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“Se ganhar do PSDB era fácil, encarar as redes de ódio militarizadas do bolsonarismo é o desafio atual (…) O PT não pode se transformar no PSDB do Bolsonaro. E se o PT não quiser se transformar no PSDB de Bolsonaro, ele precisa minar a operação de seu adversário no campo do adversário: as redes sociais”, diz o colunista Gustavo Conde acerca do cenário estratégico de comunicação que se avoluma no horizonte da esquerda como desafio

“Se ganhar do PSDB era fácil, encarar as redes de ódio militarizadas do bolsonarismo é o desafio atual (…) O PT não pode se transformar no PSDB do Bolsonaro. E se o PT não quiser se transformar no PSDB de Bolsonaro, ele precisa minar a operação de seu adversário no campo do adversário: as redes sociais”, diz o colunista Gustavo Conde acerca do cenário estratégico de comunicação que se avoluma no horizonte da esquerda como desafio27 de janeiro de 2020, 13:58 h Atualizado em 27 de janeiro de 2020, 14:2

As ‘acomodações’ político-eleitorais são de uma ingratidão abusiva. O PT vinha ganhando sempre do PSDB. Foram 4 lavadas nas urnas, encaminhando para a quinta. Quem não quer ter um adversário político assim? Um derrotado contumaz que esperneia e não sabe perder (o que faz a vitória ser ainda mais gostosa)?

Ganhar do PSDB se tornou um vício, uma diversão, às vezes, até uma maldade. O PSDB não tinha penetração social, não tinha inteligência de redes digitais e se afogava no próprio discurso patético de Estado mínimo, privatização e política de mercado.

Ninguém entendia isso. Era sempre chance zero de encontrar qualquer engajamento popular suficiente para vencer um pleito nacional.

O PSDB convencia essa elite atrasada do estado de São Paulo, essa gente racista e sem imaginação que permanecia razoavelmente saciada evitando a vitória do PT no estado eleição após eleição.

Era um pouco a política das compensações: o PT governa o país e nos estados, mantém-se as práticas excludentes de governança privada.

O PT, inclusive, ajudou muito os governos tucanos nos estados, uma vez que tinha noção do caráter universal de um governo responsável que não poderia privilegiar apenas governos do mesmo campo político.

Essa engrenagem eleitoral e conceitual funcionou até a paciência do PSDB e das elites brasileiras estourar. A partir da reeleição de Dilma Rousseff, só o vale-tudo do ódio e do impeachment sem crime daria conta de interromper a “absurda” série vitoriosa do PT.

É como se diz no discurso popular: “esse, só prendendo” (e foi o que aconteceu).

Falar depois é fácil, já diriam analistas autocríticos da autocrítica. Mas, fato é que o PT se acostumou demais a ganhar do PSDB e subestimou a sanha golpista de nossa elite empresarial.

Era difícil, claro. Tinha toda imprensa contra si, tinha o jogo baixo dos tucanos, tinha a manipulação de debates e tinha o sentimento crescente de frustração da classe média, que viu seu assistencialismo vagabundo ser substituído pelo combate à pobreza sério, com resultados espetaculares e premiado no mundo inteiro.

Ainda assim, o PT sempre ganhava.

Uma das explicações é de que o PSDB era analógico. Não tinha – nem nunca teve – estratégia de comunicação. Os tucanos tinham um traço virtuoso que era “ir para o debate”, com todas as ferramentas sujas da mentira e do simulacro, mas com o destino fatal de se aceitar as consequências de um debate público

O PSDB não fugia, pelo menos não à luz do dia.

Sabe quando o PT seria derrotado no plano nacional com um adversário desses? Nunca.

É por isso que o golpe foi “necessário” para os tucanos. É também por isso que o golpe teve o efeito colateral de esmigalhar o PSDB, transformando-o em um partido quase insignificante, que não chegou a 5% dos votos em 2018.

Ora, mas o que se quer com todas essas constatações meridianas, cuja consciência até as pedras no meio do caminho de Itabira possuem e se locupletam?

Quer-se contemplar o cenário eleitoral presente.

