Entre os mais de 100 processos de abusos policiais e/ou violência contra detidos, em 6 anos, a maior punição foi 12 dias de suspensão
A Secretaria de Administração Penitenciária (Seape) abriu 108 processos para investigar abusos policiais e/ou violência contra detidos no Distrito Federal desde 2018. Porém, somente 5,5% desses processos resultaram em punição ao policial acusado. E, entre todas as punições, a sanção máxima, nestes cinco anos, foi uma suspensão do agente penitenciário por 12 dias.
O levantamento do Metrópoles com dados obtidos via Lei de Acesso à Informação (LAI) de 2018 a 2023 mostra um cenário de impunidade. Em 2018 e 2020, por exemplo, todos os processos foram arquivados, segundo a Seape, “em razão da ausência de justa causa”. Houve um processo instaurado em 2019 com resultado de punição de 12 dias de suspensão, outro, de 2021 com 6 dias de suspensão.
O mais comum são as penalidades de Termos de Ajustamento de Conduta, como em três casos, um de 2019 e dois de 2022. Desde 2018, o processo que pode ter a punição mais severa ainda está na Controladoria-Geral do DF (CGDF). Nesse caso, que não foi detalhado pela Seape, há um relatório da pasta com sugestão de demissão.
Os 108 processos nos últimos seis anos são referentes a casos em que houve “elementos mínimos de materialidade e autoria”. Várias outras denúncias sequer chegam a gerar um procedimento legal. Por dia, mais de cinco denúncias de violência prisional são feitas à Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa do DF (CLDF), como noticiado em fevereiro.
Neste ano, de janeiro a 20 de fevereiro, período de apenas 50 dias, 260 abusos do tipo foram registrados pelo colegiado. Destes, só dois, ou seja, 0,7%, se transformaram em processos formais. Ambos estão em fase de diligências. O mesmo ocorre com 17 casos de 2023, ainda sem solução.
Em nota, a Seape disse que “apura as denúncias sobre o sistema penitenciário e seus servidores de forma legalista e imparcial”. “Em qualquer denúncia que apresente elementos probatórios mínimos, é instaurado procedimento administrativo respeitado o rito que garante a ampla defesa e o contraditório em acordo com as competências disciplinares da Secretaria. Restando provas em desfavor dos agentes, a Seape-DF aplica as punições cabíveis dentro da legalidade e da razoabilidade que o fato exige.”
Caso marcante
Uma agressão filmada de três policiais penais contra dois presos na Papuda, que chocou o Distrito Federal em 2021 pela brutalidade, teve decisão recente da Secretaria de Administração Penitenciária. Alegando “insuficiência de servidores no sistema prisional”, uma portaria da pasta converteu a pena de afastamento deles em multa, permitindo que eles continuem trabalhando.
O caso foi divulgado pelo Metrópoles com exclusividade em 2021. Três policiais penais lotados no Complexo Penitenciário da Papuda foram filmados espancando um preso encarcerado no Presídio do DF I (PDF I). Outro também foi agredido, mas fora das câmeras. Os servidores ainda usaram uma escopeta municiada com balas de borracha e atiraram em detentos que estavam dentro de uma cela.
O processo administrativo aberto à época permanece em curso e em prazo de recursos. Mas, na última segunda-feira (4/3), foi publicado no Diário Oficial do DF que dois policiais envolvidos, Adão Manoel do Nascimento e Sílvio Nogueira da Silva Filho, sofreram “sanção disciplinar de seis e quatro dias de suspensão, convertida a pena “em multa de 50%, sob o argumento de insuficiência de servidores no sistema prisional”.
Outro policial penal envolvido, Paulo Roberto Bravo Junior pediu exoneração em 26 de janeiro deste ano. O Ministério Público do DF e Territórios (MPDFT) denunciou os três por agressão de detentos, em setembro de 2021. De acordo com denúncia encaminhada à Justiça, os servidores cometeram crimes de lesão corporal e violência arbitrária.
Blindagem institucional
Presidente da Comissão de Direitos Humanos da CLDF, o deputado distrital Fábio Felix (PSol) levanta a discussão sobre a chamada “lógica de blindagem institucional”.
“Sempre que a gente faz uma denúncia, eles falam que ela é vaga e não há elementos suficientes para abrir um processo. São até milhares de denúncias relacionadas à violência no sistema prisional. Então, me parece que há uma lógica de blindagem institucional. Isso é muito grave, porque não permite que haja a investigação, a apuração rigorosa”, pontua.
O deputado cita que há vários elementos que dificultam a transparência no sistema prisional e, por consequência, as materialidades nas denúncias. “Não existem câmeras monitoradas 24 horas no sistema prisional e, quando há câmeras, as imagens são apagadas porque não tem armazenamento, inviabilizando a apuração, não há câmeras corporais na Polícia Penal. E, segundo os internos e os advogados, ainda há um nível muito alto de assédio para que as denúncias não ocorram.”
Denúncias
Fábio também avalia que a punição não é a solução para todos os casos. “Acho necessária a educação, a formação dos profissionais, além de mais profissionais para trabalhar. Porque eu sei também que os servidores trabalham em condições precárias. Nós estamos em um sistema de 16 mil presos com 2 mil policiais penais, então, é um sistema muito duro para eles. Defendo que as medidas de prevenção do governo sejam tomadas de formação, mas, se você tem casos eventuais de violência, tortura dentro do sistema prisional, quando você não faz justiça, você naturaliza esse tipo de comportamento.”
Um dos canais para denunciar casos contra os Direitos Humanos é a Comissão da Câmara Legislativa presidida por Felix. É possível enviar informações de forma presencial ou on-line, com sigilo do denunciante.
Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, Cidadania, Ética e Decoro Parlamentar
Telefone: (61) 3348-8701 / 3348-8703
WhatsApp para denúncias: (61) 99904-1681
E-mail: direitoshumanos@cl.df.gov.br
Praça Municipal – Quadra 2, Lote 5 – 1º andar – Centro Cívico Administrativo – Eixo Monumental – Brasília (DF) – CEP: 70094-902.
Com informações do Metrópoles
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