Situação atual tem relação com o último período chuvoso e El Niño. Fogo na vegetação aumenta poluição e ocorrência de doenças respiratórias
A seca severa na Amazônia tem causado impactos diretos na vida das pessoas que vivem na região. A baixa vazão dos rios leva a efeitos em cascata, como dificuldades no transporte, aumento de preços de mercadorias, elevação das queimadas e problemas respiratórios.
O rio Solimões, na chamada calha do Alto Solimões, em Atalaia do Norte, registrou cota de 5,30 metros (m) na última quarta-feira (7/8). Como referência, no mesmo dia em 2020, a medição indicava 7,67 m. Ainda na mesma calha, a situação é mais dramática em Tabatinga. A medição desta sexta-feira (9/8) apontou apenas 0,96 m, enquanto a cota máxima é de 13,82 m.
Como grande parte da região amazônica depende de rios para locomoção, o transporte está dificultado. Mesmo deslocamentos terrestres são prejudicados, pois há travessias que dependem de balsas. É o caso de quem reside em Apuí (AM), vizinho da rodovia Transamazônica, que cruza o rio Madeira, por meio de balsa. Com o nível baixo das águas, o caminho está prejudicado.
“Tem algum transporte de mercadoria que é feito pelo rio Madeira e pelo rio Aripuanã. Nesse período, (a seca) também dificulta bastante a chegada de balsa. Então, a gente tem essa dificuldade de abastecimento da cidade e, consequentemente, aumentam os preços das mercadorias”, afirma o secretário municipal de Meio Ambiente de Apuí, Domingos de Jesus do Bonfim.
Qualidade do ar
Proporcionalmente ao número de municípios, há poucas estações que medem a qualidade do ar na região Norte. No entanto, na noite desta sexta (9/8), seis delas indicavam qualidade do ar péssima, numa escala que tem os níveis “bom, moderado, ruim e muito ruim”. De maneira geral, os dados disponíveis no site do governo do Amazonas demonstravam indicadores ruins na maioria dos locais onde há medição.P
A qualidade ruim do ar tem relação direta com o número de queimadas. Somente na quinta-feira (8/8), o bioma amazônico contabilizou 1.209 registros do tipo. No período de 1º de janeiro a 8 de agosto, o aumento é de 96%. Em números absolutos, já são 32.251 focos de calor indentificados neste ano.
Os dados são do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A situação pode piorar, pois, historicamente, o mês com o maior número de incêndios é setembro. O secretário de Apuí afirma que, com mais queimadas e a piora na qualidade do ar, as unidades de saúde do município têm recebido mais pessoas com problemas respiratórios.
Previsão
Desde maio, especialistas e o governo federal já sabiam que os efeitos da seca poderiam ser graves. “Vamos ter um fenômeno terrível, que são os incêndios e as queimadas. Não é por acaso que nós temos trabalhado incessantemente”, disse a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.
A diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), Ane Alencar, explica que o bioma experimenta uma situação que tem relação com a seca de 2023.
“A seca do ano passado foi impulsionada por um conjunto de fenômenos climáticos que se retroalimentaram de certa forma. O El Niño, que é um fenômeno climático que naturalmente faz com que o período seco seja mais severo do que o normal, em 2023 foi severo, e ele também foi impactado pelas altas temperaturas do planeta”, explica Ane.
O atual momento eleva o grau de preocupação de Ane em relação às queimadas. “Acende uma alerta porque a gente está em ano de eleição e, geralmente, esses anos têm um impacto sobre a dinâmica do desmatamento, principalmente na região mais rural da Amazônia, em que muita energia é gasta com a política e acaba que esta questão da fiscalização alcama um pouco”, avalia.
No momento, a principal resposta do governo do Amazonas para a crise foram dois decretos. Um deles é de situação de emergência e abrange 20 dos 62 municípios. O outro é de emergência ambiental. Ambos visam a chamar a atenção para o momento crítico e simplificar a burocracia para dar respostas às necessidades locais.
Diante do contexto, o secretário de Apuí se preocupa com o que pode acontecer nas próximas semanas. “Este ano está sendo atípico pela seca severa. Parou de chover em abril, ou seja, parou de chover mais cedo. Então, a gente está temeroso, porque nos anos anteriores, na última semana de agosto costumava chover, e na primeira semana de setembro também. A gente está temeroso de que isto possa ter mudado”, afirmou Bonfim ao Metrópoles.
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