Vazamento do 1º depoimento da delação de Mauro Cid convém para versão farsesca das cúpulas militares
Ilustração: Renato Aroeira (@arocartum)
Vazamento da delação do Mauro Cid é conveniente para versão farsesca das cúpulas militares
Antes de se analisar o conteúdo em si do vazamento do primeiro depoimento prestado pelo tenente-coronel do Exército Mauro Cid à PF em agosto de 2023 no contexto da delação premiada, é preciso se questionar a quem interessaria este vazamento.
E mais: a quem interessaria o vazamento justamente neste momento, se nos seus depoimentos posteriores o ex-ajudante de ordens e multi-delinquente confessou as omissões que vinha escondendo?
Quem, do restrito círculo que teve acesso ao conteúdo do depoimento, pode tê-lo repassado a Elio Gaspari, jornalista de fontes militares?
Afinal, a quem mais interessaria o vazamento daquele primeiro depoimento de Cid com informações falseadas e incompletas?
Ao STF, à PGR, à PF, ou ao Comando do Exército, ao STM, ao ministro da Defesa, à família Cid? A quem, afinal?
A delação de Mauro Cid, inesperada por se tratar de um integrante das Forças Especiais do Exército [kids pretos], cujo adestramento prepara-os para suportarem as piores vicissitudes, foi decidida depois de muita meditação que envolveu a própria família do tenente-coronel e o Alto Comando do Exército.
Na ocasião, os objetivos da cúpula militar com a delação de Mauro Cid eram, em síntese, [1] o de descartar Bolsonaro, responsabilizando-o inteiramente pela tentativa de golpe; e, correlato à incriminação de Bolsonaro, [2] construir a versão farsesca de heroísmo dos comandantes militares que “salvaram a democracia” da ofensiva extremista.
Proteger a carreira e o salário polpudo dele próprio, Mauro Cid, e do seu pai, general Lorena Cid, envolvido no esquema de venda nos EUA das jóias roubadas por Bolsonaro, também seriam benefícios obtidos com a delação.
A leitura hoje daquele primeiro depoimento, agora publicizado na íntegra pelas mãos de Gaspari, confirma a descrição acima.
Ele descarregou toda culpa naquilo que classificou como “grupo de radicais”, integrado pelo general Pazzuello, major Denicole, Michelle e Eduardo Bolsonaro, Valdemar da Costa Neto, senador gaúcho Heinze, do PP, Felipe Martins e por outros, que inclusive eram “a favor de um braço armado”.
Cid isentou de responsabilidades o grupo “formado por pessoas moderadas”, segundo ele.
As pessoas supostamente sensatas que “o então Presidente mais gostava de ouvir”, integrado pelo general Freire Gomes, Comandante do Exército, general Arruda, Comandante Militar do Planalto, general Theóphilo, chefe do Comando de Operações Terrestres, e pelo general Paulo Sérgio, então ministro da Defesa.
Neste primeiro depoimento agora revelado por Elio Gaspari, Cid escondeu fatos gravíssimos, como por exemplo o plano de assassinato de Lula, Alckmin e Alexandre Moraes planejado por integrantes das Forças Especiais do Exército.
Diante das omissões e mentiras do Mauro Cid, o STF então o convocou para prestar novos depoimentos à PF, sob pena de perder os benefícios do acordo de delação.
Tais atentados planejados e executados com a mão militar, além de outros episódios que implicam diretamente altos oficiais da reserva e da ativa das Forças Armadas no golpe, principalmente do Exército, só se tornaram conhecidos graças ao avanço das investigações da PF.
É em razão disso que criminosos citados por Mauro Cid como pertencentes ao grupo de “pessoas moderadas” –os generais Theóphilo e Paulo Sérgio, por exemplo–, foram denunciados à PGR por envolvimento central na trama golpista.
Cid foi então obrigado a revelar todos os fatos testemunhados por ele, escondidos para proteger a “família militar” e os altos mandos militares envolvidos no empreendimento golpista.
O primeiro depoimento de Mauro Cid no processo de delação é uma peça extemporânea, já desmontada pela PF em relação à farsa pretendida para livrar a cara das cúpulas fardadas no golpe.
Por enquanto, 25 altos oficiais, muitos generais e ex-comandantes do Exército e da Marinha, aguardam denúncia da Procuradoria da República e severa condenação pela Suprema Corte.
Por isso, a pergunta fundamental que se coloca é: a quem interessa recolocar na ordem do dia a versão inicial do tenente-coronel Mauro Cid, e que já foi superada por outros esclarecimentos posteriores dados por ele mesmo à justiça e à polícia?
Com informações do VioMundo
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