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A questão que se impõe, portanto, agora, é: por que estamos agendando a derrota de Lula como possível candidato à Presidência em 2022, quando quem deveria ser integralmente derrotada e esmagada em momento de tão grandes revelações, é a própria operação Lava Jato, seus integrantes e todos os setores golpistas que com ela contribuíram, não importa de onde venham?

Senhoras e senhores, expliquem-me! O que estamos agendando? Por que estamos agendando? Para quem estamos agendando?

Por Tânia Mandarino*, especial para o Viomundo

Desde o último domingo (31/01), baseados em editorial do Estadão, a mídia alternativa e alguns juristas de peso vêm apostando na ideia de que o STF declarará a suspeição de Moro nos processos que conduziu contra Lula, mas manterá a perda de seus direitos políticos, ainda que ressalvando que isso jamais poderia acontecer sob a ótica legal.

A origem dessa tese é que Moro conduziu, do princípio ao fim a condenação em primeira instância, todo o processo do triplex, mas o caso do sítio de Atibaia, não.

Por ocasião da audiência de instrução e julgamento, Moro deixou a magistratura para receber seu quinhão por ter afastado Lula da disputa presidencial, assumindo o cargo de ministro da Justiça do governo Bolsonaro.

Quem não se lembra da audiência de instrução no caso do sítio de Atibaia, conduzida por uma juíza irada e deslumbrada, que advertiu Lula: “Se o senhor começar nesse tom comigo nós vamos ter problemas”?

E que mais tarde, ela mesma copiou e colou trechos da sentença condenatória de Moro no processo do triplex, para condenar Lula também no caso de Atibaia?

Pois bem, no domingo passado as teses do editorial do Estadão as eram três:

1) STF declarará a suspeição de Moro.

2) STF não declarará a suspeição de Moro.

3) STF declarará a suspeição de Moro, mas manterá inalterada a questão da perda dos direitos políticos de Lula, ou porque não foi Moro quem deu a sentença no caso de Atibaia, e sim a juíza Gabriela Hardt, ou porque a análise do processo de Atibaia demanda o julgamento de outro Habeas Corpus, que não entraria em pauta a tempo de Lula ser candidato em 2022.

Para meu espanto, a terceira tese do editorial do Estadão foi imediatamente repercutida por juristas e jornalistas do campo progressista e nós passamos a ver, nos grupos de zap e nas redes sociais, manchetes com os seguintes teores:

Suspeição de Moro com Lula fora das eleições (Estadão, 31/01/2020)

Elites tramam novo golpe: suspeição de Moro, com Lula fora das eleições (Brasil 247, 31/01/2021)

Merval prevê suspeição de Moro em 2021, mas sem a devolução dos direitos políticos de Lula (Brasil 247, 01/02/2021)

E, em sua coluna na Folha deste sábado (05/02), Mônica Bergamo faz a previsão: “STF não deve devolver direito político a Lula mesmo que Moro seja considerado parcial no caso do tríplex” (Folha de S. Paulo, 05/02/2021)

Alguns veículos dão conta de que até o próprio Lula estaria preocupado quanto à manutenção da perda de seus direitos políticos, mesmo depois que for decretada a suspeição de Moro:

Lula diz temer que STF não devolva seus direitos políticos mesmo com suspeição de Moro e pede mobilização (Folha de S. Paulo, 05/02/2021).

Do ponto de vista jurídico, importante lembrar que a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão, de 1948, estabelece que toda pessoa tem direito, em condições de plena igualdade, de ser ouvida publicamente e com justiça por um tribunal independente e imparcial, para a determinação de seus direitos e obrigações ou para o exame de qualquer acusação contra ela em matéria penal.

Nosso Código Penal, em seu artigo 254, assegura que o juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes se, dentre outras coisas, for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles e tiver aconselhado qualquer das partes.

Sobre a imparcialidade do juiz, o artigo 8º do Código de Ética da Magistratura Nacional define o magistrado imparcial como aquele que busca nas provas a verdade dos fatos, com objetividade e fundamento e mantém ao longo de todo o processo uma distância equivalente das partes e evita todo o tipo de comportamento que possa refletir favoritismo, predisposição ou preconceito.

Ainda, preceitua o art. 9º do mesmo Código de Ética que cabe ao magistrado, no desempenho de sua atividade, dispensar às partes igualdade de tratamento, vedada qualquer espécie de injustificada discriminação.

A suspeição produz a incompetência do magistrado para conhecer e julgar aquela ação e torna nulo o processo a contar do primeiro ato em que houve intervenção do juiz suspeito, de modo que processos conduzidos por juízes suspeitos devem ser anulados desde a primeira intervenção do magistrado, não importando se, ao final, foi o mesmo juiz quem sentenciou ou não o processo.

Além disso, por ser personalíssima a imparcialidade, a suspeição arguida em um processo é suficiente para atingir todos os processos do acusado, conduzidos pelo juiz declarado suspeito, ou seja, não há necessidade de pautar nova data de julgamento para arguições de suspeição relativas ao processo do sítio de Atibaia.

Lembrados os fundamentos acima, por quais razões a mídia e até juristas que discordam da tese estão dando ênfase à ideia de que os dois processos de Lula serão anulados por conta da suspeição de Moro, mas que, no do sítio de Atibaia, ele não recuperará seus direitos políticos?

