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17 de abril de 2024: Palestinos em meio a uma área destruída em Khan Younis, cidade no sul de Gaza. Foto: OCHA

Registrando a Hipocrisia

O Conselho da Europa criou, em maio de 2023 um “Registro de Danos” para catalogar provas dos danos e perdas sofridos pelos ucranianos e pelo Estado ucraniano, como resultado da guerra com a Rússia.

Esse órgão, que julga ter a função fiscalizar o respeito aos “direitos humanos e valores democráticos no continente”, tem sede em Estrasburgo (França). O órgão considera que a Rússia deve ser responsabilizada pelo “crime de agressão.”

“Certamente que as vítimas e os civis estão entre os mais vulneráveis e devem, provavelmente, ser os primeiros a ver os seus pedidos processados. Mas, claro, cabe ao registo e às suas partes decidir sobre isso”, disse a secretária-geral Marija Pejčinović Burić, na época, em entrevista à Euronews.

A resolução que criou este registro foi apoiada por 40 dos 46 Estados-membros do Conselho da Europa, aos quais se juntaram também o Canadá, o Japão e os Estados Unidos.

Segundo o Conselho da Europa, o Registro de Danos é apenas “um primeiro passo” para garantir que os “crimes cometidos pela Rússia na Ucrânia não fiquem impunes.”

O próximo passo será a criação de um mecanismo internacional de indenização, que poderá incluir uma comissão especial para decidir sobre a atribuição dos pagamentos e um fundo de indemnização para cobrir os custos.

Ainda não há uma ideia clara de como poderá ser financiado, mas há diferentes sugestões.

O governo ucraniano propôs a utilização dos ativos russos congelados para cobrir “os danos sofridos pelos civis ucranianos e para reconstruir o país quando a guerra terminar.”

O Registro já conta com mais de 10.000 “reclamações” apresentadas por danos ou destruição de habitações.

Mas o Conselho da Europa não quer parar por aí.

Em outubro, o novo secretário-geral do Conselho da Europa, Alain Berset, declarou, após a 5.ª reunião da Conferência de Participantes do Registro de Danos da Ucrânia que:

Muitas outras reivindicações se seguirão nesta categoria e em outras que foram aprovadas hoje pela Conferência dos Participantes. Congratulo-me com o fato de o Registro ter atraído muitos membros, inclusive de fora da Europa. Em qualquer caso, o Conselho da Europa pretende mais. Levantei esta questão com líderes de uma vasta gama de países durante as minhas reuniões na recente Semana de Alto Nível da Assembleia Geral da ONU em Nova Iorque e na Cúpula da Francofonia em Villers-Cotterêts.

Ou seja, o Conselho está pressionando toda a comunidade internacional para aderir ao Registro.

Que coisa curiosa.

Onde estava o Conselho da Europa, quando a população do Donbas estava sendo massacrada pelo regime Kiev? Até 2022, já tinham morrido mais de 14 mil russos étnicos naquela região.

Eles não eram considerados europeus? Não tinham direitos? Não eram gente?

Por que o Conselho da Europa, que tem 75 anos, não se empenhou também numa campanha internacional para criar registros de danos para o Iraque, a Líbia, a Síria, o Afeganistão etc. países que foram massacrados por intervenções e sanções que mataram milhões de pessoas?

Por que não há o mesmo empenho internacional em criar um Registro de Danos para os palestinos? Por acaso as habitações em Gaza estão em bom estado?

Registre-se que a Comissão de Conciliação das Nações Unidas para a Palestina (CCPNU), que mediou o conflito israelo-árabe, forneceu documentação exaustiva sobre as perdas sofridas pelos refugiados palestinianos.

Resultado? Nenhum centavo. Os palestinos que se lixem. Diga-se de passagem, Israel é membro observador do Conselho da Europa.

Por que a Europa não cria um Registro de Danos para suas ex-colônias, que foram tão espoliadas?

Fica aqui a óbvia e justa sugestão para o Conselho da Europa.

Somente a Bélgica matou cerca de 15 milhões de africanos. Se esqueceram? O Sul Global recorda com amargor esses e outros gravíssimos danos.

Segundo François de la Rochefoucauld, um europeu, “a hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude”.

Que tal criar um registro histórico da hipocrisia ocidental e europeia?

Deixo aqui essa outra sugestão óbvia para o Conselho da Europa.

*Marcelo Zero é sociólogo e especialista em Relações Internacionais.

*Este texto não representa obrigatoriamente a opinião do Viomundo.

Com informações do PT Org

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