STF retoma julgamento que pode recalibrar o foro de prerrogativa, em 12 de abril. Congresso prepara ofensiva com PEC para restringir
O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, liberou para julgamento o processo que amplia o foro privilegiado para políticos para além do mandato e a Corte retoma o julgamento em 12 de abril.
Com o placar de 5 a 0, o STF está a um passo de “recalibrar” o entendimento atual e ampliar o foro de deputados, senadores, ministros e demais autoridades que cometerem crimes usando a função pública, ainda que tenham deixado o mandato.
O Congresso, no entanto, não está satisfeito com a possibiliade de mudança. A ideia da oposição, por exemplo, é restringir o foro. Para isso, forte articulação tem sido feita dentro das casas Legislativas, Câmara e Senado, a fim de que seja dado prosseguimento à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) do Foro Privilegiado.
Pelo texto legislativo, o foro de prerrogativa, que determina em qual esfera quem ocupa certos cargos deve ser julgado, deve limitado a cinco figuras: ao presidente e ao vice-presidente da República; e aos presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo Tribunal Federal.
Já o voto do ministro Gilmar Mendes, que foi seguido, até agora, por outros quatro ministros prevê que o alcance do foro seja ampliado para abranger também o julgamento de crimes em tribunais específicos mesmo após o fim da ocupação do cargo público. Mesmo em caso de renúncia, não reeleição ou cassação, o processo seria mantido no STF.
Controvérsia
Em 2018, com o argumento de reduzir o volume de processos na Corte, os ministros decidiram que deveriam tramitar no STF apenas processos de deputados, senadores, ministros de Estado e outras autoridades que supostamente tivessem cometido crimes no exercício do mandato e relacionados a ele.
No entanto, o ministro Gilmar Mendes retomou a discussão ao entrar com recurso em caso específico. Gilmar alegou que o foro privilegiado como está hoje “reduz indevidamente o alcance da prerrogativa de foro, distorcendo seus fundamentos e frustrando o atendimento dos fins perseguidos pelo legislador”.
O ministro propõe a ampliação do entendimento como relator de habeas corpus do senador Zequinha Marinho (Podemos-PA). O parlamentar é suspeito de ter exigido, a servidores de seu gabinete, o depósito de 5% de seus salários em contas do partido, prática conhecida como “rachadinha”.
O crime começou a ser investigado ainda em 2013, quando Marinho era deputado federal. Depois, Marinho foi eleito vice-governador do Pará e, em seguida, senador, cargo que ocupa atualmente.
Ao longo desse período, o processo foi mudando de competência de acordo com o cargo ocupado ao longo desses 11 anos. O senador deseja que o caso permaneça no Supremo, uma vez que recuperou o foro privilegiado ao ter se elegido para o Congresso novamente. Assim, Gilmar Mendes fez a proposta de ampliar o foro.
“Considerando a dimensão da controvérsia discutida nesta demanda, que pode recalibrar os contornos do foro por prerrogativa de função”, justificou o ministro, no recurso que assina.
Quando estava em 5 a 0, o julgamento foi suspenso após um pedido de vista de Luís Roberto Barroso, presidente do STF. A retomada do julgamento virtual será no dia 12 de abril.
Além de Gilmar Mendes, já votaram no sentido de ampliar os foro os ministros Dias Toffoli, Flávio Dino, Cristiano Zanin e Alexandre de Moraes.
Oposição cobra Lira
A discussão sobre o fim do foro privilegiado no Congresso Nacional é antiga. Em 2017, o Senado Federal aprovou a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) nº 333/17, do então senador Álvaro Dias (PSDB-PR), para extinguir o foro por prerrogativa de função nos casos de crimes comuns.
A matéria sugere o fim do foro privilegiado em caso de crimes contra deputados, senadores, ministros de estado, governadores, ministros de tribunais superiores, desembargadores, embaixadores, comandantes militares, integrantes de tribunais regionais federais, juízes federais e outras autoridades.
O texto foi encaminhado à Câmara em 2017 e não teve movimentações desde então. No entanto, em janeiro deste ano, a oposição pediu que a análise da PEC seja retomada. O movimento teve como ponto de partida inquéritos do Supremo Tribunal Federal (STF) contra parlamentares da oposição.
Entre os alvos estão o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ), ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin), investigado por operar um equema ilegal de espionagem; e o deputado Carlos Jordy (PL-RJ), investigado por envolvimento nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro.
No começo deste ano, o líder da oposição no Senado, Rogério Marinho (PL-RN), cobrou ação articulada entre os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para debater o tema.
O grupo acredita que o foro privilegiado é um mecanismo que dá “muito poder” à Suprema Corte.
Após a retomada do julgamento sobre o tema no STF, o Congresso voltou a se mobilizar. A expectativa é de que o tema ganhe novos desdobramentos. Na próxima terça-feira (9/4), Lira deve reunir líderes partidários em reunião na Residência Oficial da presidência da Câmara. A PEC deve estar entre os temas discutidos. Lira quer ouvir a opinião das bancadas sobre a pauta e, caso decida pautar o tema, a expectativa é de que o texto esteja em consenso com o Senado Federal.
Imparcialidade
O especialista em direito penal Oberdan Costa explica o foro por prerrogativa de função serve para fornecer julgadores colegiados mais experientes para julgar pessoas que ocupam cargos de interesse do povo, eleitos ou não, “já que as próprias estruturas do Estado podem restar abaladas se os ocupantes desse cargo forem erroneamente punidos”.
Para ele, o foro “evita que juízes de primeiro grau, sozinhos, deixem preferências pessoais decidirem sobre, por exemplo, políticos nacionalmente conhecidos, com milhares de admiradores e de opositores. Os tribunais seriam, em teoria, tanto mais imparciais quanto mais fiscalizáveis do que juízes sozinhos”, diz o advogado.
Conforme Oberdan Costa, uma das funções do foro por prerrogativa é preservar a liberdade dos ocupantes do cargo de tomarem decisões impopulares.
Com informações do Metrópoles
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