O julgamento da suspeição do juiz federal Sergio Moro permanece indefinido.
O relator do caso, Edson Fachin, votou contra. Cármen Lúcia, também, mas isso quando o julgamento começou, em 2018.
Durante a sessão de hoje da Segunda Turma, ela fez comentários que vazaram na transmissão, concordando com afirmações de Gilmar Mendes.
Vai mudar seu voto? Nunes Marques, o indicado por Jair Bolsonaro, ofereceu o melhor argumento para que a sessão não fosse adiada. Porém, pediu vista.
Tecnicamente, existe um empate de 2 a 2.
Independentemente disso, os votos de Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski representaram um gravíssimo indiciamento de Moro, de Deltan Dallagnol, de integrantes da Lava Jato e de seu conluio com a mídia.
Por pontos:
1 — Mendes não se intimidou: ele citou um episódio específico envolvendo profissional que serve à família Marinho.
Foi quando Deltan Dallagnol consultou Vladimir Netto, filho de Miriam Leitão e repórter do Jornal Nacional, sobre uma nota que seria divulgada à imprensa, inclusive ao Grupo Globo, por parte da Lava Jato.
Netto escreveu um livro sobre a Lava Jato, publicado em 2016, que estampa o rosto de Moro como herói na capa.
Vladimir, em resposta a Deltan, disse que a Lava Jato não deveria emitir nota em defesa de Moro depois que o juiz foi criticado pela condução coercitiva ilegal de Lula em 16 de março de 2016. Na opinião do jornalista da Globo, a Lava Jato estava mais exposta que Moro e deveria se preservar.
2 — Gilmar Mendes acusou Moro de agir concertadamente com o MPF para “inviabilizar, de forma definitiva, a participação do ex-presidente Luis Inacio Lula da Silva na vida política nacional”.
3. Mendes definiu a condução coercitiva de Lula como sendo “hediondo Estado-espetáculo de caráter policialesco”, frisando que o ex-presidente jamais tinha se negado a comparecer a depoimentos, quando convocado.
Gilmar também descartou a justificativa de Moro, de que pretendia evitar confusão pública, mas levou o ex-presidente Lula para Congonhas, um aeroporto central em São Paulo, com grande trânsito de veículos e pessoas. Mais tarde, o ministro Lewandowski afirmou que a História vai contar quem impediu a transferência de Lula para Curitiba naquela tarde-noite.
4. Gilmar deu grande destaque à mensagem da procuradora Carol Rezende, um dia depois da condução coercitiva, dizendo que era preciso atingir Lula “na cabeça”– e, em seguida, o senador Renan Calheiros. Carol queria definir quais delações deveriam ser prioritárias. “Se tentarmos atingir ministros do STF, por exemplo, eles se juntarão contra a Lava Jato, não tenho dúvida. Tá de bom tamanho neste momento atingir o ministro mais novo do STJ”. Gilmar lembrou o caso do ministro Marcelo Navarro, que foi acusado em delação de Delcídio do Amaral de vender sentenças para empreiteiros. A investigação não encontrou provas e a delação de Delcídio desmanchou.
5. Gilmar bateu fortemente na interceptação telefônica do escritório da defesa de Lula. Ele disse que Moro foi informado duas vezes pela Vivo de que um dos números interceptados era de advogados do ex-presidente. O ministro sugeriu que Moro e o MPF queriam bisbilhotar a estratégia da defesa. “Interceptação de escritório de advocacia é coisa de regime totalitário”, disse Gilmar, ao que Cármen Lúcia parece ter dito, ao fundo, “gravíssima”.
6. Gilmar lembrou que Moro e o MPF também se articularam com a Polícia Federal, onde os policiais criaram um grupo chamado PF vs. Lula. Segundo o ministro, os policiais montaram um “sistema soviético” de monitoramento dos passos da defesa de Lula.
7. “Tudo isso não se realizaria sem um tipo de cumplicidade da imprensa. Esse modelo de estado totalitário que se desenhou teve a complacência da mídia. Tudo deveria ser noticiado pela mídia”, leu Gilmar.
8. Mendes lembrou que em todas as interceptações do ex-presidente, Lula só mencionou uma vez as investigações, uma instrução à sua assessoria de imprensa. Ou seja, não foram obtidas provas de que Lula tentou interferir nas investigações contra ele.
9. O ministro disse que a atuação de Moro para evitar a liberdade de Lula, depois da ordem de soltura assinada pelo desembargador Rogério Favreto, do TRF-4, foi uma demonstração clara de que Moro estava preocupado com seu “projeto de poder”, que passava por cassar e manter Lula preso.
10. Gilmar Mendes falou sobre as delações, citando mensagem de procurador que adiantou que o delator Pedro Corrêa, ex-deputado federal do PP, diria que Lula sabia que o PT arrecadava através de Paulo Roberto Costa, diretor da Petrobras. Foi a base de outro inquérito, o do Quadrilhão do PT, que foi arquivado por falta de provas.
11. Quando Gilmar Mendes pediu desculpas pela extensão do voto, a voz da ministra Cármen Lúcia foi ouvida novamente ao fundo: “Não, tá bom!” Ele acrescentou que depois que Sergio Moro se tornou ministro da Justiça de Jair Bolsonaro, procuradores passaram a criticá-lo. “Ele nos vê como um mal constitucionalmente necessário”, diz a procuradora Monique Cheker em mensagem a colega. “Moro viola sempre o sistema acusatório, mas é tolerado pelos resultados”, também teria escrito.
12. Gilmar fez referência a mensagens não divulgadas pela defesa de Lula, nem pelo Intercept, que registram que Deltan Dallagnol teria “montado um ministério” na conversa com colegas, colocando Jair Bolsonaro para “cuidar” dos Direitos Humanos.
13. Depois de pregar uma profunda reforma da Justiça criminal e do próprio Ministério Público, sob o risco de o Brasil acabar num regime totalitário, Gilmar Mendes concluiu que houve “violação do dever de imparcialidade” de Moro e que o magistrado agiu por “interesse político próprio”. Condenou Moro a pagar as custas do processo. “Não se pode fazer política por meio da persecução criminal”, afirmou.
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