Trump é supremacista branco, anti-aborto, negacionista da pandemia, do câmbio climático, da ditadura militar no Brasil E fascista; Biden, não
Parte da esquerda brasileira parece afetada pela “síndrome da escolha muito difícil”. Assim como o Estadão fez no famigerado editorial de 2018 para convencer eleitores incautos de que eleger Fernando Haddad era a mesma coisa que eleger Jair Bolsonaro, vejo muita gente repetindo que Joe Biden é igual a Donald Trump. Não, não é. Em primeiro lugar porque o presidente republicano é fascista, e o candidato democrata, não.PUBLICIDADE
Biden, como todo presidente norte-americano, é colonialista, imperialista, senhor das guerras? Sem dúvida. Mas, além de ser tudo isso, Trump também é supremacista branco, anti-direitos LGBTQ, anti-aborto, negacionista da pandemia, do câmbio climático e das ditaduras militares na América do Sul. Biden, não. Inclusive entregou para a presidenta Dilma Rousseff documentos que comprovam as torturas que o chapa de Trump, Bolsonaro, nega haver existido no período.
Assim como o Estadão fez em 2018 para convencer os eleitores de que eleger Haddad era a mesma coisa que eleger Bolsonaro, vejo muita gente repetindo que Biden é igual a Trump. Não, não é. Em primeiro lugar porque o republicano é fascista, e o democrata, não
A BBC Brasil lembrou que, em junho de 2014, Biden, então vice-presidente de Barack Obama, entregou a Dilma um HD com 43 documentos produzidos por autoridades norte-americanas entre os anos de 1967 e 1977. “A partir de informações passadas não só por vítimas, mas por informantes dentro das Forças Armadas e dos serviços de repressão, os relatórios detalhavam informações sobre censura, tortura e assassinatos cometidos pelo regime militar do Brasil”, contou a repórter Mariana Sanches. Os documentos foram incorporados ao relatório final da Comissão Nacional da Verdade, em dezembro daquele ano. por taboola Links promovidos Você pode gostar Bolsonaro mostra tristeza com Danilo Gentili, que o acusa de ter pedido sua cabeça ao SBT: “Ainda me chama de fdp”; veja vídeoNova fórmula some com joanetes, zera a dor e vira febre em AnápolisMétodo HalluxAbalada, filha de Constantino tenta defendê-lo sem justificar sua declaração machistaBolsonaro é internado às pressas em Brasília após acidente doméstico
É bem verdade que Obama se omitiu publicamente no golpe contra Dilma em 2016, ao mesmo tempo que sua polícia federal, o FBI, atuava por baixo dos panos na golpista Lava-Jato. Também é verdade que, sendo democrata ou republicano, o presidente dos EUA promove guerras. Mas nem toda guerra envolve armas. Na guerra “cultural” que estamos travando contra o fascismo, Biden supera Trump em todos os quesitos. Em termos de costumes, Trump é igualzinho a Bolsonaro, não a Biden.
O aborto é um exemplo claro disso. Nos EUA, desde o julgamento Roe vs. Wade pela Suprema Corte em 1973, o aborto é legalizado na maior parte dos Estados. Uma das promessas de campanha de Trump em 2016 era justamente reverter Roe vs Wade. Já Biden, embora no passado tenha se pronunciado contrário e até votado em 1982 em favor de que os Estados pudessem rever a decisão, mudou de opinião e agora promete aprovar uma legislação colocando Roe vs. Wade a salvo de uma virtual Corte Suprema conservadora. “Eu apoio Roe. Eu apoio o direito da mulher de escolher sob garantia constitucional. E, falando francamente, sempre apoiarei”, disse Biden no ano passado.
A declaração do democrata de que tornará a decisão “law of the land” para protegê-la foi imediatamente atacada por Trump no twitter. “Uau. Joe Biden tomou uma posição mais liberal em relação a Roe vs. Wade do que a de Elizabeth Warren. Ele também quer enquadrar nossa grande Suprema Corte dos EUA. Isto é o que os democratas farão. Lembrem-se que eles tentam mudar de posição até o fim das eleições. Saia e vote!”
