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Foto: Marcello Casal/Agência Brasil

Riscos causados à sustentabilidade do SUS pelo PLP 136, de 2023

Na última terça-feira (19/9), foi remetido para apreciação do Senado o Projeto de Lei Complementar 136 (PLP 136) [1], de 2023, após sua aprovação na Câmara dos Deputados.

Embora inicialmente fosse um projeto destinado a tratar apenas do dever de a União compensar os estados pela perda de arrecadação de ICMS causada pela LC 194, ali foram introduzidas algumas alterações com grande potencial de risco à sustentabilidade do Sistema Único de Saúde (SUS).

Historicamente, não têm sido poucas as medidas de mitigação do financiamento constitucionalmente adequado do direito à saúde desde 1988.

Vale lembrar que, com a revogação do teto do despesas primárias pela Lei Complementar 200, de 2023, imediatamente deveria ter voltado a viger plenamente o piso federal em saúde de 15% da receita corrente líquida (RCL), previsto no artigo 198 da CF/1988.

Sob o regime dado pela Emenda 95, de 2016, havia apenas a garantia de correção monetária do quanto aplicado no ano anterior dos pisos em saúde e educação, na forma do artigo 110 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Quando são considerados especificamente os efeitos do teto para a política pública de saúde, foram acumuladas perdas relativas de cerca de R$ 70 bilhões no período de 2018 a 2022, as quais seguem até o momento sem qualquer reflexão consistente acerca da sua compensação.

Todavia causou perplexidade o agravamento da trajetória de instabilidade de custeio do SUS, isso porque, no apagar das luzes da tramitação do PLP 136, de 2023, na Câmara dos Deputados, foi incluído o artigo 15 [2] para alterar a base de cálculo do piso federal em ações e serviços públicos de saúde (ASPS).

Aludido dispositivo modificou o critério de aferição da própria RCL, para fins de fixação da base de cálculo sobre a qual incide o porcentual previsto no artigo 198 da CF; de modo que, ao invés de ser considerada a efetiva receita realizada ao final do exercício, passou a ser admitida a mera receita estimada na lei orçamentária vigente (Lei 14.535, de 13 de janeiro de 2023).

Trata-se de uma alteração deveras preocupante, na medida em que a estimativa da LOA para 2023 está severamente abaixo da receita que se projeta alcançar até o final do presente exercício fiscal.

Eis a razão pela qual o artigo 15 do PLP 136 afeta diretamente o valor da aplicação mínima federal em ASPS para o exercício de 2023, reduzindo-a ao lhe negar a incorporação proporcional do excesso de arrecadação havido ao longo do exercício.

Caso seja aprovada pelo Senado essa mudança procedimental no cômputo da base de cálculo do piso federal aplicável contingentemente apenas a 2023, o Congresso autorizará a União a empreender um piso em saúde pragmaticamente inferior ao que deveria.

Ainda que a regra da EC 86, de 2015, não tenha sido alterada pelo PLP 136 de modo direto, tal artigo 15 reduz a sua base de cálculo indiretamente.

Trata-se de uma forma sutil, mas poderosa de rebaixar o piso, porque cria um perigoso precedente de se subestimar a receita no Ploa, para afetar o valor do piso constitucional da saúde, sem o ônus político de mudá-lo concretamente.

Abre-se, com tal hipótese, o risco consistente de essa medida vir a ser reiteradamente adotada em exercícios futuros pela União, bem como por outros entes da federação.

Ao reputar como válida a mera estimativa da receita na LOA, ao invés daquela efetivamente arrecadada ao final do exercício, admite-se implicitamente a possibilidade de falseamento mediante o manejo abusivo de um fator redutor do piso, caso a RCL seja fixada em valores inferiores ao que, de fato, restar diagnosticado no fechamento das contas de cada exercício financeiro.

Trata-se, portanto, de estratégia com potencial de produzir o mesmo efeito da desvinculação de receitas da União (DRU), a qual teria sido concebida para minorar artificial e proporcionalmente a disponibilidade de receitas vinculadas do governo federal, notadamente no âmbito do Orçamento da Seguridade Social.

O atual subterfúgio inscrito no PLP 136 visa reduzir os valores mínimos da saúde, sem enfrentar politicamente a sociedade no caso de uma alteração, que viesse a ser feita diretamente no texto permanente da Constituição de 1988.

A alegada justificativa para essa proposta de mudança seria a necessidade de se cumprir as metas fiscais decorrentes da aprovação do “regime fiscal sustentável”, mais conhecido como “novo arcabouço fiscal” (Lei Complementar 200, de 2023), para que não fossem supostamente comprometidos os recursos destinados a outras políticas públicas.

Trata-se de fundamentação frágil, a ser severamente refutada sob pena de colocar em risco o piso da saúde e a sistemática constitucional de custeio dos direitos fundamentais.

Historicamente, conforme o atestam vários estudos de especialistas em Direito Sanitário e em Economia da Saúde, o SUS tem enfrentado um processo de subfinanciamento crônico, agravado pelo desfinanciamento ocasionado pela EC 95, de 2016.

Para suplantar tal defasagem sedimentada ao longo dos anos, bem como para fazer jus à condição de as ASPS serem uma incontroversa prioridade constitucional, é fiscalmente possível e socialmente indispensável que fosse aplicado o valor de 15% da RCL efetivamente arrecadada a partir de 2023, sem afetar as demais áreas sociais.

A Tabela 1 apresenta a aplicação federal em ASPS de 2018 a 2022, na vigência da EC 95, de 2016.

Nesse período, dado o congelamento do piso federal em ASPS, foram retirados do SUS aproximadamente R$ 70 bilhões, excetuados os recursos específicos destinados ao enfrentamento da pandemia da Covid-19.

Tabela 1

Ações e Serviços Públicos de Saúde (ASPS): estimativa das perdas do orçamento federal em função da EC 95 e EC 113 – 2018-2022 (em R$ bilhões a preços correntes)

Por Francisco R. Funcia, Lenir Santos e Élida Graziane Pinto*, no Conjur

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