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Nas horas subsequentes ao depoimento que Lula fez a Sérgio Moro, em 10 de maio de 2017, os procuradores e o juiz Sérgio Moro revelaram ansiedade com a impressão deixada pelo testemunho do ex-presidente.

Na mesma noite, talvez com a impressão de que a defesa tinha se saído bem, Moro pediu a Deltan Dallagnol, o procurador-chefe da Força Tarefa da Lava Jato, que considerasse emitir uma nota oficial apontando as contradições de Lula.

No dia seguinte, depois de avaliar a repercussão, Deltan informou ao juiz que considerava a nota desnecessária, já que a própria imprensa atacava as falas de Lula.

As mensagens no topo deste post aparecem em ordem cronológica. Para ver todo o contexto, clique aqui.

Elas foram publicadas pelo Intercept Brasil e escolhidas por nós para refletir a diferença de opinião entre os procuradores.

Carlos Fernando dos Santos Lima sugeriu ir “na jugular” de Lula, por supostamente ter culpado a falecida ex-primeira dama Marisa Letícia pelo interesse no tríplex.

Lula apresentou justificativas sobre um processo de tomada de decisão que qualquer casal reconhece: divergências de opinião entre marido e mulher.

Se são ou não verdadeiras, é impossível determinar.

Documentalmente, de fato dona Marisa tinha comprado cotas de um apartamento em Guarujá e Lula havia declarado as cotas na declaração de imposto de renda do casal.

Se quisessem, com o valor pago pelas cotas, mais a diferença — na versão da defesa — poderiam ficar com o tríplex.

Lula apresentou justificativas razoáveis por seu desinteresse pelo apartamento: julgou que não teria privacidade na praia e que o imóvel era pequeno para o casal, os filhos, os netos e a bisneta recém-nascida.

Porém, dona Marisa visitou mais uma vez o imóvel, o que coloca em dúvida a versão de Lula — ele diz que só soube da visita posteriormente e que continuou desinteressado no tríplex.

A favor do ex-presidente está o fato de que ele de fato poderia pagar facilmente pelo imóvel, já que arrecadava um dos cachês mais altos do planeta pelas palestras que apresentava no Brasil e no mundo.

No debate entre os procuradores, subsequente ao depoimento de Lula, Athayde Ribeiro Costa disse que a nota sugerida por Moro era desnecessária, já que a Globonews estava fazendo o “serviço” — em outra mensagem, Deltan Dallagnol já havia afirmado o mesmo.

Deltan também disse que jornalistas haviam sido municiados informalmente com o que a acusação via como contradições e imprecisões de Lula.

Sugeriu que, se fosse necessário, era possível conseguir um jornalista que encampasse como suas as opiniões da Lava Jato.

Este conjunto de fatos expõe as relações íntimas entre a Lava Jato e alguns jornalistas.

Na sequência do debate entre os procuradores, Antonio Carlos Welter voltou com o resultado de uma consulta a amigos, segundo os quais Lula botara “a culpa na mulher morta”.

No dia seguinte, outro integrante da Lava Jato concluiu: pelas capas da Folha e do Estadão, o ex-presidente tinha se queimado pelo mesmo motivo.

Lula nega posse de tríplex e atribui decisões a Marisa, destacou a Folha.

Interesse por tríplex era de Marisa, diz Lula a Moro, escreveu o Estadão.

Factualmente, as duas manchetes estão corretas.

No dia anterior, a máquina de moer carne da extrema-direita nas redes sociais já tinha acusado Lula de queimar Marisa, que já não tinha chance de se defender.

Os mesmos que festejaram a morte da ex-primeira dama com requintes de crueldade agora se diziam indignados com o que Lula havia dito sobre ela no depoimento.

Não sabemos ainda qual foi o conteúdo dos contatos dos procuradores com os jornalistas durante ou depois do depoimento de Lula.

Talvez eles apareçam nos vazamentos que o Intercept ainda não publicou.

Se não houve direcionamento explícito da Lava Jato, só podemos atribuir à afinidade ideológica: as prioridades de Moro e de alguns procuradores, como Santos Lima — enfatizar as supostas contradições do réu e pintar Lula como “traidor” da ex-mulher — foram parar com destaque na Globonews e em manchetes dos principais jornais no dia seguinte.

por Diario do Centro do Mundo