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Já de pronto, nossa resposta é óbvia e simples: uma Suprema Corte tem a função de preservar a Constituição e a democracia. Argumentos políticos e de conveniência devem ser deixados em segundo plano, devendo, como fazem todas as democracias contemporâneas, prestigiar o Império do Direito, para usar o título de um dos livros mais importantes produzidos no século XX, por Ronald Dworkin.

Mas se isso para a comunidade jurídica tem uma resposta evidente, parece não ser para setores do jornalismo e da grande mídia, que parecem insistir e apostar na tese de que, ao fim e ao cabo, o que vale é a política. Foi assim durante todos os três anos em que lutamos, junto à Suprema Corte, pela presunção da inocência. Tínhamos que enfrentar não apenas as teses jurídicas contrárias às nossas, mas fundamentalmente as narrativas falsas que eram vendidas à sociedade (por exemplo, que a decisão do STF soltaria mais de 160 mil bandidos, estupradores etc.).

A questão, portanto, é saber discernir: é verdadeiro ou não que o juiz Moro atuou em foro que não era seu, resultando daí as condenações do ex-Presidente Lula? Se sim, a decisão do Ministro Fachin está correta.

É verdadeiro ou não que o juiz Moro atuou de forma parcial, cometendo os atos que a segunda turma, por maioria, imputou-lhe? São questões empíricas, que nada tem a ver com o conteúdo dos diálogos haqueados. Moro mandou fazer a condução coercitiva? Moro fez vazar ilicitamente os diálogos entre Lula e Dilma? Moro mandou grampear os telefones dos advogados de Lula? Nem precisamos ir mais adiante. Esses dados são verdadeiros? Se sim, resta apenas discutir se eles constituem a parcialidade-suspeição do juiz Moro.

Bom a segunda turma, por maioria de votos, disse que esses atos praticados pelo juiz Moro constituem quebra da imparcialidade.

Resta saber se o plenário do STF pode funcionar como instância recursal da turma. Achamos que a resposta é negativa.

Assim, temos que, empiricamente, está claro que os fatos correram. Não parece haver desacordos com relação a isso.

E, em termos jus-teóricos, também parece que não há desacordos no sentido de que se está diante de clara incompetência e escancarada suspeição.

As consequências políticas? Não cabe ao Império do Direito discutir os invasores políticos e morais que pretendem fragilizar suas fronteiras. O Judiciário – no caso, o Supremo Tribunal Federal – tem o papel de conservar as muralhas do castelo que protege o Império do Direito.

O Direito é a forma pela qual o poder deve ser controlado. O Direito deve exigir pedágio dos argumentos políticos e morais e não o contrário. O Império do Direito não é mero instrumento da política.

Eis a encruzilhada em que estamos. Na suspeição de Moro, a disputa é jurídica e não política. O Direto deve vencer.

A história registrará a parte que cabe a cada um nesse butim jus político. Não há registro no mundo contemporâneo – nem no Tribunal Europeu dos Direitos Humanos que cuida desses casos na Europa – da conjunção de duas nulidades insanáveis: a suspeição e a incompetência reunidas em um mesmo juiz.

O que é isto – o Direito? O que é isto – o processo? O que é isto – a Constituição? Eis as perguntas.

Por qual razão existiria algo que seja maior do que as garantias processuais-constitucionais de um acusado? Seja ele quem for.

Afinal, processo não tem capa. Não tem rosto!

Por Lenio Luiz Streck, Marco Aurélio de Carvalho e Fabiano Silva dos Santos

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