Por não ser espontânea, a recessão ocorre no capitalismo por decisão planejada de política econômica dos governos. Após a Grande Depressão de 1929, por exemplo, a economia brasileira registrou, entre 1933 e 1980, apenas dois anos (1940 e 1942) de decréscimo do Produto Interno Bruto (PIB), sem poder ser considerados recessivos.
Em resumo, o período de 48 anos (1932-1980) registrou trajetória econômica marcada por 46 anos (96% do período) de expansão do PIB e somente dois anos (4%) de regressão. Assim, nota-se que a cada 23 anos de evolução positiva do PIB, havia, em média, um ano de queda no nível de atividade da economia brasileira.
Desde 1980, contudo, o país passou a registrar, a cada três anos e meio de ascensão do PIB, um ano de regressão, em média. Isso porque nos 36 anos de trajetória recente da economia nacional (1981-2016), o PIB ascendeu em 28 anos (78%) e declinou em oito anos (22% do tempo).
As três grandes recessões econômicas que ocorreram a partir de 1980 não apenas modificaram os rumos do capitalismo brasileiro, como difundiram obstáculos maiores para a retomada do seu nível de atividade. Naquele momento, a adoção de políticas ortodoxas de natureza liberal conservadora atingiu forte e prolongadamente o setor industrial, centro do dinamismo da economia nacional desde a década de 1930.
Na primeira recessão de 1980-1983, o PIB decresceu acumuladamente 6%. Naquela época, o declínio forçado da economia, por acordo com Fundo Monetário Internacional, teve como objetivo gerar elevado superavit comercial para atender o pagamento da dívida externa. O inadequado fechamento da economia nacional decorrente do ajuste externo não apenas desviou o país do curso da terceira Revolução Industrial e Tecnológica, como consolidou ainda mais uma estrutura produtiva oligopolizada, fortemente dependente da alta inflação.
Nos anos de 1990-1992, a segunda recessão levou ao declínio acumulado de quase 4% do PIB. A adoção do programa neoliberal identificado com o Consenso de Washington impôs a privatização desorganizada e abriu abrupta e irresponsavelmente a economia nacional, comprimindo à estrutura produtiva e a tornando dependente de altas doses de juros reais associadas ao rentismo improdutivo.
Na terceira recessão desde 1980, o PIB decaiu 7% acumuladamente entre 2015 e 2016. A implantação do incongruente programa de austeridade fiscal contraiu ainda mais o setor industrial para menos de um décimo de importância relativa da estrutura produtiva nacional, somente comparável à década de 1910.
Naquela época, recorda-se, quando o país desconhecia o que era industrialização e o seu poder de dinamização interna da economia nacional, predominava a dependência às exportações de produtos primários, como o café e açúcar. Nos dias de hoje, a especialização crescente do país à produção e exportação de produtos primários o torna dependente de apenas seis produtos que respondem por quase a metade das vendas externas (soja, carnes, minério de ferro, açúcar, café e celulose).
Isso nem seria mau, caso a economia tivesse impulso dinâmico interno. Como não acontece, a insistência na continuidade do programa de austeridade fiscal conduzido pelo governo Temer termina por ceifar qualquer possibilidade sustentável de retomada da economia nacional. Em 2018, a permanência da asfixia do setor público seguirá estimulando o rentismo improdutivo, na mesma medida em que a receita de anabolizante ao paciente faz crescer os músculos sob o risco de maior câncer ou o próprio infarto do usuário.
* Marcio Pochmann é economista. É professor do Instituto de Economia e pesquisador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho, ambos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp)