Ex-ministros da saúde criticam e apontam falhas do governo Bolsonaro durante a pandemia
O futuro da vacinação nacional contra a Covid-19 foi tema de live, na noite de quarta-feira (20), que reuniu os ex-ministros da Saúde, deputado Alexandre Padilha (PT-SP), Arthur Chioro, senador Humberto Costa (PT-BA), José Gomes Temporão e Nelson Teich, junto com a empresária Luiza Helena Trajano, representando a sociedade civil.
Os participantes também apontaram as falhas na condução da pandemia por parte do governo Bolsonaro.
O deputado Alexandre Padilha, que coordenou o evento virtual, acredita que é possível vacinar 80 milhões de brasileiros antes do inverno.
“É possível em três meses vacinar 80 milhões de brasileiros. Isso significaria todos os profissionais de saúde, idosos, toda população indígena, quilombola, todos os profissionais de educação, da segurança pública, de transporte público, de manutenção das cidades, todas as pessoas com deficiência. É possível vacinar isso antes de começar o outono e o inverno, quando vai ter crescimento (de casos) ainda maior”, observou.
O senador Humberto Costa, ministro da Saúde no governo Lula, lembrou que a situação do Brasil no momento é extremamente grave.
“Dezembro e janeiro estão sendo extremamente preocupantes. Aumentou a capacidade de contágio do vírus. Vamos ter de mudar esse pneu com o carro andando. A vacinação vai se dar enquanto temos aumento do número de casos e de mortes. Situação de enorme gravidade”, alertou.
“Por estar atrasada (a vacinação), medidas de isolamento social e contenção têm de ser aplicadas num momento mais difícil. As pessoas já relaxaram.
Há um sentimento de uma falsa segurança, há uma resistência maior”, afirma Humberto Costa, ao relatar o exemplo “acintoso” de Manaus.
Todos os ex-ministros, que também são médicos, e a empresária Luiza Trajano disseram que pretendem tomar a vacina contra Covid-19 assim que as doses estiverem disponíveis para seus grupos.
Falhas
Artur Chioro, que esteve à frente da Saúde durante o governo da presidenta Dilma Rousseff, afirmou o governo Bolsonaro falhou ao apostar todas as fichas apenas na vacina da Oxford, desenvolvida pela AstraZeneca em parceria com Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
“Se nós, por exemplo, tivermos só a vacina do Butantan, que tem uma capacidade diária de 1 milhão de doses, demoraremos 440 dias para vacinar a população. Nós desdenhamos do Fundo Global”, criticou Chioro.
O ex-ministro Chioro também destacou os erros cometidos pelo Brasil no enfrentamento à pandemia e os riscos que o país corre de ficar para trás.
“Uma crise política gerada por um presidente absolutamente descomprometido com a vida, com a responsabilidade, com a condução do que nós temos a viver.”
Programa Nacional de Imunização
José Gomes Temporão, que esteve à frente do Ministério da Saúde entre 2007 e 2011, ressaltou que desde o começo da pandemia se sabia que a única possibilidade de virar totalmente o jogo e superar a situação era dispor de uma ou mais vacinas.
E lembrou que o Brasil tem uma gigantesca competência e tradição em Programa Nacional de Imunização (PNI).
“Nosso PNI é de longe o melhor do mundo. Em 2010 vacinamos 80 milhões de pessoas em três meses. Então não é falta de capacidade logística. Houve uma falha dramática da diplomacia, do governo brasileiro. O Brasil sempre foi respeitado pela postura do Itamarati, da sua diplomacia. Nosso programa de imunização é referência global. O governo conduziu muito mal essa questão, ofendendo a China que produz insumos pra tudo, testes, medicamentos genéricos, vacinas, equipamentos de diagnóstico, qualquer coisa que se pense em saúde é a China que produz. E o presidente e seu filho proferem ofensas contra esse grande país irmão. Isso atrapalhou. A respeitabilidade que o Brasil tinha evaporou por culpa desse governo”, criticou.
