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Polícia Federal deixa o Gabinete de Segurança Institucional, composta por militares, em segundo plano. Lula declarou estar convencido de que as portas do Planalto foram deliberadamente abertas durante a invasão. “Teve muita gente conivente, da Polícia Militar e das Forças Armadas.”

A Guarda Presidencial é responsável pela segurança do Palácio do Planalto, mas o presidente Lula afastou militares de seu gabinete -  (crédito:  Ingrid Soares/CB/DA Press)

A Guarda Presidencial é responsável pela segurança do Palácio do Planalto, mas o presidente Lula afastou militares de seu gabinete – (crédito: Ingrid Soares/CB/DA Press)

Antes mesmo de tomar posse, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) já planejava, a curto prazo, ter sua segurança pessoal a cargo da Polícia Federal (PF), tarefa que desempenhará temporariamente, pelos próximos seis meses. Na cúpula do governo, não há, por ora, discussão para reduzir esse prazo e devolver a atribuição ao Gabinete de Segurança Institucional (GSI), historicamente responsável pela função, que se estende à primeira-dama, Janja Lula da Silva, aos filhos do presidente, ao vice, Geraldo Alckmin (PSB), e à esposa Lu e aos filhos.

A mudança gerou mal-estar no Ministério da Defesa e no GSI e afetou o dia a dia de policiais federais e militares. Os agentes da segurança presidencial, após processo seletivo e treinamento de cerca de um ano e meio, ganham status que é objeto de desejo de quem constrói carreira nas Forças Armadas. Ao Correio, alguns confirmaram que há efetivo recrutado para iniciar a missão neste mandato de Lula, que estão se juntando a outros que já têm experiência no trabalho, por terem feito parte das equipes de guarda-costas dos ex-presidentes Dilma Rousseff (PT) e Jair Bolsonaro (PL). Em 2015, a petista decidiu extinguir o GSI, que foi recriado pelo sucessor, Michel Temer (MDB-SP).

A desconfiança iniciada antes mesmo de Lula assumir, pela terceira vez, a Presidência da República, foi inflamada pelos atos criminosos do último dia 8, quando extremistas invadiram o Palácio do Planalto e os prédios do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal (STF) e promoveram uma devastação nunca antes vista no país.

A guarda do Planalto é competência do GSI, conhecida por seus pares como “pessoal velado”, em razão do uso de terno e gravata, com apoio do policiamento ostensivo — efetivo fardado — do Batalhão da Guarda Presidencial (BGP) e do 1º Regimento de Cavalaria de Guardas (1º RCG), unidades do Exército Brasileiro que se revezam para essa atividade e que têm como missão principal proteger as instalações da Presidência da República. O Batalhão de Polícia do Exército em Brasília também colabora no patrulhamento. Os núcleos citados acima não estão sob o guarda-chuva do GSI, mas podem atuar ostensivamente na segurança fazendo, por exemplo, cordão de isolamento do Planalto.

Em conversa com jornalistas, na última quinta-feira, o presidente Lula informou que mantém como ajudantes de ordens, posto tradicionalmente ocupado por militares, servidores de sua confiança. “Eu pego o jornal, e o motorista do (ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional general) Heleno dizendo que vai me matar e que eu não vou subir a rampa. Um outro tenente disse que vai me dar um tiro na cabeça e que eu não vou subir a rampa. Como é que eu vou ter uma pessoa na porta da minha sala que pode me dar um tiro?”

O presidente complementou a fala explicando que seus ajudantes de ordem são militares que estão ao seu lado desde 2010. “Até que a gente adquira uma relação civilizada, é só isso que eu quero”, sinalizou sobre a permanência da atual estrutura.

Lula declarou estar convencido de que as portas do Planalto foram deliberadamente abertas durante a invasão. “Teve muita gente conivente, da Polícia Militar e das Forças Armadas.” Em um vídeo que circulou na semana passada em redes sociais é possível ouvir um integrante da PM do DF, na frente do palácio, pedir que praças do Exército fizessem uma “linha de frente” e clamaram por reforços, diante da iminente invasão por um grande grupo de golpistas. Também pede para que os invasores fossem presos em flagrante.

“Estou convencido de que a porta do Palácio do Planalto foi aberta para que gente entrasse porque não tem porta quebrada. Significa que alguém facilitou a entrada deles aqui. Nós vamos, com muita calma, investigar e ver o que aconteceu de verdade”, disse o presidente.

