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Boaventura de Sousa Santos: Bolsonaro deverá ser julgado por ‘atitude genocida.

A omissão do presidente Jair Bolsonaro no combate à pandemia de coronavírus e a sabotagem às medidas de isolamento, mais do que incompetência, revelam uma vontade de produzir a morte de milhares de pessoas que são consideradas “descartáveis”. É o que afirma o jurista e sociólogo português Boaventura de Sousa Santos. “É uma atitude genocida de Bolsonaro que um dia deverá ser julgada no Tribunal Penal Internacional”, afirmou.

Pela “atitude genocida”, Bolsonaro já havia sido denunciado ao TPI em abril. Também foi denunciado anteriormente por crimes contra povos indígenas e o meio ambiente. Professor aposentado da Faculdade de Economia e diretor emérito do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, Boaventura destacou que, diferentemente dos demais países, o Brasil passa por duas crises: a sanitária e a política.

Ele participou, nesta sexta-feira (17), de uma reunião virtual com representantes de movimentos sociais. No evento, foi apresentado um balanço de 100 dias da campanha Vamos Precisar de Todo Mundo. Iniciativa conjunta e solidária das frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo, a campanha já distribuiu 810 toneladas de alimentos a famílias prejudicadas pela pandemia.

Boaventura destacou que apenas os Estados Unidos enfrentam situação mais difícil que a brasileira no combate ao coronavírus. “Bolsonaro é uma caricatura do presidente Donald Trump, que é tão mau quanto ele, só que tem mais poder.”

O sociólogo destacou as constantes trocas de comando no ministério da Saúde, além da sua ocupação por militares. Como exemplo do desastre causado pela falta de políticas no combate à doença, ele citou um estudo que concluiu que, de 180 mulheres grávidas ou em pós-parto que morreram durante a pandemia, 124 eram brasileiras. “É um feminicídio escondido das mulheres grávidas”, afirmou.

Vanguarda política

A maior parte dos alimentos doados pela campanha Vamos Precisar de Todo Mundo vem das organizações do campo, como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA). Além dos alimentos, a campanha distribui máscaras e insumos de higiene, e ainda ofereceu orientação e assistência médica e jurídica, em mais de 300 pontos do país, em especial nas periferias.

“Longe de ser caridade, as ações de solidariedade são oportunidades para mobilizar o povo”, afirmou Raimundo Bomfim, coordenador da Central de Movimentos Populares (CMP) e da Frente Brasil Popular.

Boaventura saudou a unidade dos movimentos em torno de ações desse tipo, que devem servir como modelo para o pós-pandemia. “Vocês não estão a ir nas comunidades à espera das eleições e dos votos. Estão a ir mostrando capacidade de se sacrificar e se arriscar. É um trabalho que os políticos – que têm dado mais centralidade às atividades partidárias – devem olhar. Vocês é que são a vanguarda, e não eles.”

Desafios da democracia

Segundo o sociólogo português, a democracia brasileira está em crise desde o golpe do impeachment, em 2016, contra a ex-presidenta Dilma Rousseff, a quem considera uma das políticas mais honestas da América Latina. “E que foi impedida pelos políticos mais corruptos da região.”

Já a Operação Lava Jato ele classificou como “uma grande confluência de autoridades do Brasil e dos Estados Unidos para destruir a economia brasileira”. Boaventura, que visitou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na carceragem da Polícia Federal, em Curitiba, disse que sempre teve a certeza de que ele foi “condenado injustamente”.

Para o português, o desafio dos brasileiros é fazer resistir a democracia para permitir uma renovação política. Segundo ele, junto com o “Fora Bolsonaro”, é preciso combater as políticas neoliberais do ministro da Economia, Paulo Guedes. “A política que ele quer implementar não se pode aplicar numa democracia. É por isso que eles falam em golpe. Porque sabem que vai haver resistência a muitas dessas medidas.”

Privatização da água

Além da “atitude genocida” de Bolsonaro, Boaventura chamou de “crime contra a humanidade” o processo de privatização da água, que será desencadeado a partir da recente aprovação do novo Marco Legal do Saneamento. “Devíamos estar todos em pé de guerra”. Como exemplo, ele citou países da América Central, como Honduras e Guatemala, que também privatizaram seus serviços de saneamento. Em meio à pandemia, famílias tiveram o fornecimento de água cortado por atraso no pagamento. Após intervenção dos governos para suspender os cortes, as empresas agora ajuízam ações contra os Estados, sob alegação de ter registrado “perdas milionárias”.

Rede Brasil Atual 

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