Desde que assumiu a presidência, Bolsonaro trabalha com apenas quatro objetivos: sua reeleição, favorecer os negócios dos filhos, se distanciar com sua família da cadeia e escapar do impeachment
Desde que assumiu a presidência, Bolsonaro trabalha focado em claros objetivos: conseguir se reeleger e salvar sua família nos múltiplos escândalos em que se envolveu. Só que suas tentativas de pular cada uma dessas fogueiras gera um outro escândalo. O mais recente nessa longa lista, revelado pela revista Época, expõe o despudor do presidente da República, à revelia das leis, em usar todos os instrumentos que dispõe como chefe de Estado e de Governo em benefício próprio e de seus familiares. Usou a ABIN, um órgão de Estado, para espionar a Receita Federal, outro órgão de Estado, em uma ilegal e maluca tentativa de livrar o senador Flávio Bolsonaro, o 001, do evidente envolvimento no escândalo das rachadinhas, operado pelo notório Fabrício Queiroz.
Com relação aos filhos, não faltam exemplos do esforço permanente do presidente para ajudá-los nas mais diversas situações. Ainda no ano passado, tentou emplacar o deputado Eduardo “Bananinha” como embaixador do Brasil nos Estados Unidos, cargo de importância estratégica para o país. Como não conseguiu porque a decisão passava por uma votação no Senado, rachou o PSL para dar ao filhinho a liderança do partido na Câmara. Quebrou a cara mais uma vez e acabou ficando sem partido.
O vereador Carlos Bolsonaro, chefe do chamado gabinete do ódio, é outro que vive se metendo e dando as cartas no governo do pai. Conseguiu criar intrigas com Deus e o mundo e foi o responsável direto pela demissão de dois dos mais fieis aliados de Bolsonaro: Gustavo Bebianno, falecido em março deste ano, e o general Santos Cruz, amigo do presidente desde 1982. “Fui demitido pelo Carlos Bolsonaro, simples assim”, afirmou Bebianno na época da sua saída do governo.
O general Santos Cruz foi outra vítima do 02. A briga com Carluxo foi provocada pelo controle rigoroso das verbas de publicidade da Secretaria de Comunicação, feita pelo ex-ministro. Com a saída de Santos Cruz do governo, a Secretaria de Comunicação do Planalto transformou as verbas publicitárias em uma ação entre amigos para favorecer sites aliados, segundo uma série de reportagens publicadas ao longo do ano.
Só parecia escapar Jair Renan, o 04, o único que ainda não entrou na política. Quando surgiu na cena, em uma evidente forçação de barra, o pai orgulhoso o apresentou como “o pegador da Barra”. Embora parecesse ser o menos envolvido no governo, o 04 já começou a virar manchete em sites jornalísticos.
A mais recente foi a matéria da Folha de São Paulo publicada esta semana revelando que uma produtora de conteúdo digital e comunicação corporativa que presta serviços ao governo federal foi a responsável pela cobertura da festa de inauguração da empresa de Jair Renan. Detalhe: sem qualquer custo para o anfitrião. Ou seja, uso do dinheiro público para favorecimento da família. Caso evidente de improbidade administrativa pelo desrespeito ao princípio constitucional da impessoalidade nos negócios públicos.
De todos os filhos o que mais tem preocupado o presidente e feito o pai abusar das prerrogativas e poderes é o primogênito, o senador Flávio Bolsonaro. Flagrado no esquema da rachadinha na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, coordenada pelo faz-tudo Fabrício Queiroz, fez o pai Jair Bolsonaro, antes mesmo de assumir o governo, fazer o diabo para para protegê-lo.
Primeiro o presidente tentou trocar o comando da PF do Rio. Não conseguiu. Depois, pressionou o ex-ministro Sérgio Moro a trocar o diretor-geral da PF, Maurício Valeixo, para nomear o atual diretor-geral da ABIN, Alexandre Ramagem no lugar. A pressão provocou a saída de Moro do governo, que denunciou o presidente de tentar interferir politicamente na PF, o que resultou no inquérito ao qual Bolsonaro responde no Supremo Tribunal Federal.
A notícia de que a ABIN ajudou a defesa de Flávio Bolsonaro no caso Queiroz, não apenas confirma as acusações feitas por Moro, como mostra que Bolsonaro extrapolou todos os limites institucionais para tentar salvar o filho das acusações de peculato, organização criminosa e lavagem de dinheiro no caso das rachadinhas.
Mesmo com todas as incertezas do momento político e sanitário do país, é preciso que as instituições democráticas tomem uma atitude rápida e enérgica em relação a esse descalabro. O simples fato de ter se cogitado o uso de um instrumento de estado para favorecer o filho do presidente, por si só já é um escândalo. Saber que esse órgão realmente se envolveu no caso elaborando relatórios para defender as ilicitudes cometidas por esse filho presidencial, é inadmissível.
Bolsonaro parece desconhecer a liturgia do cargo e não saber diferenciar o público do privado, sempre envolvendo a família em suas ações e decisões. Perto dos abusos cometidos por Bolsonaro, as pedaladas de Dilma Roussef e o Fiat Elba do Collor, que os tiraram do poder, parecem brincadeira de criança. Se isso não for motivo para impeachment, não sei mais o que poderia ser. Simples assim.
Por Edna Lima
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