Confiança

Professor de direito constitucional da Universidade Mackenzie, Flavio Bastos explica que o presidente da República tem, por lei, a prerrogativa de receber o apoio necessário para sua segurança pessoal, bem como do ambiente que utiliza para governar, a partir das estruturas normativas e administrativas previstas pelas legislação. “Assim, os recursos pessoais e materiais são providenciados pelo GSI, por intermédio da Secretaria de Segurança Presidencial (SPR).”

O docente reforça que a segurança do presidente e do vice é de interesse de toda a população brasileira, diante da necessidade de manutenção da governabilidade, da estabilidade e do comando do país. “Assim, a importância das instituições de Estado que compõem os órgãos de segurança do chefe do Poder Executivo (PF, PRF, PMs, Bombeiros etc), de onde são originários os melhores profissionais indicados e treinados para tal função, é altíssima.”

Para Bastos, confiança é a palavra-chave. “Se existe um problema de ausência de confiança sobre o GSI e alguns agentes, é importante que, provisoriamente, sejam apresentadas alternativas para a segurança pessoal do presidente da República, especialmente após a demonstração de que alguns componentes das forças de segurança tenham colaborado, omissivamente ou comissivamente, com a tentativa de golpe de Estado ocorrida no último dia 8 de janeiro. Note-se que servidores que atuavam no próprio Palácio do Planalto parecem ter facilitado a invasão da sede do Poder Executivo.”

Suspeitas

O ministro da Justiça e Segurança Pública, Flávio Dino (PSB-MA), corroborou a tese de que houve conivência de militares nos atos extremistas da Praça dos Três Poderes. “Estamos diante de uma rede que não sabemos ainda a extensão”, disse ele, ressalvando que ainda não é possível saber se a inação de agentes públicos foi voluntária ou por omissão.

“É uma das linhas de investigação, claro, que a Polícia Federal vai levar adiante, salvo no que se refere a crimes militares. Como testemunha ocular, o que posso dizer é que houve adesão”, afirmou. “A dúvida é se foi orientada previamente ou apenas um gesto de simpatia em relação ao golpe de Estado ou antipatia ao governo legitimamente eleito.”

Flávio Dino sinalizou que gostaria que o inquérito ficasse com a PF, mas citou que esta atribuição só poderia ser retirada da competência da Justiça Militar por decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF, relator dos inquéritos que investigam os crimes cometidos na ocasião.

Durante os últimos dias, o ministro da Justiça deu declarações que remetem, também, à inação do então comandante-geral da corporação coronel Fábio Augusto, retirado do cargo e preso, e de Anderson Torres, ex-ministro de Jair Bolsonaro e ex-secretário de Segurança Pública do DF, preso no sábado, ao desembarcar em Brasília vindo de Miami, nos Estados Unidos.

Na casa de Torres a PF encontrou a minuta de um decreto que previa o estabelecimento de estado de defesa na Justiça Eleitoral, com a finalidade de suspender os resultados da eleição presidencial e manter Bolsonaro no Poder. Em depoimento voluntário à PF, na sexta-feira, o governador afastado do DF por decisão de Moraes, Ibaneis Rocha (MDB-DF), declarou ter sido uma “surpresa” o pouco efetivo de PMs na Esplanada dos Ministérios no dia dos ataques.

Procurada para se pronunciar sobre as falas de Flávio Dino desta sexta, a assessoria de imprensa do Ministério da Defesa informou que, “em princípio”, não havia previsão para que a pasta se manifestasse. A reportagem telefonou para o ministro José Múcio Monteiro, titular da Defesa, mas as ligações não foram atendidas. Na quinta-feira, estava previsto um encontro entre Lula e o ministro do GSI, General Gonçalves Dias.

Correio procurou as assessorias de ambos para informações acerca do compromisso, mas, até o fechamento desta edição, também não obteve retorno. Na quinta-feira, o GSI, por meio de nota, informou que “não houve a dispensa do reforço da guarda antes da ação dos manifestantes no Palácio do Planalto” e que “a guarnição de serviço já estava reforçada com a tropa de choque do Batalhão da Guarda Presidencial, compatível com as informações disponíveis naquele momento”.

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