Flávio Dino, dado como certo no Ministério da Justiça; Andrei Rodrigues, provável diretor-geral da Polícia Federal; e o general da reserva Gonçalves Dias, cotado para ser o ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), estudam um plano geral de reestruturação da PF que prevê aumentos salariais, investimento, autonomia funcional e uma descontaminação ideológica da formação e dos cargos de chefia, a partir de uma reorientação de prioridades.
Sai o frenesi anticorrupção, entra a ofensiva contra as milícias, justamente a interface que liga o clã Bolsonaro com o crime organizado, no Rio de Janeiro.
Para tal, além de retirar dos cargos de comando os herdeiros do lavajatismo de Sérgio Moro, o futuro comando da segurança pública pretende expurgar os bolsonaristas, a maioria oriunda da superintendência da PF no Rio, para onde deverão voltar e curtir uma temporada no “corredor”, eufemismo utilizado no jargão policial para servidores que são jogados no limbo, sem função definida, relegados ao ostracismo. Um desses alvos é o delegado Rodrigo Bartolomei, superintendente da PF em São Paulo, que ganhou notoriedade após comandar uma operação, em uma favela do Rio, em 2019, para recuperar o celular roubado do então advogado-geral da União André Mendonça, atual ministro “terrivelmente evangélico” do Supremo Tribunal Federal, indicado por Bolsonaro.
Na linha de tiro também está o ainda ministro da Justiça Anderson Torres, delegado da PF que deixará o cargo queimadíssimo entre os pares, por ter prometido tudo, em nome de Bolsonaro, e não ter cumprido nada. Torres, reconhecido por sua fidelidade total a Bolsonaro, dificilmente conseguirá se readaptar dentro da instituição. Por isso mesmo, negocia duas saídas: voltar para a Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal, de onde saiu para ingressar no governo federal, ou cair para cima, sendo nomeado para uma das muitas adidâncias que a PF tem no exterior.
A avaliação do Grupo Técnico de Inteligência, um dos mais importantes do gabinete de transição de Lula, é de que a inflexão de parte da Polícia Federal para o bolsonarismo se deveu a fatores mais funcionais do que ideológicos, não obstante ser uma instituição conservadora, majoritariamente formada por gente branca e de classe média – o suco social de onde se extraiu a atual extrema-direita nacional.
O diagnóstico levantado pela equipe liderada pelo delegado Andrei Rodrigues, no entanto, aponta para uma profunda frustração tanto com a Lava Jato, que beneficiou só um grupo, na superintendência de Curitiba, como com o governo Bolsonaro, que beneficiou apenas os militares e precarizou, como nunca, as contas e as atividades da PF. Sem falar nos prejuízos trazidos pela reforma da Previdência, para os policiais em geral.
Nem delegados nem agentes da PF têm alguma esperança de reverter de imediato o ambiente de terra arrasada deixado pelo governo Bolsonaro, mas esperam, ao longo de 2023, participar do projeto de recomposição salarial e de retomada de investimentos na instituição, dentro do futuro Orçamento da União, além de abertura de novos concursos públicos.
Tanto Flavio Dino como Andrei Rodrigues concordam com a necessidade de se impor, ainda, medidas de grande valor simbólico para acabar com o clima de anarquia imposto pela dupla Bolsonaro-Anderson dentro da PF. Entre elas, a recondução a seus cargos de origem, na medida do possível, dos delegados afastados por investigarem filhos e aliados do presidente.
É o caso do delegado Alexandre Saraiva, ex-superintendente da PF no Amazonas, responsável pela maior apreensão de madeira ilegal na Amazônia na história, uma operação que resultou na abertura de um inquérito contra o ex-ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles – obrigado a deixar a pasta, logo depois da ação da PF. Saraiva, no entanto, acabou afastado do cargo e passou a ser investigado, dentro corporação, sob alegação de insubordinação por dar entrevistas à imprensa. Pelo menos outros quatro delegados passaram a ser perseguidos do mesmo jeito.
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