Ao Valor Econômico, secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Guilherme Mello, disse que o governo Lula não vai se curvar aos interesses especulativos do mercado financeiro
Guilherme Mello, secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda
A reação irresponsável do mercado financeiro ao pacote de medidas fiscais anunciadas pelo governo Lula trará consequências indesejáveis à economia do país. Em entrevista ao jornal Valor Econômico, publicada nesta quarta-feira (18), o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Guilherme Mello, advertiu que tanto a disparada do dólar quanto a alta dos juros impactarão os preços.
Muito embora os especuladores tenham declarado guerra contra a administração Lula, Mello rechaçou qualquer alteração no ajuste e assegurou que o presidente tem total compromisso com ele. “O compromisso é tão grande que ele colocou como tema central do governo, durante semanas, a sustentabilidade fiscal. Esse é o tamanho da prioridade para o presidente”, descreveu.
O secretário do Ministério da Fazenda ponderou que a alta da moeda estadunidense e as ameaças de escalada dos juros afligem o governo federal. “Claro que nós nos preocupamos tanto com a curva de juros quanto com a taxa de câmbio”, reconheceu. “Sabemos o impacto disso do ponto de vista de preços, inflação, e do ponto de vista de atividade”, acrescentou o secretário.
Mello também lembrou que o mercado havia sinalizado como suficiente um corte de R$ 70 bilhões nas despesas do governo nos próximos dois anos, mas tem reagido mal desde que esse mesmo montante foi anunciado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT-SP), há três semanas.
“Bancos e gestoras do setor financeiro falavam dias antes do anúncio que algo em torno de R$ 70 bilhões nos próximos dois anos seria bom o suficiente. E nós anunciamos R$ 70 bilhões em dois anos”, criticou o secretário.
“Vejo alguns cálculos ainda defasados. Por exemplo: cálculos que consideram que a proposta de DRU [Desvinculação de Receitas da União] não tem impacto fiscal. Desculpe, mas esses cálculos estão errados, porque nós ampliamos o escopo da DRU. Com isso, ela afeta um conjunto de fundos cujas despesas, se não fosse essa ampliação do escopo, cresceriam algo em torno de R$ 5 bilhões a R$ 6 bilhões nos próximos anos. Não crescerão mais. Então, tem impacto fiscal”, sustentou Mello.
Expectativas equivocadas
Na avaliação do secretário da Fazenda, é possível que as projeções de uma demanda aquecida, conforme entende o Banco Central (BC), estejam erradas e que o ciclo de elevação da taxa básica de juros da economia (a Selic) se apresente contraproducente. “Apesar do crescimento mais forte [da atividade], ainda não vemos pressões vindas da inflação de serviços intensivos em trabalho ou mesmo dos núcleos inflacionários”, apontou Mello.
“Essas expectativas pressionadas podem se mostrar equivocadas, caso realmente observemos o cenário que o próprio mercado está trabalhando, de um crescimento mais moderado e de um mercado de trabalho um pouco mais harmônico, digamos assim, um pouco mais distensionado”, argumentou.
Na última reunião, o Comitê de Política Monetária (Copom) do BC elevou a Selic em 1 p.p., atingindo o patamar de 12,25% ao ano, o segundo encargo mais oneroso do mundo, podendo ainda chegar a 14% em 2025, consideram os mais alarmistas.
O pacote fiscal no Congresso
De acordo com o líder do governo no Congresso, senador Randolfe Rodrigues (PT-AP), a intenção é votar todas medidas que tratam do corte de gastos – Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2024 – ainda nesta semana, dentro do tempo hábil para a tramitação.
Além da PEC, há outras duas matérias a serem deliberadas pelos parlamentares: o Projeto de Lei Complementar (PLP) 210/2024, que autoriza o governo federal limitar o uso de créditos tributários em caso de déficit nas contas públicas; e o Projeto de Lei (PL) 4.614/2024, que altera a valorização do salário mínimo, ajustando-a aos parâmetros do arcabouço fiscal.
“É possível [votar até o fim do ano as três matérias] e o governo está à disposição para debater com o Congresso sobre isso. O que não pode é desidratar e tornar inócuo o que é inevitável, e que é necessário para o Brasil passar pelas turbulências que tem no próximo período”, indicou Randolfe.
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