“Ah, pelo amor de Deus, pergunta para o meu chefe de gabinete. Eu tenho 15 funcionários comigo”, desabafou Jair Bolsonaro, já eleito presidente, quando os repórteres lhe perguntaram sobre o que fazia em seu gabinete de deputado a funcionária Nathalia Melo de Queiroz.
De camiseta, encostado num carro na entrada do seu condomínio na Barra da Tijuca, o capitão parecia visivelmente acuado diante das câmeras e microfones, cercado por um batalhão de jornalistas e seguranças.
Fiquei pensando: se ele não sabe o que fazem os 15 funcionários do seu gabinete em Brasília, como vai comandar os 22 ministros encarregados de governar 208 milhões de habitantes e 12 milhões de desempregados, com o país mergulhado na mais profunda crise da sua história?
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Nathalia é um bom exemplo dos critérios do capitão para montar suas equipes.
Filha de Fabrício de Queiroz, o PM que trabalhava no gabinete de Flávio Bolsonaro, e está desaparecido desde que encontraram R$ 1,2 milhão em sua conta bancária, ela é personal trainer de celebridades e tinha um emprego no Rio enquanto estava recebendo salário de secretária parlamentar no gabinete de Jair Bolsonaro em Brasília.
Antes dela, outra funcionária fantasma era a agora célebre “Wal do Açaí”, a secretária parlamentar que cuidava da casa de veraneio dos Bolsonaro, na região da Costa Verde, no Rio.
Walderice Santos da Conceição estava empregada no gabinete do deputado federal Jair Bolsonaro desde 2003 e só pediu demissão ou foi demitida quando a Folha revelou a sua história de funcionária fantasma, já durante a campanha presidencial.
Por conta disso, Bolsonaro jurou o jornal de morte, antes que o Coaf revelasse as “atípicas” movimentações financeiras de Fabrício Queiroz, que acumulava as funções de assessor parlamentar, segurança, motorista e caixa eletrônico particular da agora família presidencial.
Queiroz levou a família inteira para trabalhar no gabinete de Flávio Bolsonaro e pediu demissão, no mesmo dia 15 de outubro em que Nathalia deu baixa na carteira em Brasília, entre o primeiro e o segundo turnos da eleição, quando a vitória do capitão já parecia assegurada.
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A denúncia sobre a conta de Queiroz só vazou já em pleno governo de transição, quando Bolsonaro estava nomeando seus ministros.
Numa das tumultuadas entrevistas sobre o caso Coaf, Jair Bolsonaro contou que foi colega no Exército e é amigo de Fabrício Queiroz há 34 anos, seu companheiro de pesca, churrasco e futebol.
Agora, limita-se a dizer que cabe ao amigo e ex-assessor, que depositou um cheque de R$ 24 mil na conta da futura primeira-dama Michelle, dar explicações à Justiça.
Fábio Bolsonaro repete todo dia que não fez nada de errado e também lavou as mãos.
Enquanto o motorista Queiroz não reaparece, uma sombra de dúvidas cobre o modus-operandi dos Bolsonaro com seus subordinados, todos pagos com dinheiro público, para prestar serviços particulares ou serviço nenhum.
Daqui a duas semanas, a nova ordem toma posse, e este caso tem tudo para desaparecer no limbo do juizado de pequenas causas, apenas um acidente de percurso do governo de transição.
Bom final de semana.
Vida que segue.
Por Ricardo Kotscho, para o Balaio e o os Jornalistas pela Democracia
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