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Lula questiona legitimidade do G7 em cúpula do bloco e ataca Estado mínimo 

Convidado para participar da cúpula do G7, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva usou seu discurso no evento neste sábado (20) para questionar a própria legitimidade do grupo e defender uma reforma das instituições globais para permitir que emergentes tenham mais voz nas decisões.

Lula ainda criticou o que chamou de “equívoco” do neoliberalismo e, diante dos presidentes das democracias mais ricas do mundo, questionou o fracasso das principais potências em lidar com as crises internacionais.

Ao listar os diversos desafios que o mundo enfrenta, Lula afirmou que a solução “não está na formação de blocos antagônicos ou respostas que contemplem apenas um número pequeno de países”.

“Isso será particularmente importante neste contexto de transição para uma ordem multipolar, que exigirá mudanças profundas nas instituições”, disse.

“Nossas decisões só terão legitimidade e eficácia se tomadas e implementadas democraticamente”, afirmou, numa referência à necessidade de que mais países possam fazer parte das decisões globais. Na reunião, Lula estava sentado ao lado de Joe Biden, presidente dos EUA.

O brasileiro hesitou em aceitar o convite dos anfitriões japoneses e apenas topou ir à cúpula depois que ficou claro que os países convidados teriam um espaço maior. Além do Brasil, governos como o da Índia, Indonésia, Vietnã e outros estão em Hiroshima.

Não faz sentido conclamar os países emergentes a contribuir para resolver as ‘crises múltiplas’ que o mundo enfrenta sem que suas legítimas preocupações sejam atendidas, e sem que estejam adequadamente representados nos principais órgãos de governança global.

Em pleno G7, Lula preferiu destacar a existência de outro grupo, o G20. Mas defendeu que ele seja expandido ao continente africano.

A consolidação do G-20 como principal espaço para a concertação econômica internacional foi um avanço inegável.

Ele será ainda mais efetivo com uma composição que dialogue com as demandas e interesses de todas as regiões do mundo. Isso implica representatividade mais adequada de países africanos.

Lula voltou a defender a reforma da ONU: “Coalizões não são um fim em si, e servem para alavancar iniciativas em espaços plurais como o sistema ONU e suas organizações parceiras”.

“Sem reforma de seu Conselho de Segurança, com a inclusão de novos membros permanentes, a ONU não vai recuperar a eficácia, autoridade política e moral para lidar com os conflitos e dilemas do século XXI”, disse.

Um mundo mais democrático na tomada de decisões que afetam a todos é a melhor garantia de paz, de desenvolvimento sustentável, de direitos dos mais vulneráveis e de proteção do planeta. Antes que seja tarde demais.

Críticas ao neoliberalismo, ao Estado mínimo e reformas insuficientes

Ao discursar, Lula ainda lembrou que da última vez que participou do G7, em 2009, o mundo enfrentava “uma crise financeira global de proporções catastróficas, que levou à criação do G20 e expôs a fragilidade dos dogmas e equívocos do neoliberalismo”.

Mas lamentou que todas as reformas propostas naquele momento não foram implementadas.

“O ímpeto reformador daquele momento foi insuficiente para corrigir os excessos da desregulação dos mercados e a apologia do Estado mínimo”, disse o presidente brasileiro.

A arquitetura financeira global mudou pouco e as bases de uma nova governança econômica não foram lançadas.

Lula ainda apontou para “retrocessos importantes, como o enfraquecimento do sistema multilateral de comércio”.

“O protecionismo dos países ricos ganhou força e a Organização Mundial do Comércio permanece paralisada. Ninguém se recorda da Rodada do Desenvolvimento”, insistiu.

Segundo ele, os desafios se acumularam e se agravaram. “A cada ameaça que deixamos de enfrentar, geramos novas urgências”, destacou.

Lula ainda apontou que, hoje, o mundo vive a sobreposição de múltiplas crises: pandemia da covid-19, mudança do clima, tensões geopolíticas, uma guerra no coração da Europa, pressões sobre a segurança alimentar e energética e ameaças à democracia.

“Para enfrentar essas ameaças é preciso que haja mudança de mentalidade. É preciso derrubar mitos e abandonar paradigmas que ruíram”, defendeu.

“O sistema financeiro global tem que estar a serviço da produção, do trabalho e do emprego. Só teremos um crescimento sustentável de verdade direcionando esforços e recursos em prol da economia real”, disse.

Ele também criticou a forma como o mundo lida com países endividados.

“O endividamento externo de muitos países, que vitimou o Brasil no passado e hoje assola a Argentina, é causa de desigualdade gritante e crescente, e requer do Fundo Monetário Internacional um tratamento que considere as consequências sociais das políticas de ajuste”, disse.

“Desemprego, pobreza, fome, degradação ambiental, pandemias e todas as formas de desigualdade e discriminação são problemas que demandam respostas socialmente responsáveis”, discursou, defendendo um “Estado indutor de políticas públicas voltadas para a garantia de direitos fundamentais e do bem-estar coletivo”.

Lula pediu “um Estado que fomente a transição ecológica e energética, a indústria e a infraestrutura verdes”.

“A falsa dicotomia entre crescimento e proteção ao meio ambiente já deveria estar superada. O combate à fome, à pobreza e à desigualdade deve voltar ao centro da agenda internacional, assegurando o financiamento adequado e transferência de tecnologia. Para isso já temos uma bússola, acordada multilateralmente: a Agenda 2030”, completou.

“Não tenhamos ilusões. Nenhum país poderá enfrentar isoladamente as ameaças sistêmicas da atualidade.”

*Jamil Chade é colunista do UOL.

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