Um estudo realizado pelos pesquisadores Miguel Lago, Fernando Falbel e Rudi Rocha e publicado pela Folha de S. Paulo descobriu uma correlação entre estados e municípios que mais votaram em Jair Bolsonaro em 2018 e a aceleração da taxa de mortalidade pela covid 19.
Eles explicam:
“Extraímos o número de óbitos diários por Covid por município e estado até 28 de março de 2021.
Para medir a aceleração do número de óbitos, calculamos primeiramente a média diária de óbitos ao longo de 2020, a partir da data do primeiro óbito por local, e também a média diária de óbitos no ano de 2021, até o dia 28 de março.
Medimos a aceleração de óbitos como a variação percentual, por local, destas duas médias diárias.
Além disso, analisamos a evolução da média móvel de sete dias de óbitos, tanto novos óbitos diários quanto totais, acumulados.
Para medir a adesão ao distanciamento social em estados e municípios, usamos o Índice de Isolamento Social (IIS) ao nível municipal e estadual desenvolvido pela In Loco, uma companhia de tecnologia.
Este índice consiste no percentual de indivíduos naquele município ou estado que permaneceram em casa por dia, coletado a partir de aplicativos de dispositivos móveis e disponibilizados de forma anonimizada.
Especificamente, calculamos as médias mensais do nível de isolamento por local, e comparamos então as médias de março de 2021 e a de fevereiro de 2020, primeiro mês da amostra e único anterior à pandemia.
Utilizamos dados das eleições presidenciais de 2018 disponibilizados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) em nível municipal.
Assim como em Ajzenmann et al. (2020), calculamos o percentual de votos válidos em Jair Bolsonaro no primeiro turno por município e também o agregamos por estado.
A “figura 2” (abaixo) apresenta a aceleração da média diária de mortes por Covid-19 em 2021 frente à de 2020 —para municípios, capitais e estados, respectivamente— vis-à-vis o percentual de votos em Jair Bolsonaro no primeiro turno das eleições de 2018.
Nos três níveis de análise, nota-se uma correlação positiva entre o percentual de votos em Bolsonaro e a aceleração de óbitos em 2021.
Também podemos perceber o contraste entre municípios das regiões Sul e Nordeste: por um lado, a primeira apresentou os maiores percentuais de votos em Jair Bolsonaro, bem como as maiores taxas de aceleração de óbitos; por outro, a segunda exibiu os menores percentuais de votos em Jair Bolsonaro, bem como as menores taxas de aceleração de óbitos.
O caso das capitais não é diferente, como descrito no segundo gráfico da “figura 2”.
Aquelas com maior proporção de votos em Bolsonaro apresentam as maiores taxas de aceleração de óbitos em 2021 frente à média de 2020.
Tomemos o caso de Boa Vista (RR): trata-se da capital com o segundo maior percentual de votos em Bolsonaro (69,3%) e a quinta colocada no que se refere à taxa de aceleração de óbitos (134,8%).
Já São Luis (MA) contabilizou o quarto menor percentual de votos em Bolsonaro (36,6%), bem como a segunda menor taxa de aceleração, com uma queda de 21% na média de 2021.
No último painel da “figura 2”, podemos observar o caso dos estados.
No Piauí, por exemplo, estado com menor percentual de votos em Bolsonaro no primeiro turno (18,8%), a taxa de aceleração de óbitos é uma das mais baixas (34,6%).
Em Santa Catarina, por outro lado, Bolsonaro recebeu 65,8% dos votos válidos no primeiro turno —trata-se do estado que proporcionalmente mais votou em Jair Bolsonaro no primeiro turno— e a taxa de aceleração de óbitos superou 200% em 2021.
Em seguida nos voltamos ao distanciamento social, como possível mecanismo por trás desta correlação.
A “figura 3” (abaixo) descreve como o apoio a Bolsonaro está relacionado ao distanciamento social.
De forma similar aos resultados de Ajzenmann et al. (2020), verificamos que quanto maior o apoio a Jair Bolsonaro, menor o índice de distanciamento social no estado frente à média de fevereiro de 2020, anterior à pandemia.
Novamente percebemos as regiões Sul e Nordeste em situações bastante distintas: municípios do Nordeste apresentaram em março de 2021 níveis de distanciamento social mais elevado, em relação a antes da pandemia, enquanto os do Sul registraram níveis mais baixos, assim como os do Sudeste.
Para fins de comparação, o Brasil registrou uma média de 29,9% de distanciamento em fevereiro de 2020 e de 37,8% em março de 2021 —uma diferença de 8 pontos percentuais.
Figura 3. Percentual de votos em Bolsonaro e distanciamento social
Ainda que o presente trabalho tenha caráter descritivo, os resultados indicam a existência de uma relação positiva entre apoio eleitoral ao presidente e a aceleração da mortalidade por Covid-19 em 2021 no Brasil.
A mortalidade tem acelerado exatamente nos estados e municípios que mais votaram em Bolsonaro em 2018 e onde o distanciamento social tem sido menor —portanto, em lugares mais alinhados e suscetíveis à retórica do presidente.
Neste sentido, apoio político e eleitoral a Bolsonaro têm correlação direta com mortalidade: mais votos, menos vidas.”
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