Representantes de entidades da sociedade civil, do Ministério Público Federal e de movimentos sociais afirmaram nesta segunda-feira (25) que o Brasil precisa conhecer a verdade sobre as atrocidades históricas cometidas no País, principalmente durante a ditadura militar, para evitar novos ataques à democracia e aos direitos humanos do povo brasileiro. O alerta foi dado durante a realização da sessão solene pelo Dia Internacional do Direito à Verdade, no plenário da Câmara. A deputada Erika Kokay (PT-DF) presidiu a sessão de homenagem e foi uma das autoras do requerimento que viabilizou o encontro, ao lado da deputada Luiza Erundina (PSOL-SP), que não pode comparecer por motivo de saúde.
Intercalado com música e declamação de poesias, todos os discursos dos convidados foram unânimes em lembrar que a passagem da data é comemorada em meio a uma conjuntura política de ódio e de desapreço pela democracia. O presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz, lamentou o clima reinante de perseguição existente no País.
“Em pleno século XXI um deputado, o Jean Wyllys [PSOL-RJ], não assumiu seu mandato por falta de segurança. Vivemos tempos estanhos, mas a OAB está aqui e não vai se calar. Entendemos que o direito à verdade, em um País que é um dos que mais mata defensores dos direitos humanos, como no caso de Marielle Franco, é o único caminho para superarmos o arbítrio”, explicou.
O direito à verdade como fator de promoção da justiça também foi enfatizado pela Procuradora Federal dos Direitos do Cidadão, Déborah Duprat. Segundo ela, pelo desconhecimento da verdade muitas vezes a própria história do País é falsificada. “Escravidão não gerou a malemolência, vivemos, sim, em uma sociedade desigual onde 6 pessoas ganham o equivalente a outras 100 milhões e o patriarcado ainda elimina corpos”, lembrou.
Ao também destacar que é preciso conhecer a verdade sobre as atrocidades ocorridas durante a ditadura civil-militar, a deputada Erika Kokay ressaltou que somente dessa forma será possível “fazer o luto de um período traumático para o País, que tenta se perpetuar nos dias atuais”. “O esquecimento faz com que nós relativizemos os direitos dos povos indígenas, e que neguemos a justiça às outras minorias que estão nas dobras deste País, como o direito à vida de jovens negros e pobres, e às mulheres vítimas de feminicídio por conta de um patriarcado que arranca seus corpos”, criticou.
Diante desse cenário o ex-deputado e ex-perseguido político durante a ditadura militar Gilney Viana disse que é preciso resistir à onda do fascismo que ronda atualmente o país, e que o Brasil ainda tem uma dívida histórica com os desaparecidos durante a ditadura militar. “Nós não iremos nos calar. Muitas pessoas ainda lutam pelo direito à verdade sobre os mortos e desaparecidos na ditadura, e precisamos lutar contra a mentira, ainda que venha do presidente da República”, afirmou.
Sobre o direito à verdade, o representante da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) Padre Renato observou que o próprio Papa Francisco ensina que “sem a busca da verdade, qualquer opinião é válida”. “A verdade esclarece”, argumentou.
MAB
Durante a sessão solene, a representante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) Adriana Dantas destacou que o direito à verdade deve alcançar não somente fatos passados, mas também tragédias presentes ainda não esclarecidas. Entre esses casos, ela citou tragédias como a de Mariana e de Brumadinho, e o assassinato de Dilma Ferreira da Silva, do MAB do Pará. “Quantos mais precisarão morrer até que seja feita justiça? ”, indagou.
Ao também lamentar o assassinato de Dilma da Silva, junto com o esposo e outro militante do movimento, o representante da Bancada do PT, deputado Airton Faleiro (PT-PA), criticou setores da sociedade brasileira que ainda exaltam a ditadura. Segundo notícias divulgadas pela imprensa, o presidente Jair Bolsonaro ordenou que o golpe ocorrido em 31 de março de 1964 seja comemorado nos quarteis.
“A verdade é que a elite brasileira não aceita dividir as riquezas, dar oportunidade aos mais pobres. E os que se levantam contra a injustiça são presos, torturados e mortos. Nosso País vive um clima de instabilidade (política), e observamos defensores do autoritarismo rondando a democracia, incentivando morte e violência, contando mentiras ao povo de que só é possível superar a crise se o autoritarismo voltar”, alertou.
Héber Carvalho
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