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O candidato Guilherme Boulos (Psol) pretende adotar um programa de moradia para a construção de 100 mil casas populares em regime de mutirão na cidade de São Paulo. A proposta de enfrentamento ao déficit habitacional foi apresentada na noite desta segunda-feira (16), durante o primeiro debate após o primeiro turno das eleições municipais, realizado pela CNN Brasil. “Vamos trazer de volta o programa de mutirões que foi criado quando minha vice, Luiza Erundina, foi prefeita de São Paulo. É possível construir em grande quantidade porque nesse sistema são as famílias que constroem suas casas, as construtoras são excluídas e tudo fica mais barato”, disse. “Moradia não é projeto eleitoral. Para mim é questão de vida”.

Em resposta ao oponente Bruno Covas (PSDB), que reduz a solução de gargalos em diversos setores à assinatura de novos contratos com investidores, Boulos não deixou por menos. “Covas, vocês insistem muito nessa questão das parcerias com a iniciativa privada”, disse, referindo-se também ao governador tucano João Doria. “Mas vocês não conhecem a realidade de pessoas de baixa renda, que nem podem passar na porta do banco, que precisam decidir entre pagar o aluguel ou comer, ou que moram de favor, sofrendo todo tipo de humilhação, ou em encostas. Nós não podemos nos isentar dessa responsabilidade.”

A segunda onda da infecção pelo novo coronavírus no país, que ainda não controlou nem a primeira, foi outra questão que expôs os desacertos das políticas adotadas na cidade com o maior número de casos e mortes e a incapacidade da atual gestão que busca a reeleição. Como se pudesse enganar a todos, Covas afirmou que conduziu ações conjuntas com o estado, que foram construídos hospitais de campanha e que ao contrário de muitos lugares, em São Paulo “os médicos não tiveram de escolher quem iria viver”.

Isso em resposta a Boulos, que afirmou que, se eleito, faria tudo o que não foi feito em São Paulo – as testagens em massa, o isolamento, o envolvimento dos agentes comunitários de saúde na busca de casos de contaminação e investimentos para ampliar a capacidade dos hospitais públicos.

Chamado de “engenheiro de obra pronta”, Boulos dispensou o título, já que a “obra falhou”: lembrou que nenhum hospital de campanha foi construído na periferia, onde mais morrem vítimas da covid-19, não foram feitos investimentos em hospitais e ao contrário do que diz o tucano, faltou respiradores em diversos hospitais.

Um ponto alto do debate foi a discussão em torno de recursos para a execução dos projetos. Enquanto Covas falava em planos para atrair investimentos da iniciativa privada, já que segundo ele a prefeitura tem dificuldades de caixa, Boulos propôs o equilíbrio das contas por meio da cobrança dos grandes devedores. “Há R$ 130 bilhões na dívida ativa que poderiam ser cobrados. Para isso vamos contratar mais auditores, modernizar o sistema para digitalizar tudo. Mas muitas vezes não há interesse de cobrar. Há ainda prejuízos com contratos com a gestão do lixo, de mais de R$ 300 milhões ao ano segundo o Tribunal de Contas. Por que você e Doria não mexeram nesse vespeiro?”, questionou.

A pergunta despertou a ira do tucano, que ele desconversou para ganhar tempo. Covas disse se sentir ofendido “nos princípios morais que aprendeu em casa”. E se limitou a dizer que muitos contratos de varrição, assinados na gestão anterior, haviam sido alterados.

Questionado sobre a proposta de reforma tributária que tramita na Câmara, que retira ainda mais recursos dos municípios, Boulos foi enfático: “Sou contra tirar mais recursos de São Paulo como de qualquer município. A União já concentra mais recursos que os municípios”, disse, se comprometendo a liderar um movimento de prefeitos no Congresso para exigir mudanças na proposta do governo de Jair Bolsonaro.

Tom agressivo

O debate, que durou duas horas, foi marcado pelo tom agressivo do atual prefeito de São Paulo. “Como chefe de movimento que é, em que está acostumado a mandar, não sabe que nem todo dinheiro em caixa quer dizer que é para se gastar. E que política se faz com diálogo”, emendou ao questionamento de Boulos sobre a insuficiência de investimentos municipais no combate à pandemia, que deveria incluir a ajuda econômica a pequenos comerciantes e trabalhadores informais.

Mas a agressividade foi dando lugar ao desconforto causado pela associação de seu nome ao de João Doria. O BolsoDoria, segundo Boulos, que Covas quer esconder porque foi eleito em 2018, em uma eleição marcada pelo ódio. “Tinha gente apertando botão da urna eletrônica com cano de revólver. Desta vez, o voto foi de esperança, não de ódio”. E também por uma réplica do candidato do Psol: “Covas quer criminalizar o movimento. Fiquei assustado com o seu discurso de raiva após o resultado das urnas, ao se referir às nossas propostas como radicalismo. Você não precisa fazer eco ao discurso do autoritarismo.”

Discurso bonito

Em muitos momentos acuado pela própria falta de projetos estruturantes, Covas buscou se autoafirmar com a sua propalada “experiência”, diversas vezes ressaltada em contraposição ao suposto despreparo do oponente. Chegou a dizer que “política não se faz só com discurso bonito”.

No entanto, foi Boulos que tinha na ponta da língua seu projeto para a recuperação econômica da cidade em 2021, quando à pandemia serão somadas as demandas que foram represadas neste ano. Uma lista que inclui a cobrança dos grandes devedores do município, geração de empregos nas periferias, criação de frentes de trabalho, fortalecimento da economia solidária com compras públicas, principalmente de alimentos orgânicos, parceria com cooperativas de catadores para ampliar a coleta seletiva para todo o município, humanização na abordagem multidisciplinar dos usuários de drogas e criação de uma política voltada aos moradores de rua. “Vamos construir outro modelo de cidade”, disse, dirigindo-se aos espectadores e também ao oponente aparentemente perplexo com a chegada do candidato do Psol ao segundo turno.

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