O CNMP tem autonomia para aplicar sanções que vão de uma simples advertência à demissão e cassação de aposentadoria. O órgão, composto por 14 conselheiros, se reúne duas vezes ao mês e, desde 2005, quando foi criado, instaurou 250 processos contra procuradores —em 75 deles suspendeu o investigado e, em 19, determinou a demissão, por razões que iam de violência doméstica a desvio de verba pública.
Dos dez pedidos feitos contra Dallagnol, o mais avançado é o procedimento disciplinar, que deve ser colocado em pauta já na semana que vem. É um caso relativo a entrevista dada pelo procurador na qual ele critica o Supremo Tribunal Federal (STF) por ser “leniente” com a corrupção. Apesar de não ter relação direta com os diálogos do ‘The Intercept’, a delicada trama com o STF é justamente o que deteriorou, nos últimos dias, a situação política de Dallagnol. As conversas de Telegram divulgadas indicaram que o grupo de procuradores criticava com frequência membros da Corte. E que ao longo dos últimos anos os procuradores planejaram, inclusive, buscar na Suíça provas contra Gilmar Mendes, conforme revelou nesta semana o EL PAÍS, em parceria com o The Intercept. Na semana anterior, a Folha de S.Paulo, também em parceria com o The Intercept, já havia revelado que Dallagnol tentou buscar informações a respeito de Antonio Dias Toffoli.
Os ministros do Supremo prontamente reagiram à notícia. E Mendes fez duras críticas à Procuradoria-Geral da República [PGR], comandada por Raquel Dodge. “A mim me parece que isso é revelação de um quadro de desmando completo. Revela a gestão da Procuradoria-Geral da República, e certamente vamos ter ainda surpresas muito mais desagradáveis. Tenho que reconhecer que as organizações Tabajara estavam comandando também esse grupo [de investigadores]”, afirmou o ministro à Folha de S. Paulo. A PGR se defendeu. Ressaltou que não caberia ao órgão punir Dallagnol e os demais membros da força-tarefa por eventuais excessos. “Os membros do Ministério Público Federal possuem inamovibilidade. Não há possibilidade de o chefe da instituição ou do corregedor determinarem afastamento de membros”, afirmou uma nota da instituição.
Prazo de 90 dias
Desde o início da divulgação dos diálogos pelo The Intercept e veículos parceiros, foram protocolados no CNMP dez reclamações contra Dallagnol. Cinco delas pelo PT e por seus parlamentares (veja a lista completa abaixo).
Até o momento, todas estão com o corregedor do órgão, Orlando Rochadel. Cabe a ele arquivá-las ou determinar a abertura de um procedimento administrativo, o que daria início a uma investigação sobre a conduta do procurador. Aberto o processo, começa a valer um prazo de 90 dias (passível de prorrogação) para a realização de diligências e outros trâmites, até que o plenário do Conselho tenha uma sentença. Mas existe um artigo no regimento interno que permite ao relator do processo administrativo suspender o investigado de suas funções (mantido o salário) por um prazo de até 120 dias, de maneira cautelar. Este seria, no momento, o pior cenário para Dallagnol, por acelerar uma possível punição.
Ciente da morosidade dos processos contra procuradores, o ministro Gilmar Mendes também disparou nesta semana contra o considera uma lentidão dos órgãos de fiscalização. De acordo com ele, a corregedoria do Ministério Público “praticamente não funciona”. “Quem vigia o guarda neste caso? Os malfeitos cometidos por procuradores são investigados por quem? Essa é uma questão que precisa ser respondida. É preciso que haja investigação”, afirmou.
Existe, além do CNMP, outro órgão que poderia aplicar sanções ao procurador. Mas dificilmente um procedimento contra o coordenador da força-tarefa irá prosperar lá. Trata-se do Conselho Superior do Ministério Público Federal —integrado apenas por membros da carreira—. Atualmente não consta nenhuma representação contra Dallagnol nesse órgão. Assim que as primeiras reportagens do Intercept foram publicadas, chegaram a ser protocoladas quatro ações contra ele, todas arquivadas pelo corregedor-geral do MPF, Oswaldo José Barbosa Silva, com a justificativa de que as provas teriam origem ilícita.
