O colunista da Folha de SP, Reinaldo Azevedo, compôs um dos textos mais sensíveis, belos e verdadeiros sobre a desigualdade brasileira que já li. Ele, criador do termo petralha, recuou e hoje defende Lula. Simbolismo total.
Diz reinaldo:
“Minha mãe era empregada doméstica na década de 1970. Faxineira. Numa das casas, a patroa queria que as pedras do quintal, porosas, ficassem brancas. Era preciso esfregar muito. Com sabão em pó e água sanitária, que chamávamos “água de lavadeira”. Os pobres são convidados a encontrar o seu lugar já no vocabulário. “A linguagem é um vírus”. A educação pelas pedras.
(…)
Ela, então, molhou as pedras com a mangueira e as salpicou de Omo, aos poucos, em pequenas veredas. Pobre economiza sabão em pó alheio porque o desperdício ofende algo mais do que o bolso do patrão: agride o senso de sobrevivência. Peguei, moleque meio enfezado, a vassoura de piaçava para esfregar com força. Tem de ficar branca. Como leite. Sem pecado nem perdão.
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Há preconceito contra negros no Brasil. Há preconceito contra mulheres no Brasil. Há preconceito contra gays no Brasil. Há preconceitos no Brasil. O maior de todos, o mal talvez incurável, a canalhice insofismável, o ódio primordial, o medo primitivo é um só: de verdade, “eles” — permitam-me as aspas, que eu mesmo costumo combater — odeiam os pobres.
(…)
Aparecida, Dona Cida, nunca foi à Disney. Nem sei se o câmbio era favorável à época. Desculpo-me pelo incômodo de contar uma história assim, de chimpanzés contaminados pelo marxismo cultural, vertido, nesse caso, em borrachada didática.
Uma lição de moral. Em sua resistência fria. Em sua carnadura concreta.”
Parabéns, Reinaldo, foste redimido.
Assinado,
Eduardo Guimarães