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Por Luís Costa Pinto, 247 – As duas principais legendas da esquerda brasileira, o PT e o PSol, já não alimentam mais esperanças de estarem unidas no mesmo palanque da disputa para o governo de São Paulo no próximo ano. Tanto as direções partidárias já trabalham com essa certeza, como o ex-presidente Lula, candidato a um terceiro mandato na Presidência da República, tratou de delimitar o espectro de tolerância da disputa entre os aliados.

Tendo Boulos por artífice da construção de um consenso interno, o PSol deve apoiar Lula – com Geraldo Alckmin, com tudo, na chapa presidencial – desde que o PT respeite o direito do aliado nacional: lançar candidato a governador no estado de maior eleitorado do País, sem que sejam feitas interferências externas na estratégia de consolidação nacional da sigla.

“Este é o cenário real, e acho difícil que Boulos não seja candidato”, admite o ex-prefeito de São Paulo e ex-ministro da Educação Fernando Haddad. “Eles não podem sair batendo loucamente no Lula, ou no Geraldo Alckmin, porque nós estamos construindo uma chapa de ampliação da esquerda para reconstruir o País”.

Guilherme Boulos, por sua vez, espera que cessem as ironias, os assédios e os ataques de petistas à decisão do PSol. Segundo o pré-candidato ao governo paulista, Haddad não integra o grupo de petistas que se comporta desta forma. A relação entre os dois é de amizade e respeito. “Não nos comprometemos a apoiar o PT em São Paulo. O PSol sempre teve candidato a presidente da República como estratégia para crescer. Em 2022, estamos construindo uma posição diferente porque reconhecemos a ruína do País e a capacidade de Lula para liderar um projeto nacional”, diz Boulos. E pondera: “Agora, não nos pode ser exigido estar ausente da segunda disputa mais importante depois da Presidência. O PSol entra no jogo para ampliar sua bancada federal em São Paulo dos atuais três deputados federais para pelo menos cinco, ou seis”.

Ao lembrar compromissos de apoio a Haddad na disputa paulista, Guilherme Boulos lança uma provocação ao PSB. O Partido Socialista Brasileiro, que não é exatamente uma sigla do espectro puro da esquerda apesar do nome, é aguardado como aliado de primeiro turno para uma chapa com o PT. Socialistas de outros estados como Pernambuco, Rio de Janeiro e Distrito Federal cobram de Márcio França, ex-vice-governador de São Paulo, derrotado no segundo turno por João Doria (PSDB) em 2018, o cumprimento de uma promessa solene que fez numa reunião da direção executiva do partido.

França prometeu que retiraria a candidatura ao governo estadual e se acomodaria como candidato ao Senado, numa chapa com Fernando Haddad, caso o ex-governador Geraldo Alckmin aceitasse ser candidato a vice-presidente pelo PSB na chapa com o ex-presidente Lula. A promessa de Márcio França foi imediatamente transmitida ao petista, que acelerou os entendimentos com o ex-governador paulista. França, contudo, recuou depois do ato do último domingo, do Grupo Prerrogativas, sem explicar para ninguém os reais motivos do recuo.

Dentro do PSB há desconforto com Márcio França. Ele detém alguma força no comando partidário porque controla a maior parte das finanças da legenda. Em 2010, quando precisou retirar a legenda das mãos de Ciro Gomes para apoiar Dilma Rousseff, e em 2014, quando precisou da chancela do diretório de São Paulo para seu projeto presidencial com Marina Silva, o ex-governador de Pernambuco Eduardo Campos (morto em agosto de 2014 num acidente aéreo) celebrou uma aliança pragmática com França e concedeu a ele este poder dentro do partido.

Em Brasília, socialistas ligados à Direção Nacional da sigla atribuem a contradança atabalhoada de Márcio França aos atuais conselheiros políticos dele. Dois deles, os empresários Paulo Marinho e Marco Aurélio Carvalho, dono da AM4, empresa de marketing virtual, estiveram na linha de frente da campanha de Jair Bolsonaro em 2018. Carlos Siqueira, presidente nacional do PSB, não encontrou tempo em sua agenda para falar com o 247. Márcio França não retornou às ligações da reportagem.

Pesquisas dão Haddad à frente. Boulos, em 3º, é novidade na cena estadual

No último fim de semana o instituto DataFolha, empresa integrante do grupo que edita a Folha de S. Paulo e o portal Uol, divulgou pesquisa de intenções de voto para o governo paulista. No cenário que, atualmente, é o mais provável da disputa (caso Márcio França não retire mesmo sua candidatura), Fernando Haddad, do PT, lidera com 28%. Em segundo lugar vem o socialista, com 19% e em terceiro, Guilherme Boulos, do PSol, com 11%. Foram ouvidos presencialmente 2.034 eleitores em 70 municípios paulistas entre 13 e 16 de dezembro.

O grande problema para Márcio França é justamente o percentual medíocre registrado neste momento pelos candidatos localizados no espectro de centro-direita à extrema-direita. O ministro bolsonarista da Infraestrutura Tarcísio Freitas (sem partido, negocia filiação ao PL) tem 7%, o vice-governador Rodrigo Garcia (PSDB) tem 6% das intenções de voto e Arthur do Val (Patriota), o tal do “Mamãe Falei”, que negocia apoio cruzado com o ex-juiz e ex-ministro Sérgio Moro, acusado de ter sido parcial e persecutório nas sentenças que proferiu contra Lula (PT) quando era o titular da 13ª Vara Federal em Curitiba (PR), tem 3%.

Ancorado na máquina do governo estadual, que comandará a partir de abril do próximo ano com a renúncia de Doria para disputar a Presidência, Garcia crescerá. Surfando no que resta de “lavajatismo” no estado da federação que mais se revelou “lavajatista” em 2018, o ex-”Mamãe Falei” (Val agora repudia esse apelido ridículo, tentando trocá-lo por alguma imagem de seriedade) também crescerá. Essa trinca crescerá retirando parte dos votos de França, que tende a minguar, sem necessariamente impactar o núcleo mais consolidado de Boulos e de Haddad.

Os dois candidatos de esquerda em São Paulo apostam na fadiga de material dos 28 anos de gestões do PSDB em território paulista. Inaugurada por Mário Covas em 1994, a dinastia tucana ressente-se de renovação por dentro de seu campo político original. Recém-filiado, Garcia tem imagem pessoal consistente no interior do estado. Porém, paga um alto preço político pela imagem forjada por Doria: a de um homem público que não cumpre acordo, que trai aliados políticos.

Caso persevere na sua indefinição política e siga sem explicar o porquê de se manter na disputa para o governo estadual no lugar de celebrar em definitivo a aliança com o PT de Haddad, formalizando a candidatura ao Senado, França passará a ser visto pelos articuladores de cúpula da esquerda nacional como João Doria é enxergado na direita e centro-direita: um mau parceiro, um traidor de compromissos.

Corre o risco, ainda, de ver minguarem suas expectativas de votos a governador, sangrando para irrigar os quintais da direita. Caso demore demais a anunciar que disputará o Senado, não só perde o respeito político que cabos eleitorais como Lula e Alckmin devotam a ele, como assiste a personalidades como os governadores Flávio Dino, do Maranhão, e Paulo Câmara, de Pernambuco, potenciais (quase certos) candidatos ao Senado em seus estados, ampliares a liderança baseada na credibilidade política entre os socialistas e os parceiros de campanhas.

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