O ex-ministro avalia que Fiocruz e Butantan teriam condições de entregar para o Ministério da Saúde, se tudo corresse bem, 30 milhões de doses/mês da vacina.
“Teríamos de tentar encurtar. Quando mais joga pra frente, mais internações, mais infecções, mais óbitos. Temos de tirar o governo da inércia e acelerar o fornecimento desses princípios ativos para que Butantan e Biomanguinhos possam ampliar sua produção e entregar para o PNI.”
Impeachment urgente
Arthur Chioro, Humberto Costa, José Gomes Temporão e Alexandre Padilha defenderam o impeachment urgente do presidente Jair Bolsonaro. Para eles o Brasil não aguenta mais dois anos com Bolsonaro no comando do País fazendo com que a pandemia se estenda por mais tempo.
“Mais um ano de Bolsonaro é uma pandemia que não vai ter fim. Ele atrapalha no que ele pode. Ele é um empecilho”, afirmou Humberto Costa.
Para o senador, Bolsonaro precisa cumprir o papel de garantir vacina para todos.
“Ou ele se adapta à realidade de que ele tem que cumprir o papel de garantir vacina para todo mundo – embora ele não faça mais nada, mas faça isso – ou então nós vamos ser obrigados a colocar alguém no lugar dele que faça isso, que cumpra esse papel, essa responsabilidade. Com Bolsonaro essa pandemia ainda vai durar muito tempo”, lamentou o senador Humberto Costa.
Incapacidade de vacinação
O ex-ministro da Saúde de Jair Bolsonaro, que passou menos de um mês no cargo, Nelson Teich demonstrou sua preocupação sobre a capacidade de o governo implantar um plano de vacinação eficiente.
“Tem de ter estratégia, planejamento, liderança, coordenação, formação, execução boa e comunicação. Se você falhar em uma delas – principalmente se falhar muito –, vai ter dificuldade. A Covid é uma doença que sobrecarregou todos os sistemas de saúde do mundo e vai sobrecarregar nosso PNI também. Não podemos subestimar a dificuldade que vai existir”, alertou.
“E temos tido dificuldade. Nos últimos dois anos não conseguimos bater a meta, não conseguimos vacinar para sarampo no que era proposto desde 2017. Se tiver de acrescentar mais 300 milhões de doses, vamos ter um PNI absolutamente sobrecarregado”, calculou Teich.
SUS perfeito
A empresária Luiza Trajano também revelou estar preocupada com a população de um modo geral, lembrando que quem estava ali no debate teria condição de tomar, pela idade, pela profissão.
“Mas de que adianta eu tomar e a população continuar desse jeito. Além de toda tristeza, da insegurança de saúde, temos a insegurança do mercado no mundo inteiro. Esse vírus veio para conviver com nossa impotência e incompetência.”
Definindo-se como “uma pessoa de gestão”, ela revelou que na sexta-feira um grupo de empresários irá se reunir para debater e entender o que a sociedade civil pode fazer.
Concordando com o que foi dito sobre as falhas governamentais, Luiza afirmou que agora é hora de “acudir”.
“A única forma é a sociedade se unir e achar alternativas”, recomendou.
Sobre o SUS, Trajano lembrou: “temos a saúde pronta, o que está na Constituição é perfeito. É o maior sistema de saúde do mundo e precisa funcionar. Ter gestão, digitalização. Funcionar como uma coisa do Estado e não uma coisa política”.
Ao fim de sua participação, Luiza fez um agradecimento especial a Padilha, Temporão e Chioro “por tudo que vocês fizeram pelo SUS” quando ministros.
A empresária afirmou que o SUS é a “joia da coroa”.
E antecipou que a associação Mulheres do Brasil, que também preside, prepara uma grande campanha de publicidade para ressaltar a importância da rede de saúde pública e resgatar a imagem da instituição junto à população.
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