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Deputados federais gastam valores exorbitantes em itens como passagens aéreas, hospedagens, aluguéis de carro e propaganda de seus mandatos. No ano passado, alguns deles chegaram a fazer despesas de mais de meio milhão

Os deputados federais gastaram R$ 235,7 milhões da cota parlamentar em 2024. Esse dispositivo, instituído em 2009 e que unificou a verba indenizatória, a cota de passagens aéreas e a cota postal-telefônica, é uma espécie de orçamento que eles têm para custear os mandatos. Entre as despesas, estão as com passagens aéreas, hospedagens, aluguéis de carro e a divulgação da atividade parlamentar — que foi a categoria com mais gastos no ano: R$ 93,3 milhões (39,57% do total).

O mês com mais despesas foi abril, com R$ 22,1 milhões. A maior parte do total foi destinada à divulgação da atividade parlamentar, que, na prática, é uma espécie de propaganda que os deputados fazem, com dinheiro público, das ações de seu mandato. Em seguida aparecem aluguel de veículos, com R$ 40,6 milhões (17,24%); passagens aéreas, R$ 34,9 milhões (14,79%); manutenção de escritório, R$ 31,3 milhões (13,27%); e combustível, R$ 21,8 milhões (9,25%), além de R$ 13,9 milhões, classificados como “outros”.

A Câmara ainda incluiu, nesse mês, os custos com despacho de bagagens e o pagamento de serviços de acesso à internet durante os voos. Por mês, cada deputado pode receber até R$ 51,4 mil a título de cota parlamentar — o valor varia de estado para estado levando em conta a distância em relação a Brasília e, consequentemente, os valores de passagens aéreas. O estado com maior cota é Roraima: R$ 51.406,33.

São de lá os dois deputados que mais usaram a cota parlamentar em 2024. O deputado Zé Haroldo Cathedral (PSD-RR) gastou R$ 628,7 mil no período (média de R$ 52,4 mil, acima da cota para o estado de Roraima). Desse total, 61,8% (R$ 388,7 mil) foi com divulgação do mandato.

Em seguida, está o deputado Gabriel Mota (Republicanos-RR). Ele usou R$ 621,2 mil no ano (média de R$ 51,8 mil por mês). Os maiores dispêndios foram com manutenção de escritório (R$ 284,7 mil) e divulgação da atividade parlamentar (R$ 264 mil).

O ranking tem ainda o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), que gastou R$ 619,9 mil; o deputado João Maia (PP-RN), com R$ 598 mil; e o deputado Vinicius Gurgel (PL-AP), com R$ 590,2 mil.

Quando se comparam os gastos de cota parlamentar por liderança da Casa, aparece em primeiro a do PT, com R$ 287,8 mil. Em seguida, está a do Progressistas (PP), com R$ 102 mil, e a do Republicanos, com R$ 93 mil. O total de despesas feitas pelas lideranças com essa rubrica foi de R$ 834,5 mil.

Já em verba de gabinete, usada para pagar assessores, os deputados consumiram R$ 672,1 milhões no ano. O mês de março foi o que teve maior volume, com R$ 61,8 milhões. No caso desse recurso, cada deputado tem R$ 125.478,70 por mês para pagar salários de até 25 assessores em Brasília ou em seus estados de origem.

Os parlamentares ainda recebem R$ 44 mil em salário, têm plano de saúde e auxílio-moradia ou imóvel funcional no caso dos que não moram em Brasília. Em relação ao auxílio-moradia, cada um tem direito a receber R$ 4.253,00 quando não ocupa um dos 447 apartamentos funcionais da Câmara em Brasília. Nos casos em que o aluguel é maior do que o valor do auxílio-moradia, o deputado pode usar verba da cota parlamentar para pagar a diferença. O limite é de R$ 4.148,80.

Atualmente, dos 447 apartamentos da Câmara, 399 estão ocupados e 48, em reforma. Os deputados têm um prazo para ficar nos imóveis da Casa. Atualmente, só um continua ocupando apartamento funcional fora do prazo: o ex-deputado Hildo Rocha (MDB-MA), que voltou à Câmara por um breve período em 2024 (de maio a agosto) e até hoje não devolveu o imóvel que passou a ocupar naquela época.

Revisão de gastos

Para Marina Atoji, diretora de programas da Transparência Brasil, a cota parlamentar faz sentido para custear o mandato, mas os gastos precisam ser revistos, já que há categorias que não fazem mais sentido. “Se a gente for pensar em correspondência, por exemplo, o montante que é destinado a correspondência é ridicularmente grande em termos do que se usa hoje em dia de correspondência para envios. A divulgação do mandato parlamentar eu também acho que é desproporcional se você considerar o fato de que a própria Câmara tem os seus meios de comunicação sobre os mandatos, qualquer parlamentar hoje pode ter uma rede social que é de graça”, argumenta.

No caso da comunicação do mandato, a verba de gabinete serve também para pagar assessores de comunicação. Na análise de Marina, portanto, faria sentido discutir uma diminuição com a divulgação do mandato na cota parlamentar. Há, ainda, um outro problema de transparência quando o assunto são esses gastos. Segundo a especialista, apesar de a Câmara ter uma política de dados abertos e transparência ativa, diversas notas fiscais apresentadas por deputados são genéricas e não especificam os gastos.

“As notas fiscais, às vezes, são muito genéricas. Por exemplo: prestação de serviços de comunicação. Mas foi o quê? Foi fotografia? O que isso significa? Aí tem margem para esconder muita coisa. As consultorias, por exemplo, são um pesadelo. É consultoria de quê? Às vezes, é consultoria de imagem. O parlamentar está usando dinheiro público com consultoria de imagem?”, questiona.

Para melhorar a fiscalização desses recursos, segundo a especialista, é preciso que tanto a Câmara quanto o Senado (que ela considera que tem uma política de transparência atrasada em relação à Casa Baixa) melhorem sua regulamentação e obriguem os congressistas a especificar seus gastos com cota parlamentar. “Mas se eles não se dão ao trabalho de descrever e detalhar as emendas que apresentam, acho que seria demais esperar que eles regulamentassem dar detalhes sobre as notas fiscais de verba indenizatória”, diz.

O Correio procurou todos os deputados citados nesta reportagem por meio de seus gabinetes na Câmara para perguntar se gostariam de justificar os gastos com a cota parlamentar. Não houve resposta até o fechamento da edição.

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