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Em evento, presidente da emissora disse que imprensa é pessimista, desmatamento na Amazônia é exagerado e país enfrentou bem a pandemia. Band recebeu 15 milhões do governo nos últimos 3 anos.João Filho11 de Dezembro de 2021, 7h00FAÇA PARTE

Em evento, Johnny Saad, presidente da Bandeirantes disse que imprensa é pessimista, desmatamento na Amazônia é fake e país enfrentou bem a pandemia.

Ilustração: The Intercept Brasil

SÃO MUITOS os grupos de mídia cúmplices da destruição que Bolsonaro vem impondo a todos os setores do país. Mas o grupo Bandeirantes terá um lugar especial quando o horror da passagem da extrema direita pelo poder for contado no Brasil.

Logo no início do governo, quando o presidente baixou um decreto que facilitou enormemente a posse de armas, a Band se colocou fortemente ao lado do presidente. O grupo lançou um editorial em defesa do decreto, lido nos telejornais do grupo. O texto não tinha embasamento científico e se resumiu a um amontoado de clichês bolsonaristas sobre o assunto, apelando até para a ideia estúpida de que “as armas já estão na vida do país, mas nas mãos dos bandidos” — como se o libera-geral não fosse facilitar ainda mais o armamento da bandidagem.

O editorial terminava com frases que parecem ter sido escritas por jornalistas lunáticos da extrema direita como Allan dos Santos: “O cidadão honesto exigiu o direito de ter a sua arma. O decreto de agora é a resposta a esta escolha democrática. Vamos respeitar a vontade popular? Esta é a opinião do Grupo Bandeirantes”. Além do baixo nível argumentativo, o grupo contou uma mentira em pleno editorial. A tal “vontade popular” não resiste a uma googlada: 72% dos brasileiros são contra a flexibilização da compra e do uso de armas.

Mais recentemente, quando começou a discussão sobre o marco temporal em territórios indígenas, o grupo Bandeirantes silenciou as vozes representantes dos indígenas e defendeu abertamente a tese de ruralistas, grileiros e garimpeiros. Jornalistas dos canais do grupo chegaram ao cúmulo de dizer que os indígenas poderiam “tomar até o Morumbi”. Mas aqui o ataque aos interesses indígenas não partiu pelo alinhamento automático ao bolsonarismo, mas também pela defesa dos interesses particulares dos donos da Band. O herdeiro do grupo, João Carlos Saad, mais conhecido como Johnny Saad, é um grande fazendeiro e criador de gado. O grupo conta com dois canais na TV fechada dedicados exclusivamente ao agronegócio e bancados pelo setor através de anúncios.

O “Aqui na Band” era um programa de notícias e variedades apresentado por Ernesto Lacombe, um conhecido defensor do presidente da República no jornalismo. O programa já chegou a ter o seguinte mote: “Quem mandou matar Jair Bolsonaro”, surfando a onda do bolsonarismo, que faz questão de ignorar que a Polícia Federal concluiu que o crime não tinha mandantes. Allan dos Santos, o parajornalista de aluguel do bolsonarismo que hoje é procurado pela Interpol, já foi convidado para o programa para falar sobre “conservadorismo”. A emissora acho razoável convidar um investigado pela Polícia Federal por disseminação de fake news para falar para a sua audiência.RelacionadoIndígenas ‘vão tomar até o Morumbi’: o terrorismo da Band pelo marco temporal

Nesta semana, durante Prêmio Inspira Rio, no Copacabana Palace, no Rio de Janeiro, o dono do grupo Bandeirantes voltou a defender as teses estapafúrdias do bolsonarismo, visando mais uma vez a defesa dos seus próprios interesses.  No palco do evento, o grande fazendeiro e criador de gado disse: “Olha, eu quero deixar claro que acredito no país, sou otimista, mas acho que a mídia impressa anda muito rabugenta nessa questão do meio ambiente”. Já a sua empresa de jornalismo, claro, não tem nada a ver com essa rabugice contra o governo: “Quando nossa equipe vai lá checar as denúncias, não bate. Simplesmente não bate. Sessenta e seis por cento do nosso território continua intacto, igualzinho quando Cabral chegou aqui”, disse o rei do gado da Band.

Mas não ficou só nisso. O herdeiro completou a cartela do bingo governista ao defender também os valores da família tradicional brasileira: “Televisão aberta é mais conservadora, se o sujeito quer mais tempero, mais pimenta, vai no cabo, na televisão paga. Ou vai procurar em horários bem mais tardios. A TV aberta é para a família brasileira.”

Presidente da República Jair Bolsonaro conversa com o Presidente da TV Band, João Carlos Saad.

Johnny Saad e a Band defendem pautas de Bolsonaro como porte de armas e fim do marco temporal.

Foto: Carolina Antunes/PR

Johnny aproveitou para garantir que o programa do Faustão, principal atração da emissora no ano que vem, será adequado à família tradicional brasileira. “Está bonito. Pode assistir com criança na sala que ninguém vai ficar constrangido”, disse. É incrível”, disse o dono da emissora que exibe diariamente há mais de 20 anos o jornal pinga-sangue “Brasil Urgente” à luz do dia. Cenas de perseguição policial e violência explícita foram exibidas na TV aberta durante a tarde. O reacionarismo foi semeado na programação da Band durante décadas. Foi Datena que popularizou a expressão “bandido bom é bandido morto” que embalou o bolsonarismo. A emissora preocupada com a família brasileira também exibiu durante cinco anos o Programa Pânico, em que gays eram achincalhados, mulheres objetificadas e minorias tratadas com deboche.

Mas a adesão do grupo vai além das motivações ideológicas do seu dono. Há também as motivações financeiras. Apesar do presidente atacar a imprensa diariamente, ele tem algumas emissoras queridinhas no bolso: a Band está ao lado de Record, SBT e RedeTV. Segundo revelou o Intercept, a gestão Bolsonaro pagou pelo menos R$ 4,3 milhões para apresentadores de TV, radialistas e influencers fazerem merchandising de seu governo. Só o Datena, o principal apresentador da Band que recentemente entrou para a política, recebeu R$ 174,7 mil. Esses gastos da Secom foram direcionados em 2019 e 2020 direto para as quatro emissoras simpáticas ao governo.

Além do merchandising, a Band recebeu outros R$ 15 milhões nos últimos três anos do governo. A verba tem a ver com sua audiência e é inferior à de suas concorrentes Record, SBT e Globo, o que leva à conclusão que o apoio a pautas bolsonaristas é por convicção mesmo. 

Mas com uma graninha fica mais fácil ser otimista, né, Johnny? O fato da Band ser uma das raríssimas emissoras para as quais o presidente concede entrevistas exclusivas não é por acaso. E, como se sabe, o presidente só joga em casa, tendo a certeza que não será alvo de perguntas incômodas.

A Band vai se consolidando como a emissora mais alinhada às pautas bolsonaristas da TV aberta. O seu proprietário usa a programação para defender a flexibilização de armas, defender menos demarcações terras para indígenas e dar espaço para extremistas de direita contadores de fake news. O fato da emissora ser batizada em homenagem aos homens que escravizaram e assassinaram os povos indígenas no século 17 não deve ser coincidência. Os bandeirantes ainda vivem no bolsonarismo.

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