é só para pegar a mesma chinelagem.
Matérias plantadas
O Valor Econômico diz que o relacionamento de Lula com militares se estabilizou com a nomeação do general Tomás Paiva.
É matéria do agropop, do agro que é pop, né? Porque é plantada. Duvido que o Lula não desconfie desses militares. A ideia é mesmo passar essa sensação de que está tudo bem. Que o pior já foi.
Que os militares nunca mais vão tentar fazer nada contra a democracia brasileira. Não é assim.
Vou fazer uma pergunta para vocês: O disco de música do [ministro] Múcio vendeu bem?
E o agropop plantou uma notícia que o Aldo Rebelo está cotado para substituir o Múcio. O velho Aldo numa nota sem pé e nem cabeça. O Alckmin desmente isso e diz que nunca falou com o Múcio na vida.
O Múcio é eterno. Não vai sair nunca. E canta bem para caramba, né? Tem que reconhecer isso. O agro é pop e anda plantando tudo.
Influencers e o “caso Jéssica”
A moça se matou após uma notícia falsa. E o Whindersson Nunes é famoso porque, nesses tempos de idiotice e platitudes, como ninguém lê mais nada, o sujeito assim está feito.
É um bando de pessoas inúteis que fazem fofocas de celebridades. Que expõem as pessoas tipo aquele jornal The Sun, da Inglaterra.
Engraçado que, no caso também daquele escândalo das apostas, os influencers dizem que não obrigam ninguém a jogar.
Pierre Bourdieu abordava a violência simbólica. Autores clássicos jamais imaginariam como isso seria no futuro. Um autor [George Orwell] escreveu “1984”. Ele imaginou o Grande Irmão desse jeito, em uma sociedade vigiada.
Hoje você não pode mais nem ir ao banheiro que o sujeito sabe do tamanho. Quando vou ao banheiro, eu sempre escondo o smartphone. Vai que estejam filmando. Faço isso para eu não passar vergonha.
Tem que tirar o smartphone das pessoas. Aluno meu não pode ficar olhando isso.
Veja a live na íntegra.