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O governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), afirma que o presidente Jair Bolsonaro é “insano” e lidera uma “minoria sectária” que pretende “criar confusão e dividir o país

Na sexta-feira (19), o presidente foi gravado usando um tom pejorativo ao se referir ao governador, em conversa com o ministro Onyx Lorenzoni.

“Daqueles governadores ‘de paraíba’, o pior é o do Maranhão. Tem que ter nada com esse cara”, disse Bolsonaro.

Na opinião de Dino, o presidente dá declarações “extremistas” para esconder seu “mau governo”. Reeleito numa coligação que juntou 16 partidos, do PT ao DEM, ele defende a formação de uma frente ampla contra o bolsonarismo nas eleições municipais de 2020.

A seguir, os principais trechos da entrevista à coluna de Bernardo Mello Franco, do jornal O Globo.

O Globo: O que o senho achou da fala do presidente?

Flávio Dino: Foi a prova que tem um insano no comando do país. Há um método instalado no poder central. É um método de discriminação, de perseguição e de preconceito. 

O presidente externou uma visão de preconceito, de ódio. E reiterou essa visão em outro vídeo, dizendo que todo nordestino é “pau de arara” e “cabeça chata” (em livecom o ministro Tarcísio Freitas, na quinta à noite). Isso nada mais é que a repetição de tratamentos pejorativos para menosprezar uma região que concentra um terço da população brasileira.



E o fato de ser descrito como o pior dos governadores?

Não me abalei. Não é a opinião do presidente que baliza as minhas ações. Fui eleito duas vezes em primeiro turno, em 2014 e 2018. Isso confirma que temos apoio da maioria da sociedade no nosso Estado. Em uma semana, nosso governo teve mais resultados que o dele em 200 dias.

O senhor vinha evitando o confronto com o Planalto. Ficou surpreso com o tom do presidente?

Fiquei, porque foi uma agressão gratuita. Não havia nenhum episódio que justificasse esse nível de agressividade, de perseguição e de retaliação.

Eu e os demais governadores de partidos de oposição temos procurado praticar a boa política republicana. Com o direito à crítica, garantido na Constituição, e o diálogo institucional, a favor de tarefas de interesse comum.

Essa agressividade não é da tradição brasileira. João Figueiredo, o último presidente da ditadura militar, manteve relações institucionais com governadores de oposição, como Franco Montoro (SP) e Leonel Brizola (RJ).

A que atribui o fato de ter sido apontado como o pior dos governadores?



Isso deriva da visão extremista e sectária que ele tem praticado. Um traço do discurso fascista é a identificação de inimigos para justificar suas próprias carências.

As pesquisas mostram que o governo não consegue cuidar do que é fundamental, como o desemprego e a recessão. Para esconder este fato, o presidente pratica a política da agressão, da busca de inimigos. É para tentar esconder o mau governo que ele faz.

O que muda depois desse bate-boca?

No meu caso, nada. Não vou recuar um milímetro. Mais que um direito, considero que é um dever dizer o que penso. O país precisa de uma correção de rumos. Não há uma agenda sequer em que se identifique uma preocupação com o social.

Se o intento dele foi me silenciar, será inútil. Não vou aceitar que um discurso de caráter autoritário determine minha atuação política. É um dever resistir a qualquer proposta de caráter ditatorial no Brasil. Não tenho medo de ditador nem de projeto de ditador. Não se trata apenas de algo tosco ou ridículo. É preciso compreender que a visão expressada pelo presidente da República é perigosa para o Brasil.

Agora inviabilizaram a presença do governador da Bahia numa inauguração em seu Estado (do Aeroporto Glauber Rocha, em Vitória da Conquista). Ele está criando um ambiente de conflituosidade em que até coisas básicas, como a inauguração de uma obra, se tornam impraticáveis. Não é algo isolado contra o Flávio Dino. É uma coisa geral, que visa promover uma desorganização da política brasileira.

O senhor  teme retaliações práticas ao seu Estado?

Espero que não. Não quero nenhum tipo de privilégio, só o que está garantido na Constituição e nas leis. Se essa retaliação se confirmar, vou usar todos os meios para proteger os interesses de sete milhões de pessoas.

Ele disse para não “dar nada para esse cara”, como se eu pedisse alguma coisa para mim. Nunca pedi e nunca pedirei. O que ele quis dizer foi para não dar nada à população do Estado, e isso viola os artigos 19 e 37 da Constituição.

Até achei engraçado o termo. Agora vou cantarolar aquela música do Roberto Carlos, “Esse cara sou eu”. O presidente me promoveu, criou um jingle para mim.