Vejam, eu não tenho absolutamente nada contra que a tese seja discutida.

Afinal, sabemos o quanto é golpista o nosso judiciário.

O que me deixa muito intrigada e indignada é a ênfase, o destaque, que a mídia e figurões do nosso campo na área do Direito vêm dando ao tema há uma semana.

Na realidade, deveríamos estar discutindo com afinco teses sobre: a prisão do Moro e do Dallagnol; como fazer com que Dallagnol seja demitido sem direito a nenhum benefício; como converter a exoneração a pedido de Moro em demissão, para que ele não tenha mais direito a nenhum provento como juiz; como se darão as reparações de todo o estrago que causaram a Lula, seus filhos, à vida de Dona Marisa e à quebradeira que impuseram ao Brasil.

A tese que deve ser enfatizada por nós, agora, é sobre o enquadramento da quadrilha, que colocou um genocida na Presidência da República, nas mais adequadas capitulações criminais possíveis, de preferência formulando sobre suas condenações com enquadramento na Lei de Segurança Nacional, que em seu artigo 9º assim dispõe: “Tentar submeter o território nacional, ou parte dele, ao domínio ou à soberania de outro país. Pena: reclusão, de 4 a 20 anos. Parágrafo único – Se do fato resulta lesão corporal grave, a pena aumenta-se até um terço; se resulta morte aumenta-se até a metade”.

Para a jornalista Lara Sfair, a hora é de levantar todas os crimes cometidos pela Lava Jato e não de pautar se Lula vai ou não ter os seus direitos políticos mantidos como indisponíveis, por uma teoria que nem encontra amparo legal.

Segundo a jornalista, é hora de fazer a lista dos mortos da Lava Jato, começando pelo estranho perseguido “encontrado morto” em um motel, logo no início da operação, e culminando no acidente aéreo do Ministro Teori Zavascki.

Sem esquecer dos experientes policiais assassinados por um pipoqueiro em circunstâncias estranhíssimas em Florianópolis.

Começar pelos mortos da Lava Jato não é só apropriado, é essencial porque os crimes cometidos por essa quadrilha não foram só econômicos.

Portanto, ao que me parece, não somente sob a ótica do direito, como também do ponto de vista jornalístico, tem algo estranho nessa ênfase de que a vitória de Lula será somente meia vitória, ou seja, ganha a suspeição de Moro, mas não se mexe na cassação de seus direitos políticos.

A jornalista Lara Sfair diz, ainda, que demorou muito tempo para entender na prática como funciona a Agenda Setting, ou Teoria do Agendamento, porque ela tem ares de grande teoria conspiratória.

Para melhor compreensão, ela exemplifica, perguntando:

Quem decide quais são os nomes em uma pesquisa eleitoral, quando ninguém é oficialmente candidato?

Quem decide que tese ouvir e quem entrevistar?

Se toda vez que a imprensa fala de negócios do campo ouve produtor de soja, de gado e dono de fábrica de trator, qual a imagem que as pessoas têm do campo?

E, então, como se sente o camponês que nunca se vê representando na mídia?

Uma pista de Lara, a Teoria do Agendamento, que é uma das teorias do Jornalismo, poderá fazer muito sentido nos eventos que se seguirão nos próximos dias com relação à suspeição de Moro.

Quem não se lembra do Brasil dizendo “não” à PEC 37, que restringiria os poderes de investigação do Ministério Público?

Quem não se lembra que o agendamento desse rotundo e sonoro “não” foi projetado durante as jornadas de julho de 2013 e encampado pela Globo, de modo a manipular de tal forma a opinião pública, que até a bancada petista em peso também disse “não” à PEC 37?

E então, você vê alguma ligação entre os crimes cometidos pelos procuradores da Lava Jato e a rejeição da PEC 37?

A questão que se impõe, portanto, agora, é: por que estamos agendando a derrota de Lula como possível candidato à Presidência em 2022, quando quem deveria ser integralmente derrotada e esmagada em momento de tão grandes revelações, é a própria operação Lava Jato, seus integrantes e todos os setores golpistas que com ela contribuíram, não importa de onde venham?

Senhoras e senhores, expliquem-me! O que estamos agendando? Por que estamos agendando? Para quem estamos agendando?

A partir de tais reflexões, penso que não devemos admitir qualquer outra hipótese, que não seja a declaração da suspeição do juiz criminoso com a anulação integral dos dois processos de Lula e a devolução de seus direitos políticos e sua inscrição como candidato à Presidência em 2022, para devolver a esperança e a dignidade, roubadas ao Povo Brasileiro entre 2016 e 2018.

Qualquer agendamento diferente disso pela mídia, ainda que amparado por falas doces de grandes figurões do Direito, deve ser veementemente rechaçado.

Qualquer decisão que mantenha a cassação dos diretos políticos de Lula também.

Não agendemos nada nesse sentido.

Tânia Mandarino: Por que após editorial do Estadão estamos agendando a inelegibilidade de Lula no STF ?

Fotos: Ricardo Stuckert, Marcos Oliveira/ Agência Senado, STF e Eduardo Matysiak

05/02/2021

*Tânia Mandarino é advogada e militante petista.