Se ganhar do PSDB era fácil, encarar as redes de ódio militarizadas do bolsonarismo é o desafio atual.

O PT não pode se transformar no PSDB do Bolsonaro. E se o PT não quiser se transformar no PSDB de Bolsonaro, ele precisa minar a operação de seu adversário no campo do adversário: as redes sociais.

As redes sociais tornaram o debate público quase secundário. A tarefa é ocupar as redes para re-estabelecer esse debate público o mais rápido possível.

Mas, para isso, é preciso ganhar eleições.

O PT sabe perder. Aliás, o espírito democrático do PT é uma de suas maiores virtudes. Foram aquelas três derrotas de Lula que prepararam um terreno conjuntural espetacular para que o primeiro governo petista desse um drible da vaca no jornalismo golpista e permanecesse forte e pleno das ações.

Foi quase uma sorte. Se Lula tivesse vencido em 1989, seria expelido do poder como foi Collor e talvez nós nunca tivéssemos conhecido sua monumentalidade enquanto líder político.

Mas quis a história que os fatos se encadeassem desse jeito: com lições duras, muitas feridas e muito aprendizado, além do cultivo obrigatório de um comportamento politico dotado de extrema humildade e soberania democrática.

O desafio agora é destruir a máquina digital de mentiras do bolsonarismo. Ela está forte e vai continuar forte.

Querer apenas debater o país em níveis civilizados neste momento pode ser mais uma irresponsabilidade do que um gesto democrático.

É inocência.

É preciso debater o país, mas é preciso fazer muito mais do que isso.

É preciso fazer o que o PSDB não fez na sua série histórica de derrotas. Ali, se o PSDB debatesse o país com honestidade e com um projeto claro, talvez pudesse até vencer algumas daquelas eleições.

Mas, o PSDB decidiu partir para a desconstrução de seu adversário, para a negação de tudo o que estava sendo feito no país. Deu no que deu. Era preciso desconstruir mas também construir, oferecer algo novo ao eleitorado.

Agora, o desafio do PT diante de Bolsonaro é parecido: é preciso desconstruir Bolsonaro, mas é preciso também trazer algo novo.

A discurso de retomada do passado forte econômica e socialmente também é um risco. A memória do eleitor não funciona da mesma maneira que a nossa memória individual.

A engrenagem da comunicação exige que se apresente algo novo, mesmo que seja um “velho” que deu certo reciclado de novo.

Mas o mais importante é combater o preconceito ao uso profissional das redes sociais, a ocupar esse espaço com a competência habitual que sempre caracterizou a esquerda pragmática e de resultados do PT.

A batalha política está sendo travada ali, nas redes. É preciso levar o debate público qualificado para lá – até como gesto de responsabilidade política – mas também é preciso levar as “pílulas” de debate, a disciplina de um “operário digital”, que organize e potencialize ações e gestos do campo da esquerda.

O campo da esquerda precisa voltar a ser atrativo para o usuário de rede – e não está sendo.

A esquerda é complexa, gosta de palavras difíceis e de discurso rebuscado. Lula sempre foi uma falsa antítese disto, porque seu discurso é profundamente complexo.

Mas a “forma” do discurso de Lula é simples. E ele chega ao eleitor com força descomunal.

Se essa energia política for corretamente catalisada por uma inteligencia de rede digital, o PT pode abreviar em muitos anos a restituição da verdade política no país.

Não podemos ter preconceito com as redes. Não podemos ser presunçosos como foram os tucanos ao longo de décadas em negarem a si a possibilidade de elaborar um projeto de país com originalidade, dignidade e inteligência.

Se os bolsonaristas têm o seu exército digital, que construamos a nossa fábrica digital, com operários de rede que não tenham medo nem preconceito de retuitar mensagens estratégicas, de publicar memes provocadores, de exaltar os fatos positivos e reprimir a profusão de mentiras.

Nós temos lado. As redes estão do nosso lado. O Google e o Facebook querem coibir as fake news como nós.

O que estamos esperando para entrar de sola nessa batalha?

Bolsonaro Lula

Bolsonaro Lula (Foto: Bolsonaro Lula)

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