Gabriela Hardt usou 29 páginas da condenação de Lula para defender o ex-juiz Sérgio Moro, que todas suas decisões foram “fundamentadas” ou sem “qualquer suspeita de vício” ou “parcialidade”
Das 327 páginas da sentença da juíza Gabriela Hardt contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, 29 foram usadas exclusivamente pela magistrada para sair em defesa do ex-juiz, antecessor na Vara Federal de Curitiba e agora ministro do governo Bolsonaro, Sérgio Moro.
A medida, que teve como objetivo negar os argumentos da defesa de Lula sobre Moro ser suspeito para o julgar no processo do sítio de Atibaia, foi exposta como uma peça de um advogado ou parte interessada na ação, e não uma decisão de juízo.
Inicialmente, Hardt mencionou que “a alegada suspeição do magistrado” já havia sido negada por outras Cortes. “Todas elas (alegações dos advogados de Lula) até o presente momento foram rejeitadas por todos os órgãos de julgamento que já analisaram a questão”, defendeu Gabriela, continuando que “por amor à brevidade” iria reproduzir as falas finais dessas decisões.
Mas os três trechos exemplificados pela juíza não foram de diversas instâncias, e sim do relator do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4), João Pedro Gebran Neto, que manteve uma postura fiel de concordância com as sentenças de Sérgio Moro na Lava Jato.
O caso ainda não foi concluído pelo Supremo Tribunal Federal (STF), porque o ministro Gilmar Mendes pediu vista do julgamento sobre as irregularidades e posturas de Sérgio Moro como juiz dos processos contra Lula.
Se anteriormente a juíza havia reproduzido as decisões judiciais de Gebran Neto, nesse ponto, a magistrada ironizou o argumento da defesa de Lula de perseguição política: “Novamente a questão acerca da suspeição do referido magistrado, em alegada atuação política durante a judicatura e ‘perseguição’ ao réu deste processo Luiz Inácio Lula da Silva foi trazida por sua defesa, mas levada para julgamento diretamente pela Corte Suprema nos autos de HC 164493.”
E decidiu reproduzir as 25 páginas da sua manifestação anterior, quando sim havia se posicionado como parte interessada da defesa do investigado – no caso, o juiz, em ofício enviado ao ministro Edson Fachin, do STF, em novembro passado.
No meio da coleta de argumentos para condenar Lula, a juíza justifica a reprodução das significativas quantidades de páginas: “Reputo que tal ofício esgota a análise de todas as questões trazidas a respeito da alegada imparcialidade, razão pela qual, mesmo extenso, transcrevo seu conteúdo para agregar suas razões na fundamentação desta sentença”.
No documento enviado por Hardt, a juíza havia usado palavras redigidas pelo próprio ex-magistrado e hoje ministro de Jair Bolsonaro, datadas de 2017, quando já negava ser um juiz parcial.
Ainda, Hardt usou como exemplo as falas de Moro em coletiva de imprensa, no ano passado, momento em que se explicou que a aceitação do convite de Jair Bolsonaro para ocupar ministério do governo “em nada se relacionaria” com o caso de Lula.
Na ocasião, Sérgio Moro também havia aproveitado o microfone para criticar as reclamações da defesa do ex-presidente, chamando de “álibi falso de perseguição política”, e ignorando as reuniões que teve com Bolsonaro, ainda em período pré-eleitoral, quando Moro despachava judicialmente contra Lula.
“Sei que alguns eventualmente interpretaram a minha ida como uma espécie de recompensa – algo equivocado, porque a minha decisão [por condenar Lula] foi tomada em 2017, sem perspectiva de que o deputado federal fosse eleito presidente”, havia dito Moro, na mencionada entrevista.
Aquela coletiva de imprensa foi lembrada pela juíza, disponibilizando links de jornais da imprensa tradicional, como Estadão e IstoÉ, no despacho a Fachin em novembro e agora repetido na sentença contra Lula.
Nos parágrafos finais do trecho que sai em defesa de Sérgio Moro, Gabriela conclui elogiando o juiz antecessor, elevando o tom adotado de peça advocatória:
“Desde que assumi a condução dos presentes autos não vislumbrei qualquer decisão proferida pelo magistrado que me antecedeu que não tenha sido devidamente fundamentada, sendo que a análise de tais fundamentações atestam que estão de acordo com interpretações válidas dos normativos atinentes e do Sistema Processual brasileiro, afastando qualquer suspeita de vício que possa comprometer sua imparcialidade.”
Jornal GGN
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