A edição de Le Monde deste sábado (22), traz uma entrevista exclusiva com Chico Buarque. O cantor, compositor e escritor fala sobre a situação atual do Brasil e sobre o pedido de visto de longa duração na França que fez recentemente.
Chico fala que a situação é diferente da de 1969, quando esteve exilado na França. Ele explica que está em Paris escrevendo, como faz com frequência. “Simplesmente porque em Paris estou mais tranquilo, tenho mais tempo, por exemplo, para me concentrar em escrever o livro que comecei no início deste ano. Em 1969, havia um regime militar no poder, com perseguição concreta e direta dos artistas”, relata.
“Cultura de ódio”
Ele explica que hoje os artistas brasileiros não são bem-vindos, nem bem vistos pelo governo. “Uma cultura de ódio se espalhou de maneira impressionante”. Chico conta que o novo governo despreza totalmente a cultura. Mas diz que, apesar do pedido de visto francês, quer continuar a viver no Brasil. “Não posso viver longe de meu país”, afirma.
Questionado sobre a atual crise política no Brasil, Chico diz que ela vem de longe, concretamente a partir do impeachment de Dilma Rousseff. “Tenho muitas reservas ao PT, o partido teve episódios de corrupção, como os governos precedentes”, afirma. “Mas depois da derrota da direita nas eleições presidenciais, o PT foi incrivelmente estigmatizado”.
Erros petistas
A respeito dos erros cometidos pelo PT, Chico diz que o partido renunciou a muitos de seus ideais, pois Lula estava cansado de perder eleições. “Ele decidiu fazer do PT um partido de governo. Por isso fez concessões, acordos com forças que o PT não teria aceito em tempos normais. O PT deixou de ser um partido de esquerda para se tornar uma formação socialdemocrata”, explica.
Sobre o atual governo, Chico diz que ele pode ser considerado como neofascista, por compartilhar muitas práticas com os regimes de direita. O artista cita as incongruências, como a influência de Olavo de Carvalho sobre Jair Bolsonaro, ou um “ministro da educação contra a educação” e “um ministro do meio ambiente contra o meio ambiente”, além de um chanceler “louco”. “Esse homem vai contra a história de excelência da diplomacia brasileira”, explica.
“Prestígio quase zero”
“Às vezes me digo que é melhor não ter ministro da Cultura neste governo! A cultura já é atacada de toda parte, se tivesse um ministro, a situação seria ainda pior”, acrescenta Chico.
O artista diz que as mobilizações fora do Brasil contra o governo Bolsonaro são válidas, mesmo sendo difícil medir a eficácia dessas iniciativas. “O prestígio do Brasil hoje é quase zero no exterior”.
“Não sei como tudo isso vai acabar. O fracasso desse governo me parece óbvio”, declarou o artista ao jornal Le Monde.
Da RFI
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