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Em editorial racista, jornal O Globo diz que desembargador que permitiu apreensão de adolescentes sem flagrante “fez bem”. Foto: Reprodução

Em editorial racista, o jornal O Globo manifestou apoio à decisão da Justiça do Rio de Janeiro que permitiu a apreensão de menores de idade sem flagrante. Segundo o veículo, “todos estão apreensivos e temerosos diante do recrudescimento da violência” no estado e a medida é um meio de “manter a ordem em bairros das zonas Sul e Oeste”.

No texto, publicado nesta quinta (21), o jornal reconhece que há “injustiças, preconceitos, falhas e excessos praticados por policiais na abordagem a adolescentes e jovens”, mas apoia a medida mesmo assim e ainda usa uma foto de um menor de idade negro sendo abordado por agentes. “Arrastões e vandalismo infelizmente são corriqueiros. Se a polícia só puder agir em casos de flagrante, estará impedida de atuar na prevenção de crimes”, alega o veículo.

Para o jornal, o desembargador Ricardo Rodrigues, presidente do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ), que permitiu a apreensão de menores “fez bem”. Ele revogou liminar concedida pela juíza Lysia Maria da Rocha Mesquita, titular da 1ª Vara da Infância, da Juventude e do Idoso da Comarca da Capita, que havia determinado que o governo estadual e a prefeitura da cidade não apreendam e conduzam crianças e adolescentes a delegacias quando eles não forem flagrados cometendo crimes.

A liminar da magistrada foi uma resposta à ação “Operação Verão”, chefiada pela prefeitura e pelo governo do Rio com a justificativa de reforçar a segurança nas praias do Rio. Além de ter a decisão revogada, Lysia será investigada pela Corregedoria Nacional de Justiça, que “vai averiguar se houve infração da magistrada em relação às regras constitucionais e ao previsto na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman)”.

Adolescente apreendido. Foto: Reprodução

Sabe-se que que os principais alvos das polícias são pessoas pretas, pobres e periféricas, e o próprio jornal admite isso, defendendo que os agentes “precisam ter critério”. O Globo, no entanto, diz que a decisão da juíza seria uma forma de “cercear” o trabalho policiais e que ela só “beneficiaria os infratores”.

“Policiais precisam ter critério, não podem sair por aí detendo adolescentes negros e pobres só para justificar seu trabalho. Mas cobra-se da polícia justamente que aja preventivamente, antes que os crimes aconteçam. Isso pressupõe abordagens, revistas, checagens. O MP e a Justiça têm papel importante para coibir excessos e cobrar respeito à lei. O trabalho da polícia, porém, não pode ser cerceado. Isso só beneficiaria os infratores, que se sentiriam livres para delinquir”, completa o jornal.

O editorial do jornal gerou críticas nas redes. A deputada estadual Renata Souza (PSOL) lembrou que a imprensa tem como papel a defesa da liberdade e do Estado Democrático de Direito, pautas previstas no próprio código de ética jornalística. “O racismo estrutural nos obriga a defender o óbvio sempre”, diz a parlamentar.

O advogado, pesquisador e professor de Direito e Direitos Humanos Thiago Amparo também criticou o editorial: “Ficará para a história como uma abjeta defesa ilegal de prender menores sem flagrante nenhum”. Ele também critica a decisão e diz que o objetivo dela é prevenir “crimes que sequer estão sendo cometidos”.

A jornalista Cecília Oliveira, do Intercept Brasil, lembrou de uma matéria do próprio jornal que aponta que 89 adolescentes foram apreendidos por autoridades e, após análise do Ministério Público, foi constatado que somente um dos casos justificava o recolhimento do menor de idade.

“O papo sobre recolher adolescente preto de chinelo e bermuda no Rio volta todo ano. Dados: 1 em 89 casos de jovens recolhidos analisados pelo MP tinha motivo real. Os outros têm nome… As políticas de segurança precisam ser ancoradas na realidade, não em foto pra jornal e voto”, avalia.