A balança do CNMP
Dentro do CNMP o desfecho do caso de Dallagnol vai depender de um delicado equilíbrio de forças que envolve o corporativismo da instituição. O Conselho é heterogêneo. É formado por Dodge, que o preside, e conta ainda com quatro membros do Ministério Público da União, três membros de Ministérios Públicos Estaduais, dois juízes (um indicado pelo STF e outro pelo STJ), dois advogados indicados pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e dois “cidadãos de notável saber jurídico”, indicados um pela Câmara e um pelo Senado. Em tese, tanto Dodge quanto os demais membros do MP que integram o CNMP (e que somam oito votos) tenderiam a uma postura mais corporativista do que os demais integrantes —principalmente os representantes indicados pela OAB e pelos tribunais superiores, críticos dos métodos da força-tarefa.
Além de um eventual apoio dos colegas de carreira, Dallagnol tem a seu favor o fato de nunca ter sofrido punição pelo Conselho, o que facilitaria a aplicação de uma reprimenda mais dura. As sanções a que procuradores estão sujeitos variam. A advertência é a punição mais branda prevista na Lei Orgânica do Ministério Público, aplicada por escrito, em caso de negligência das funções. Caso o procurador seja reincidente na falta, pode ser punido com uma censura. A suspensão por até 45 dias ocorre quanto o servidor que já sofreu censura comete novo deslize, ou então quando viola alguma das disposições da Lei. Por fim, a demissão ocorre apenas em casos muito específicos, como lesão aos cofres públicos, improbidade administrativa, abandono de cargo ou “condenação por crime praticado com abuso de poder ou violação de dever para com a Administração Pública entre outros”.
AS RECLAMAÇÕES CONTRA DALLAGNOL
No total, o procurador tem nove reclamações abertas contra ele no Conselho (e um processo administrativo). Seis delas tem relação com as revelações do The Intercept. Veja quais são e por qual motivo:
– Autor: Senador Renan Calheiros (MDB-AL). Assunto: uma série de tuítes feitos por Dallagnol contra ele durante as eleições de 2018.
– Autor: Bancada parlamentar do PT. Assunto: Afirmam que Dallagnol e os demais procuradores da Lava Jato extrapolaram suas atribuições ao quererem “disciplinar e dar uso” aos recursos pagos na forma de indenização pela Petrobras.
– Autor: Senadora Kátia Abreu (PDT-TO). Assunto: Afirma que Dallagnol infringiu a lei orgânica do MP por ter postado no Twitter uma reportagem que trazia fatos negativos contra a parlamentar referentes a um caso já arquivado.
– Autor: Associação Brasileira de Juristas pela Democracia. Assunto: “Supostas violações a deveres funcionais” tendo como base o conteúdo das reportagens feitas pelo The Intercept.
– Autor: PT. Assunto: Mensagens divulgadas pelo The Intercept nas quais os “citados membros teriam se articulado para obter lucro mediante a realização de palestras pagas”.
– Autor: Bancada do PT. Assunto: Suposta articulação de Dallagnol e o então juiz Sergio Moro no qual o procurador articula o redirecionamento de dinheiro apreendido pela Lava Jato para a campanha “10 medidas contra a corrupção”. A reclamação foi feita com base no conteúdo das reportagens do The Intercept.
– Autor: Deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP). Assunto:Palestra remunerada feita por Dallagnol paga pela empresa Neoway, cujo representante se tornou colaborador da Justiça. A reclamação foi feita com base no conteúdo das reportagens do The Intercept.
– Autor: Deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS). Assunto:Palestras remuneradas feitas por Dallagnol e violação dos preceitos do cargo de procurador. A reclamação foi feita com base no conteúdo das reportagens do The Intercept.
– Autor: Associação Nacional de Desembargadores. Assunto:Suposta investigação ilegal conduzida por Dallagnol e pela força-tarefa contra o ministro do Supremo Dias Toffoli.
Um dos casos mais famosos de demissão de procurador por parte do CNMP se deu em abril de 2016. O plenário decidiu desligar o procurador Douglas Kirchner por agressão e tortura de sua mulher em 2014. À época ele investigava o suposto tráfico de influência realizado por Lula no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Para o Conselho, a atitude de Kirchner feriu a imagem do Ministério Público, o que justificou sua demissão.
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