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Michel Temer abraçou a frase atribuída a Washington Luís, segundo a qual “a questão social é um caso de polícia”.

O golpe, que retirou direitos e arrochou os mais pobres, quer se perpetuar explorando os efeitos daquilo que promoveu.

E Temer tem um plano: continuar no Planalto quando seu mandato acabar.

Através de eleições ou, melhor ainda — do ponto-de-vista dele –, de forma indireta, para “pacificar” o País.

A intervenção militar no Rio de Janeiro é o primeiro passo.

Como advertiu a deputada federal Jandira Feghali no vídeo acima, o Carnaval cristalizou a insatisfação com os governos municipal, estadual e federal na cidade.

E os bumbos da TV Globo se encarregaram de focá-la, a insatisfação, exclusivamente nas questões de segurança — gravíssimas, sim, mas não de hoje.

A falta de um candidato conservador às eleições de 2018 deixa aberta a fresta para o “ruim com Temer, pior sem ele”.

A colunista Vera Magalhães publicou informações valiosas no diário conservador Estadão:

Temer passou a ser incentivado a disputar um novo mandato por um grupo que reúne acólitos, marqueteiros em busca de emprego e parlamentares enrolados na Lava Jato.

O discurso com que tentam convencer o chefe tem vários argumentos: o de que a melhora na economia se fará sentir aos poucos, e mais fortemente próximo à eleição, que ninguém melhor para defender seu legado que ele próprio —se não for para ganhar, algo cuja possibilidade é hoje para lá de remota, ao menos para ter um palanque para elencar suas realizações—, que uma eleição sem Lula torna o resultado imprevisível e, por fim, que ainda não surgiu um nome fora das franjas de polarização da sociedade para galvanizar os votos do chamado centro moderado.

E mais:

Auxiliares do presidente com os quais conversei pela manhã reconhecem a impossibilidade prática de se decretar uma medida de tamanha magnitude para, poucos dias depois, suspendê-la para votar a reforma da Previdência.

Portanto, a morte que já estava anunciada agora ganha uma justificativa de “força maior”.

Quase uma saída honrosa para o fato de que o governo não tinha os votos para aprovar a mudança no regime de aposentadorias e pensões.

Para robustecer a pauta da segurança e dar um novo norte político ao governo, entra ainda a discussão sobre a criação do Ministério (que pode ser extraordinário) da Segurança.

Algo que vem bem a calhar, inclusive, para trocar de mãos o comando da Polícia Federal, que tem irritado o governo pela contundência, por exemplo, nas perguntas dirigidas a Temer no inquérito que investiga se houve favorecimento político a empresas do setor portuário quando da edição de um decreto na área.

E, assim, voltamos à Lava Jato: por trás do súbito entusiasmo com a candidatura Temer está um grupo (composto por ministros e parlamentares) que quer um biombo para as investigações.

Ou “estancar a sangria”, em termos romerojucaanos.

Isso entra no cálculo do próprio Temer para cogitar a candidatura: um eventual novo mandato lhe daria a prorrogação da prerrogativa de ter processos sustados enquanto ocupa a Presidência.

O que ela não disse é que o quadro social tende a se deteriorar com as medidas concentradoras de renda de Temer. E a violência, portanto, pode recrudescer, com a possível convocação das Forças Armadas para intervenções em outras cidades.

É a tal “intervenção constitucional” clamada pela extrema-direita nas ruas, mas feita aos poucos.

Temer vai à TV esta noite para anunciar a intervenção no Rio, parte de sua “campanha do Fico”. Enquanto ela durar, não podem ser feitas mudanças na Constituição.

E, a partir dela, é possível imaginar muitos cenários que desemboquem no adiamento das eleições de 2018:

A morte de militares por traficantes, por exemplo.

A reação popular a uma possível prisão de Lula.

Uma reação à “ameaça” sentida pelos militares de uma investigação sobre os crimes da ditadura — exemplificada pela publicação, no site do Exército, de críticas ao Ministério Público, que abriu a possibilidade de investigar.

O crescimento, para além da esquerda, do Fora Temer, que os radares da Paraíso do Tuiuti captaram e colocaram na Marquês de Sapucaí.

Em outras palavras, como no pré-golpe de 1964, o “caos” joga no time deles. E a agenda neoliberal bateu na trave, com o enterro da reforma da Previdência. A partir de agora, só à força.

Num grupo de whats app, já está circulando a imagem de um homem de boina preta, com uma estrela vermelha na cabeça, prometendo ‘sangue nas canelas’ se Lula for preso. O vídeo é acompanhado por fotos de armamento pesado.

Tudo indica que seja algo plantado, como está escrito nos manuais de guerra psicológica.

Em 1962, Wanderley Guilherme dos Santos produziu um texto, hoje clássico, Quem dará o golpe no Brasil, prevendo o que aconteceria dois anos depois. É ele quem escreve, hoje, que é preciso apostar nas eleições.

À esquerda o recomendável é que reformulasse sua pauta tendo a defesa das eleições de 2018 como ponto prioritário. Se possível, com um candidato único já no primeiro turno.

Nunca é demais relembrar o que disse o general Hamilton Mourão: “Os Poderes terão que buscar uma solução, se não conseguirem, chegará a hora em que teremos que impor uma solução… e essa imposição não será fácil, ela trará problemas”.

Acrescentou que os militares têm “compromisso com a Pátria, independente de sermos aplaudidos ou não”.

E mais: “O que interessa é termos a consciência tranquila de que fizemos o melhor e que buscamos, de qualquer maneira, atingir esse objetivo. Então, se tiver que haver [intervenção] haverá”.

Michel Temer acredita que a solução passa por ele — uma ideia que pode levar ao caos, “justificando” assim a manutenção indefinida do golpe que derrubou Dilma Rousseff, com ou sem Temer.

Como escreveu Marcelo Zero, reproduzido nesta página, “o golpe cruzou o Rubicão da democracia. Entrou em sua terceira e mais obscura fase. A fase do não-retorno, a fase da extirpação definitiva da soberania popular”.