Embora a decisão de 1973 que permitiu a legalização do aborto nos EUA seja contestada pelos evangélicos conservadores pró-Trump, uma pesquisa recente mostra que ela é apoiada pela ampla maioria dos adultos norte-americanos. Para 66% dos adultos do país, Roe vs. Wade não deve ser revertida pela Suprema Corte, enquanto 29% acham que deve. Entre os eleitores democratas, a vantagem é ainda maior: 86% disseram que a decisão deve ser mantida, contra 12% que deve ser revista. Mesmo entre os republicanos, o placar é apertado: 50% são a favor da reversão e 47% contra.
O tema do aborto ocupa uma posição central hoje na guerra “cultural” entre o progressismo e o conservadorismo fascista. Não por acaso, a Suprema Corte da Polônia ultraconservadora acaba de restringir ainda mais o aborto em um dos países onde já é praticamente impossível interromper uma gestação: agora, é proibido abortar até mesmo nos casos de malformação fetal, que representam 97% dos abortos realizados lá. Pode ter sido um tiro no pé: há 10 dias as mulheres polonesas tomam as ruas do país demonstrando seu descontentamento.
O negacionismo da pandemia também une Trump e Bolsonaro, e não Biden e Trump. Desde o começo, o presidente norte-americano lidou mal com o coronavírus, o que pode lhe custar a reeleição. Como seu capacho brasileiro, Trump desdenhou da doença, atribuiu o vírus à China, deu mau exemplo ao não usar máscara, promoveu um medicamento comprovadamente ineficaz –a cloroquina– e agora também cria bravatas e fake news contra a vacina. Biden fez exatamente o oposto: usou máscara o tempo todo, defendeu a ciência e criticou o adversário por sua postura irresponsável diante da covid-19.
É no plano simbólico que a vitória de Biden sobre Trump representa maior avanço, porque quebra a perna do fascismo justamente no país mais importante em que ele se instalou. Será um efeito dominó: caindo Trump, os mini-fascistinhas que o emulam, como Bolsonaro, também ruirão
No último debate da campanha presidencial, ficou evidente a profunda divergência entre Trump e Biden em relação às mudanças climáticas. Mesmo os EUA sendo o segundo maior emissor de CO2 do mundo, Trump reverteu mais de 160 regras ambientais após assumir o cargo e retirou o país do Acordo de Paris, assinado pelos EUA e 196 nações.
O mesmo tem feito Bolsonaro por aqui: reduziu à metade o número de fiscais do Ibama, desestruturou e aparelhou os órgãos de fiscalização, duvidou de imagens de satélite mostrando o aumento do desmatamento e das queimadas, levando o diretor do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) a se demitir, e mais recentemente tentou acabar com as normas de proteção aos manguezais e restingas. Já Biden promete recolocar os EUA no Acordo de Paris e alcançar 100% de “economia de energia limpa” até 2050.
Se, como vimos, é Bolsonaro que é igual a Trump, como não torcer para que seu parceiro seja colocado para fora da Casa Branca? É no plano simbólico que a vitória de Joe Biden diante de Donald Trump representa maior avanço, porque quebra a perna do fascismo em ascensão justamente no país mais importante em que ele se instalou. Será um efeito dominó: caindo Trump, os mini-fascistinhas que o emulam ao redor do mundo, como Bolsonaro, também ruirão. Será uma mudança de narrativa e de paradigma.
Para Chomsky, Trump é “o maior criminoso da História da humanidade”. “Maior do que Hitler, do que Stalin?”, perguntou o entrevistador. E Chomsky: “Stalin era um monstro. Mas ele estava tentando destruir a vida humana na Terra?”
A esquerda que está equiparando Biden a Trump precisa cair na real e colocar o combate ao fascismo como prioridade neste momento. Se não querem me ouvir, ouçam Noam Chomsky, em entrevista recente à revista New Yorker. “Nos 350 anos de democracia parlamentar, não houve nada como o que estamos vendo agora em Washington. Um presidente que disse que se não gostar do resultado de uma eleição, ele simplesmente não deixará o cargo”, disse o filósofo, para quem o atual presidente dos EUA é “o maior criminoso da História da humanidade”.
“Maior do que Hitler, do que Stalin?”, perguntou o entrevistador. E Chomsky respondeu: “Stalin era um monstro. Mas ele estava tentando destruir a vida humana organizada na Terra?”
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