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Fazia muito tempo que eu não saía do cinema tão extasiada.

A última vez que isso aconteceu, no longínquo período pré-pandemia, foi quando vi o documentário sobre Dilma Rousseff, intitulado Alvorada (2020), que por sinal recomendo fortemente, assim como recomendo muito o filme do qual vou falar agora.

Eu particularmente não ligo pra spoiler. No cinema não é o fator surpresa na narrativa que me prende, é a maneira como a cena é feita, é o olhar, a trilha sonora, as atuações, enfim. Mas se você se importa, é bom avisar mais uma vez: contém spoiler

“Medida Provisória”, primeiro filme de Lazaro Ramos, leva dez em todos esses pontos e quantos mais você puder imaginar. Que filme, senhoras e senhores! Que filme. Eu não sei nem por onde começar a enaltecer essa obra prima.

A história se passa num futuro distópico em que as pessoas negras, então intituladas de “melanina acentuada”, são perseguidos, mortos e exilados “de volta” para a África.

Qualquer semelhança entre “melanina acentuada” e “afrodescendente” não é mera coincidência: nesse detalhe, o filme consegue passar uma mensagem potente: não adianta usar eufemismos quando as pessoas negras ainda estão sendo perseguidas e mortas.

Aliás, esse futuro distópico é, ao meu ver, na verdade uma hipérbole do racismo do presente. Porque as pessoas negras continuam sendo mortas, muitas vezes dentro de suas próprias casas. A única diferença é que, no presente, a polícia é quem mata. Já houve o capitão do mato, a PM e quem sabe quantas nomenclaturas vão surgir até todo mundo parar de fingir que esse genocídio não está acontecendo?

Grosso modo, trata-se basicamente de um filme com  pessoas negras fugindo e criando alternativas para não serem, de uma forma ou de outra, eliminadas. Mas dentro dessa narrativa existem vários detalhes, camadas mesmo, que eu peço que vc embarque aqui comigo nessa viagem

O casal de protagonistas, Antônio e Capitu, são interpretados por Taís Araújo e Alfred Enoch – parênteses para aclamar a atuação dessa mulher. A entrega da atriz à personagem – principal pilar de uma boa atuação – é perceptível em todas as cenas.

E tem uma coisa que eu também observei – eu gosto de observar os detalhes, acho que análise fílmica serve pra isso mesmo – é que esse filme não mostra só o negro sofrendo, como quase todos os outros filmes com a mesma temática.

Capitu, personagem de Taís Araújo, é uma médica renomada. Seu marido, um advogado. E é bom ver negros interpretando personagens que não sejam a empregada ou o motorista ou o figurante que não pode chamar muita atenção, Lázaro Ramos envia, com isso, um sutil recado: preto não precisa interpretar apenas personagens subalternos.

E tem mais, as pessoas negras dançam apesar dos pesares. trocam afetos, se divertem. Não são desumanizadas como o ator negro sempre chamado pra interpretar o motorista.

Aliás uma das protagonistas, Capitu, acaba conseguindo fugir da perseguição dos capitães do mato do futuro e vai parar em um “AfroBanker” – a nova versão da senzala – e é justamente nessa parte que o diretor explora o que há de bom em sua cultura e em sua gente, fora do olhar preconceituoso dos brancos: existe união, afeto e troca em uma convivência comunitária pacífica, à qual os brancos ambiciosos jamais se submeteriam.

Chega de ver negro sofrendo na TV. Queremos ver negros médicos, advogados, comunicadores, pais e sobretudo, vivos. Queremos ver negros se divertindo – imagine o quanto um negro se divertindo na TV é lindo e potente?!

Sem falar nos movimentos de câmera, planos sequência dignos de um diretor de cinema experiente, o que me faz duvidar que esse é mesmo o primeiro filme de Lázaro. Como se não bastasse entregar tudo isso, o filme ainda dedica alguns segundos para referenciar o golpe de 2016: quem escolhe exilar os negros é um branco engravatado, em nome de deus e da família.

Vocês entendem todas essas correspondências entre ficção e realidade?

Vocês entendem a gravidade disso? Entendem o quanto isso está na verdade muito perto da nossa realidade presente? Eu entendo, e me apavoro, me arrepia a espinha.

Sabe por quê não é futuro distópico? Porque o racismo explica 80% das causas de morte de negros no Brasil hoje.

“O que vai acontecer já está acontecendo.”

Aliás, por falar em morte (alerta spoiler!) outro personagem marcante é André, é interpretado por Seu Jorge e comunicador de mídia alternativa. O que vai acontecer já está acontecendo.

Ao trazer para a telona um personagem como este Lázaro Ramos tensiona a necessidade da gente se comunicar enquanto povo. A necessidade de o movimento negro (e os movimentos em geral) ocuparem mais os espaços de mídia.

Quem sabe a morte de André – uma cena que me atravessou fortemente – represente o silenciamento do povo negro, por bem ou por mal. Esse silenciamento existe aqui no mundo real e presente, e é por isso que essa cena me tocou num lugar que eu nem sabia que existia.

Vivemos num país racista e higienista, e isso não é ficção, nem opinião, são dados.

Se é que existe uma mensagem principal nesse filme, é que não basta aos negros, ou às minorias de modo geral, apenas resistir. É preciso agir, se fazer escutar nos veículos de mídia alternativa, reivindicar diretamente um lugar no seu próprio país. Não há cidadania gratuita às pessoas negras: elas precisam lutar para serem reconhecidas como cidadãs e cidadãos.

E essa luta, queridas e queridos, é nossa. Porque quando alguém diz “favela venceu”, quer dizer, entretanto: “um favelado venceu”. E isso é incrível, mas ainda não é tudo. Alguém venceu na favela, e isso é ótimo, isso inspira, mas isso não representa uma vitória coletiva.

O dom natural e ancestral de viver o coletivo, experimentar uma vida em comunidade, é, quem sabe, a parte mais bonita do filme. Um filme bonito sobre racismo – algo que muito certamente precisávamos, mas não sabíamos.

Obrigada, Lázaro Ramos e equipe. A Bahia te pega no colo.

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