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Professor do Instituto de Energia da USP e ex-diretor de gás da Petrobras, Ildo Sauer não se surpreende com a crise provocada pela greve dos caminhoneiros. E atribui grande parte dos problemas à “ânsia” do presidente da estatal, Pedro Parente, em atender os interesses do mercado.

“O Parente tem notória experiência em promover desabastecimento e desorganizar setores econômicos, basta lembrar do seu papel, como integrante do governo Fernando Henrique Cardoso, no racionamento de energia de 2001. O racionamento, aliás, removeu os tucanos do poder em Brasília no ano seguinte. Eles nunca mais ganharam uma eleição”.

O executivo, diz Sauer, atuou a favor dos interesses de produtores independentes de energia naquele momento e agora só se preocupa em perseguir o objetivo de maximização dos lucros da Petrobras, sem nenhum outro compromisso estratégico.

Ele cita a decisão da petroleira de reduzir o refino e estimular a importação de derivados. Manter o preço em alta é um grande negócio para os importadores privados, que garantem uma alta margem de lucro, explica.

O ex-diretor da Petrobras ressalta ainda que os escândalos de corrupção abalaram a confiança da sociedade na estatal e abriram caminho para a estratégia implantada pela atual diretoria, como se fosse a única opção legítima. “A escolha de Parente para comandar a empresa é muito emblemática”.

O custo de produção de petróleo na área do pré-sal, avalia, está em 10 dólares por barril, enquanto a cotação no mercado internacional gira neste momento na casa dos 80 dólares. O Brasil exporta um bilhão de barris por ano, o equivalente a cerca de 250 bilhões de reais. “É este valor que está em disputa por interesses legítimos, mas conflitantes. Entre os acionistas privados e os consumidores”.

Parente, diz Sauer, está amparado pela Lei do Petróleo de 1997, aprovada durante o governo FHC, que retirou o monopólio das mãos da Petrobras e determinou que os preços deveriam se adequar aos “custos de oportunidade”, ou, em outras palavras, às flutuações do mercado.

Ele só cumpre aquela lei, afirma o acadêmico, que os governos do PT não tiveram coragem de modificar, apesar dos inúmeros conselhos de quem se preocupa com a geopolítica do petróleo e o papel decisivo da commodity ao longo da história. “O Lula e a Dilma decidiram interferir na marra e essa postura desaguou em várias ações judiciais de acionistas minoritários”.

Segundo Sauer, a função da Cide, uma contribuição do domínio econômico sancionada em 2001, foi distorcida e deixou de servir para estabilizar o mercado de combustíveis.

O imposto, hoje tão criticado, acabou incorporado à conta do superávit primário, mas o objetivo de sua criação era possibilitar um equilíbrio dos preços internos diante das flutuações no mercado internacional.

Quando o valor do barril estivesse alto, a Cide seria reduzida ou zerada. Em situações inversas, ela subiria para remunerar a Petrobras e impedir que a queda brusca da gasolina e do diesel prejudicasse os produtores de etanol, combustível alternativo.

Sauer acredita que o uso correto, original, da contribuição impediria no futuro flutuações tão acentuadas dos preços. Desta forma, seria possível desempenhar um papel no desenvolvimento brasileiro sem prejudicar a remuneração dos detentores de ações da companhia.

O que tornou a disputa mais parelha entre os grevistas e o governo, avalia o professor da USP, é a capacidade dos caminhoneiros e das empresas do setor de parar o País. “O consumidor está à mercê da precariedade da matriz de transportes do Brasil. É um sistema caro e frágil, majoritariamente dependente dos caminhões e do uso do diesel”.

Carta Capital