A crescente onda de fraudes bancárias no Brasil ganha uma nova roupagem, agora impulsionada por facções criminosas como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho. Segundo a Polícia Federal, esses grupos investem em “escritórios do crime” para aplicar golpes por meio de falsas centrais telefônicas, operando principalmente por aplicativos de mensagens e na internet.
A prática, de baixo risco para os criminosos, tem chamado a atenção das Polícias Civis de São Paulo e Rio de Janeiro, do Ministério Público paulista e da Polícia Federal. Especialistas em segurança pública, entrevistados pela Folha de S.Paulo, nomeiam essa tendência como “home office criminal”, uma herança da pandemia da Covid-19.
O aumento expressivo de fraudes bancárias após a crise sanitária é evidenciado pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública. De 2019 a 2022, os casos de estelionato mais do que triplicaram, passando de 523.820 para 1.819.409 ocorrências.
Segundo Camila Nunes Dias, professora da UFABC e pesquisadora da USP, a ascensão do estelionato por internet ou telefone atrai diretamente ou indiretamente a atuação de grupos faccionais. Ela ressalta que esses crimes exigem conhecimentos técnicos acessíveis e representam menos riscos do que crimes patrimoniais, como furtos e roubos.
As facções, conhecidas por atividades ilícitas como roubo de bancos e lavagem de dinheiro, agora se inserem no mundo do estelionato em larga escala para manter o fluxo de caixa durante períodos de repressão ao tráfico de drogas.
Para ludibriar as vítimas, os criminosos se passam por atendentes de serviços populares ou oferecem soluções simples para problemas cotidianos. Recentemente, golpistas se fazendo passar pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) abordaram clientes insatisfeitos da Oi, roubando dados sensíveis usados para desfalcar as contas das vítimas por meio de aplicativos bancários.
Essas operações demandam escala para arrecadar valores significativos, levando as facções a estabelecerem escritórios dedicados. Recentemente, a Polícia Civil desmantelou uma dessas sedes na região central de São Paulo, resultando na prisão de 24 pessoas.
Esses “escritórios do crime” funcionam como empresas, com funcionários coordenados, dezenas de computadores, celulares e máquinas de cartão, além de documentos. A prática, enquadrada como estelionato pelo Código Penal, agora também incorre na pena por crime organizado, de três a oito anos.
Os golpistas iniciam a fraude por mensagens em texto, via SMS, WhatsApp ou email, instruindo a vítima a buscar atendimento pelo telefone indicado. Para conferir credibilidade ao esquema, utilizam números curtos, típicos de empresas. Facções também conseguem linhas de telefone identificadas com atividades comerciais, como as iniciadas em “0800”, “0300” e “4004”.
Quadrilhas especializadas, como uma no Rio de Janeiro, chegam a utilizar atendentes automatizadas para simular serviços bancários, obtendo dados da vítima durante a ligação.
A resposta ao aumento dessas práticas envolveu a Anatel, que em novembro emitiu recomendações para coibir o uso irregular dos serviços de 0800. No entanto, especialistas em cibersegurança consideram a medida insuficiente, pois não abrange outros números comerciais e telefones curtos.
Segundo a Febraban, cerca de 70% das tentativas de golpes originam-se na engenharia social, destacando que os crimes não estão relacionados a brechas nos sistemas tecnológicos dos bancos. A entidade mantém cooperação com a Polícia Federal, resultando na plataforma Tentáculos, registrando ocorrências de fraudes bancárias.
A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) orienta os clientes a verificar a origem de ligações e mensagens, enfatizando que os bancos não solicitam senhas ou números de cartão por telefone. Em caso de suspeita, recomenda desligar e contatar o banco pelos canais oficiais.
Caso a pessoa seja vítima, deve entrar em contato com a empresa ou instituição bancária pelos canais oficiais, alterar senhas e verificar movimentações estranhas nas contas. A Polícia Federal esclarece que o ressarcimento ao cliente depende da comprovação de falha da instituição financeira.
O desafio atual é combater a sofisticação dessas facções, que exploram a vulnerabilidade das pessoas em momentos de crise e isolamento social, exigindo uma abordagem integrada entre entidades governamentais, setor privado e população para conter esse “home office criminal”.
Com informações do Diário do Centro Mundo
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