O senhor é citado como possível candidato ao Planalto. Este episódio o ajuda?

Parece que o presidente resolveu me lançar (risos). Em cinco dias, ele deu cinco declarações seguidas me citando como seu adversário. Eu não trato de eleição agora. Quem só pensa na próxima eleição é o presidente, que deveria pensar em governar.

Nesses 200 dias, a oposição criou menos problemas para o governo do que o próprio governo. Por quê?



O presidente cria tanta confusão que às vezes é até melhor ficar só assistindo. Ele fica se enrolando nas suas próprias contradições e incapacidades.

Claro que vivemos um momento difícil com a arbitrária prisão do ex-presidente Lula e com o impeachment da ex-presidente Dilma. O desfecho do processo eleitoral também deixou um clima difícil, com muitas sequelas. Agora estamos recompondo a unidade e o diálogo, que são tão importantes.

Por outro lado, não é verdade que a oposição esteja tão ineficaz assim. Na reforma da Previdência, ela foi decisiva para evitar uma tragédia ainda maior. Se você comparar a proposta enviada pelo governo e a que foi aprovada na Câmara, houve uma redução de danos expressiva. Conseguimos evitar prejuízos ainda maiores para a população mais pobre.

Alguns partidos de centro-esquerda saíram fraturados da votação.

O PSB e o PDT estudam expulsar deputados que apoiaram a reforma. Qual a sua opinião sobre isso?

Cada partido tem que cuidar da observância das suas regras, do seu estatuto. Como integro outra agremiação, não me cabe opinar sobre o que cada partido fará. De fato, há dissensões internas. Mas a maioria das bancadas foi na direção correta.

Precisamos organizar uma frente de resistência contra o processo de destruição do Brasil que vem sendo liderado pelo presidente da República. Isso tem que se projetar para as eleições municipais de 2020, sobretudo nas capitais.

O senhor foi juiz federal, entrou na mesma turma de Sergio Moro. Como vê o vazamento de diálogos da Lava-Jato?

Sempre considerei o combate à corrupção uma necessidade urgente, acho que essas operações prestaram grandes serviços. O que eu critico é o fato de parte dos processos ter se transformado em instrumento de política partidária.

O mesmo juiz que determinou o resultado da eleição presidencial se beneficiou pessoalmente do resultado da eleição ao aceitar o cargo de ministro. Isso é um fato eloquente, por si só, dessa partidarização.

Temos que manter o combate à corrupção, mas não podemos aceitar que, em nome dele, se pratique outra forma de corrupção. Uma Justiça parcial é uma Justiça corrompida.

Mas é um fato que ocorreram desvios milionários na Petrobras, e hoje parte do eleitorado identifica os partidos de esquerda com a corrupção.

Não aceito algumas coisas que foram feitas para enriquecimento pessoal, na Petrobras e em outros lugares. Combati isso a minha vida inteira. Critico a má condução dos processos e defendo que todas as pessoas que praticaram crimes sejam punidas dentro da lei. Mas os fins não justificam os meios.

O senhor teve um encontro recente com o ex-presidente José Sarney, seu arquirrival na política do Maranhão. Como foi?



Infelizmente, a democracia brasileira está em perigo. Quando você está diante de uma situação emergencial, é preciso dialogar e unir todas as forças políticas.

Defender a Constituição e a democracia não é um dever apenas da esquerda. É preciso que setores liberais e social-democratas, que se convencionou chamar de centro, também estejam em atitude vigilante.

Se olharmos a história da Itália nos anos 20 e da Alemanha nos anos 30, a ascensão do fascismo e do nazismo só foi possível porque as forças ao centro isolaram a esquerda. Nós não podemos nos isolar.

Também estive com o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, e tenho conversado quase todas as semanas com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia.

É preciso enfrentar os arroubos extremistas de quem quer dar golpe militar, fechar o Supremo, fazer as coisas na marra, dividir o país. Essas idéias estão na internet, mas também estão nas ruas e no governo.

Hoje a polarização é assim. De um lado há uma pequena minoria barulhenta e sectária liderada pelo presidente, tentando criar confusão, dividir o país e agredir todo mundo. Do outro lado, temos que compor um campo amplo em defesa da democracia e da Constituição.

Sarney concordou com o senhor? 



Ele é um homem de quase 90 anos, já viu muitas coisas. Depois deu uma longa entrevista ao jornal “Correio Braziliense” e disse que é preciso mais diálogo para distensionar o país.

Fonte: Blogo do Bernardo Mello Franco, em O Globo

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