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A segunda turma do Supremo, fiel à Constituição, anulou por 3 a 1 a busca e apreensão feita em 2016 no apartamento funcional da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR). Como? Você não gosta de Gleisi? Nem eu. Está indignado com os três votos — de Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes? Eu estou indignado com um: o de Edson Fachin, único a concordar com a agressão à Carta.

A senadora tinha prerrogativa de foro. Mesmo que já vigorasse em 2016 a aloprada “Emenda Barroso”, que restringe o foro especial a casos ocorridos no exercício do mandato e em função dele, o foro estaria mantido. Pois o juiz de primeiro grau mandou o Supremo à merda e determinou a operação, escancaradamente ilegal. O tribunal tornou ainda nulas quaisquer eventuais provas colhidas na ação.

Fachin não viu nada demais. E deu um voto debochado, cretino, bucéfalo. Para ele, a prerrogativa de foro não se aplicava ao caso porque a busca e apreensão é determinada no imóvel, e quem detém o foro especial é a pessoa. No que concerne ao direito, trata-se de um argumento duplamente delinquente:
a: em primeiro lugar, quem detém o foro não é a pessoa, mas a função. Daí que o nome tecnicamente correto do expediente seja “foro por prerrogativa de função”. Não se trata de considerar se quem o detém é Gleisi, Mariazinha ou João. O foro, no caso, pertence à pessoa detentora de um mandato no Senado;
b: para que se possa alegar que “imóvel não tem prerrogativa de foro”, seria preciso que o dito-cujo fosse uma personalidade jurídica capaz de produzir provas de moto próprio, não é mesmo? Assim, à porta da senadora, diria o agente federal: “Senhora, viemos aqui em busca de eventuais provas produzidas pelo seu apartamento funcional; as suas prerrogativas estão mantidas”.

É um escárnio. É uma evidência de que aqueles que hoje se atribuem o papel de justiceiros não enxergam nem mesmo o limite do ridículo. Pior: descuidam-se daquelas que são também as prerrogativas do próprio tribunal que integram. Fachin não é o único a seguir essa trilha. E a mesma em que transitam Roberto Barroso e Luiz Fux. Com alguma frequência, Rosa Weber também seque essa picada. Ainda à distância, mas atraído pelo abismo institucional, vemos chegar Alexandre de Moraes.

É o direito em tempos de barbárie. Pior e mais doloroso para mim: ter de apontar o esbulho da Carta constitucional quando quem está tendo seu direito esbulhado é Gleisi Hoffmann, figura ilustre — na verdade, sua atual presidente — do partido que conduziu ao Supremo tipos como Fachin, Barroso e Fux…

Notem: ministros votem como lhes der na telha. Mas tenham um mínimo de respeito pela inteligência alheia, pelo aparato legal, pela Constituição. A tese de Fachin, reitero, é um deboche. Mas por que é assim?

Embora tenha chegado ao Supremo em razão de suas credenciais esquerdistas, ele se tornou hoje o herói da extrema-direita punitivista, que acha que Estado de direito e democracia são instrumentos para frouxos, que só conduzem a sociedade à indolência, ao crime e a roubalheira. E está encantado com o seu papel.

Então será preciso lembrar quem é Fachin e como chegou lá. E eu o farei com gosto no post acima.

Por: Reinaldo Azevedo