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É um erro culpar a vítima; Jungmann reage bem

KENNEDY ALENCAR
LONDRES

O ministro Raul Jungmann teve reação acertada ao comentar o ataque com tiros a dois ônibus da caravana do ex-presidente Lula pelo Paraná. Ele disse que o fato, que ocorreu ontem, era “absolutamente inaceitável”.

Jungmann usou a palavra correta para se referir a esse atentado. Atos desse tipo são inaceitáveis na democracia. São próprios de ditaduras.

O episódio é grave por si só, mas também por representar uma escalada da intolerância política no Brasil. Em sete anos de comentários na rádio CBN, sempre condenei escrachos em aeroportos, agressões em aviões, ovadas e pedradas. Direito de protesto é constitucional. Agressões, físicas e verbais, não são.

Chegamos agora a um estágio em que tiros foram disparados. Pessoas poderiam ter morrido ontem. Há uma escalada fascista no Brasil, porque estamos vendo o uso da violência verbal e física com o objetivo de destruir o adversário político. Nos últimos anos, uma parcela da sociedade vem usando a liberdade da democracia para solapar a própria democracia.

Vemos isso quando acontecem manifestações que defendem a volta da ditadura militar. Vemos isso em ataques com pedras. Vemos isso quando uma política como Marielle Franco é assassinada.

Jungmann reagiu bem, sobretudo por afirmar que “é preciso identificar os responsáveis porque [um ato desse tipo] não pode se repetir dentro do regime democrático”.

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Combater o fascismo

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, pré-candidato à Presidência pelo PSDB, afirmou ontem que petistas “estão colhendo o que plantaram”. O prefeito da capital paulista, João Doria, pré-candidato tucano ao Palácio dos Bandeirantes, foi na mesma linha ao comentar o ataque à caravana de Lula. Alckmin e Doria não têm razão.

Infelizmente, quem está colhendo o que plantou é a sociedade brasileira como um todo, que admitiu o crescimento da intolerância no debate público e a propagação do ódio em relação a quem pensa diferente.

Como candidato à Presidência da República, Alckmin deveria refletir e voltar a público para fazer uma condenação clara e dura do que aconteceu. Doria, que é novamente candidato a um cargo eletivo, também errou ao se manifestar na mesma linha. Ontem foi com Lula. Amanhã pode ser com outro político.

É fato que petistas deram declarações que contribuíram para o acirramento dos ânimos. A presidente do PT, a senadora Gleisi Hoffmann (PR), chegou a dizer que, “para prender Lula, vai ter de matar muita gente”. Depois, ela recuou. Na caravana, o ex-presidente Lula pediu que a PM desse um “corretivo” em uma pessoa que jogava ovos no seu palanque. Também foi um erro. É preciso cuidado com as palavras.

Mas é injusto atribuir ao PT a radicalização do debate público no país. Isso é uma obra coletiva nossa como sociedade. Há uma radicalização claríssima na sociedade brasileira desde as manifestações de 2013, passando pela campanha eleitoral de 2014 e culminando em 2016 num processo de impeachment, um episódio que dividiu a sociedade brasileira e do qual o PSDB foi avalista. Chegamos a 2018 nessa toada.

Precisamos voltar a ter uma convivência realmente democrática e repelir condutas autoritárias. Toda a sociedade, classe política incluída com destaque, é responsável pelo acirramento dos ânimos no país. Todos os políticos devem ter cuidado ao dar declarações sobre o clima tenso que existe hoje no Brasil. Nós, jornalistas, também temos de ser cautelosos, mas firmes para impedir uma escalada fascista.

Ao falar do atentado de ontem, não se deve culpar a vítima. Não se pode dizer que a vítima colheu o que plantou. Houve uma tentativa de se fazer isso em relação a Marielle Franco, assassinada há apenas duas semanas.

Há um pré-candidato a presidente, Jair Bolsonaro, que ataca os direitos humanos, que são uma conquista civilizatória da humanidade. Não é coincidência que os países mais pacíficos e civilizados sejam aqueles que mais respeitam os direitos humanos. Bolsonaro está errado ao agir assim e deve ser criticado.

Isso não pode ser tolerado como crítica política, porque não é crítica política, não é uma opinião que mereça respeito ou crédito. É um ataque a um princípio civilizatório da humanidade, não se trata de uma ideia sobre se a segurança pública do país deve ser mais rígida ou menos rígida, se a polícia precisaria ser mais violenta do que já é ou ser menos violenta do que é.

Não podemos normalizar falas e atitudes intolerantes e agressivas no debate público. Esse é o primeiro passo para serenar os ânimos no país.

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Risco

São de altíssima gravidade as ameaças à família do ministro Edson Fachin. Se um ministro do Supremo sofre ameaças, o cidadão comum corre um risco ainda maior.

Quando há uma banalização da violência com intenção política, corre-se o risco de isso se espalhar por toda a sociedade, como vimos na História recente da Colômbia, por exemplo. Um ataque a um juiz ou à sua família se enquadra na categoria de ação política, como os assassinatos da juíza Patrícia Acioli e da vereadora Marielle Franco.

É preciso investigar e punir quem fez essas ameaças ao ministro Fachin e à sua família. Aliás, também é necessário cobrar das autoridades mais empenho a respeito das investigações sobre a morte de Marielle Franco, que completa hoje duas semanas.

Ouça o comentário no “Jornal da CBN”: