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Imagem: REUTERS/Bernadett Szabo

O tsunami da extrema-direita está varrendo boa parte do mundo (EUA, Inglaterra, Polônia, Turquia, Hungria, Brasil, Rússia e por aí vai). Maquiavel receitava a todos os governantes (de esquerda ou de direita) que é preferível ser temido que amado.

Motivo: o amor se rompe ao sabor do interesse próprio. O temor se sustenta e perdura pelo medo do castigo. Mas cuidado: ser temido não tem nada a ver com ser odiado.

Há um erro mortal que os governantes não podem cometer (dizia Maquiavel): não mexam com os bens e as mulheres dos seus súditos, porque isso gera ódio capaz de derrubá-los do poder.

A extrema-direita na Hungria está cometendo esse velho erro. O povo está enfurecido contra o líder populista Viktor Orbán, que já foi eleito três vezes. Ele esqueceu que o povo com ira apoio dá e apoio tira!

A razão da revolta: acaba de ser aprovada a “lei da escravidão”, obrigando o povo a trabalhar 400 horas extras por ano, sem nenhum adicional a mais e o crédito do trabalhador pode ser pago em até três anos.

Hum! Mexeu com o bolso e a dignidade do trabalhador. Ninguém quer trabalhar mais por um salário que será recebido três anos depois. Sensação de trabalho escravo. Daí a explosão nas ruas de Budapeste e tantas outras cidades.

A extrema-direita está começando a sentir o amargor do ódio do povo. Quando isso ocorre o governante pode ser derrubado.

Quer saber mais sobre isso? (continue lendo)

O povo húngaro está invadindo as ruas de Budapeste desde 12 de dezembro de 2018 para protestar contra a “lei da escravidão” que, diante da escassez de mão de obra no país (foram aprovadas leis duríssimas contra os imigrantes, os estrangeiros e refugiados), deu aos patrões o direito de exigir dos empregados 400 horas extras por ano (hoje, 250), que podem ser pagas (vejam só!) em três anos sem nenhuma compensação financeira a mais.

 

 

 

 

 

Manifestantes na praça Kossuth, em Budapeste, protestam neste sábado contra a ‘lei da escravidão’ do Governo de Orbán. FERENC ISZA AFP (El País).

A população afetada está esbravejando, embora a lei exija o consentimento do trabalhador.

O povo, como se sugere, não é o dono único da história. Aliás, muitas vezes a história é feita sem sua participação. Veja o caso da proclamação da nossa República, em 1889. O povo desinformado vendo a cavalaria na rua achava que era mais um desfile militar. Nossa República foi uma decisão das elites (Exército e oligarquias cafeeiras), chefiada pelo marechal Deodoro da Fonseca, que por sinal era um adepto da monarquia. E o monarca (D. Pedro II) admirava a República.

Por força da lei de ferro das oligarquias (descrita por Robert Michels, em 1911), afirma-se que a história é escrita muito mais pelas elites do poder, dominantes e governantes, que pelo povo. Nas democracias formais (procedimentais), de qualquer modo, o povo com ira apoio dá e apoio tira.

Quando setores muito relevantes das elites do poder (setores econômicos, financeiros e políticos) são corruptos ou perversamente privilegiados, eles acabam escrevendo uma história suja, emporcalhada. Quando arbitrários, escrevem uma história violenta.

Em países estruturados sob o império das máfias, são elas que acabam escrevendo a história ou boa parte dela (ora com o apoio do povo, ora sem ele).

Qual então é o protagonismo do povo nesses países com frações significativas de elites extrativistas, espoliadoras e exploradoras?

O povo, normalmente incrédulo, em suas vidas labirínticas de incertezas, corre para lá e para cá, desesperado e irado, e em círculo, ou grita nas redes sociais, “atrás do seu bolso, da sua sobrevivência, das suas taras [religiosas, ideológicas, culturais] e dos seus ressentimentos” [mágoas, angústias e rancores] (Pondé, Folha 24/12/18).

Foi assim nas Jornadas de 2013 no Brasil, nas cruzadas contra a corrupção em 2015 e 2016, com os Coletes Amarelos na França em 2018, com a Primavera Árabe em 2011, com o Occupy Wall Street e a invasão da Puerta del Sol em Madrid no mesmo ano, com a greve dos caminhoneiros em 2018 (contra o aumento do combustível) e por aí vai.

Medidas que impactam o custo de vida ou que geram a sensação de perda de bem-estar na população podem produzir megaprotestos. Tudo depende da ira do povo. Quando a raiva aumenta a bomba-relógio detona.

Sempre que podem, as elites populistas ou bandidas manipulam essa ira popular e dela tiram proveito.

Viktor Orbán está experimentando agora a mesma ira do povo que a colocou no poder três vezes. Na Venezuela o populista de esquerda Maduro está fazendo das tripas coração para se manter no comando da nação.

Se o bolso e o estômago do povo estão saciados, se o povo não está ressentido ou contrariado em suas crenças e convicções, tolera-se a corrupção das elites governantes (caso do Lula logo após o escândalo do mensalão, Temer e tantos outros).

Eventuais arbitrariedades de quem está no poder (contra minorias relevantes) ou até mesmo os solapamentos das instituições democráticas (liberdades da mídia, por exemplo) também não levam o povo às ruas (normalmente).

Nem os privilégios perversos dos que dominam (empresas e corporações que compram seu acesso ao poder) são objeto de revoltas populares.

Quando o governante, no entanto, mexe com os bens ou as mulheres dos súditos, o risco é grande, por causa do ódio. Os populistas (de direita ou de esquerda) precisam recordar que com a mesma ira (agora destilada também nas redes sociais) o povo tanto dá apoio como apoio tira.

Outro aspecto relevante a ser notado na gritaria dos húngaros é o seguinte: qual é o limite que o povo suporta em relação aos governos populistas autoritários?

Ao que tudo indica, parece que o povo está sugerindo que aceita certas arbitrariedades, mas não aceita o nazismo, cujas seis linhas mestras são: (1) a agressão ou a limpeza étnica, (2) a destruição da separação dos poderes, (3) a crescente restrição dos direitos civis, políticos e sociais, (4) o fechamento do Parlamento, (5) o corporativismo e o estatalismo da economia e (6) o assassinato massivo (inclusive por meio de uma guerra) (Xavier Vidal-Folch, El País 23/12/18).

Viktor Orbán iniciou a limpeza étnica contra os ciganos e refugiados sírios. Depois aprovou a bandeira do antissemitismo (“Lei Stop Soros”) assim como a expulsão de estrangeiros. Aposentou vários juízes da Corte Suprema e agora criou, dentro do Executivo, um sistema jurisdicional paralelo.

Com a chegada da “lei da escravidão” o povo começou a dizer basta!

Essa é a lição que fica para todos os populistas: acertem os ponteiros da economia com o povo. Povo descontente serve para a fabricação de governos populistas (vimos isso nos EUA, “Brexit” etc.), mas o vento pode mudar para também tirá-los do poder.

Em síntese: diante do povo, nem os populistas podem se julgar deuses intocáveis.

Luiz Flávio Gomes
Sobre o autor

Criador do movimento de combate a corrupção, “Quero um Brasil Ético”. Delegado de Polícia aos 21 anos, Promotor de Justiça aos 22 e Juiz de Direito aos 25, exerceu também a advocacia. Fundou a Rede LFG, democratizando o ensino jurídico no Brasil. Doutor em Direito Penal, jurista e professor. Publicou mais de 60 livros, sendo o seu mais recente “O Jogo Sujo da Corrupção”. Foi comentarista do Jornal da Cultura. Escreve para sites, jornais e revistas sobre temas da atualidade, especialmente sobre questões sociais e políticas, e seus desdobramentos jurídicos. Em 2018 candidatou-se pela primeira vez com o objetivo de defender a Ética, a Justiça e a Cidadania. Eleito Deputado Federal por São Paulo – PSB com 86.433 votos.
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