O que aconteceu de 2015 até agora é quase tão absurdo quanto a ruptura da barragem. Foram mais de 250 reuniões sem resultados para as famílias, segundo o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB)
Área afetada pelo rompimento de barragem no distrito de Bento Rodrigues, zona rural de Mariana, em Minas Gerais
Há exatos oito anos, no dia 5 de novembro de 2015, acontecia em Mariana (MG) um dos maiores crimes ambientais do mundo. O rompimento da barragem de Fundão, da mineradora Samarco, controlada pelas empresas Vale e BHP Billiton, provocou a morte de 19 pessoas e um aborto, deixou 350 famílias sem casas e atingiu mais de um milhão de pessoas em 46 municípios de Minas Gerais e Espírito Santo.
O episódio trágico também destruiu 1.469 hectares de vegetação e contaminou mais de 700 km do Rio Doce e 300 km do litoral capixaba com cerca de 60 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério. Apesar dos impactos ambientais e socioeconômicos gigantescos, os crimes até hoje seguem impunes.
Mas o que aconteceu de 2015 até agora é quase tão absurdo quanto a ruptura da barragem. Foram mais de 250 reuniões sem resultados para as famílias, segundo o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).
Negociações entre governos de Minas e Espírito Santo e Ministério Público foram encerradas ano passado sem acordo de indenização. Samarco, Vale e a BHP Billiton se recusaram a pagar valores requeridos pelo Conselho Nacional de Justiça e se negaram a pagar indenização de danos futuros do desastre.
Nesses oito anos de disputa judicial, das 350 famílias que viram suas casas desaparecerem na lama, 262 sequer tem um prazo para receber suas novas moradias. Pelo menos 55 pessoas já morreram sem ter suas casas reconstruídas, segundo o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).
A realidade mostra que as 88 famílias que receberam suas casas estão em condições precárias de vida. Os atingidos apontam que a nova comunidade de Bento Rodrigues é um grande canteiro de obras, com máquinas, poeira e casas que já estão apresentando muitos problemas de estrutura, conforme divulgado pelo site do MAB.
E a cada ano o pesadelo se renova para os moradores das regiões atingidas com a contaminação com metais pesados que acontece na época das cheias, acabando com a pesca, com a agricultura familiar e destruindo comunidades tradicionais.
“Oito anos depois não tem o que explicar a não ser a má fé das empresas”, apontou Joceli Andrioli, um dos coordenadores do MAB em entrevista ao Jornal PT Brasil dia 22 de setembro. Com seu poder econômico, as mineradoras têm influência muito grande no judiciário brasileiro. “Tanto que até agora ninguém foi condenado, ninguém foi preso por causa desse massacre em Brumadinho e Mariana”, denunciou.
Diante desse cenário, os atingidos resolveram entrar com ação em Londres. São quase 700 mil pessoas, 46 municípios e mais de 2500 empresas, entidades e igrejas reivindicando o direito à reparação. “É uma ação inédita no mundo, uma das maiores e que foi aceita pelo judiciário da Inglaterra, visto que a BHP Billiton tem a sede lá, ela tem uma filial aqui que remete os lucros”, explicou Andrioli.
A Vale também está no processo com julgamento marcado para outubro de 2024. Há expectativa de condenação dos responsáveis fora do Brasil, o que será um aviso às transnacionais, segundo Andrioli, que afirmou que o Brasil não pode ser uma colônia que as empresas fazem o que querem e cometem crime sem pagar a conta.
UFMG atesta grave abalo da saúde mental dos atingidos
A dor dos sobreviventes diante da injustiça e da perda de suas casas leva muitos à depressão. Um estudo realizado pela Universidade Federal de Minhas Gerais (UFMG) revelou que a doença atinge cinco vezes mais os ex-moradores de Bento Rodrigues do que a média da população brasileira.
O transtorno de estresse pós-traumático é 12 vezes maior do que a média da América Latina e a ocorrência de estresse pós-traumático tem índice de 82% de crianças e adolescentes afetados diretamente pelo desastre. Já o transtorno de ansiedade generalizada foi diagnosticado em 32% dos entrevistados, prevalência três vezes maior que a média brasileira, diz o estudo.
“Entre os que continuam sem reparação, muitos desenvolveram doenças psíquicas e assistem às disputas na justiça sem direito à participação na construção do novo acordo de reparação”, afirma Letícia Oliveira, da coordenação do MAB. “Há estudos que mostram que muita gente está com metal pesado no sangue, fruto desse crime. A situação das famílias oito anos depois é de extremo abandono”, relatou Andrioli.
‘Revida’ denuncia omissão e propagandas enganosas das mineradoras
A campanha ‘Revida Mariana – Justiça para limpar essa lama’, foi lançada em setembro com apoio de mais de 100 entidades nacionais e internacionais com uma série de peças e vídeos produzidos para as redes sociais, imprensa e formadores de opinião com “histórias do maior desastre socioambiental do país”, diz o site www.revida.com.br
Os vídeos podem ser baixados e compartilhados e trazem depoimentos que mostram o sofrimento de quem perdeu tudo. A campanha se contrapõe à Fundação Renova, criada pelas mineradoras para reparação dos danos mas que, além de não produzir resultados à altura das necessidades das vítimas, aparece em “propagandas caras em horário nobre na principal rede de televisão” e que causam indignação nos atingidos, conforme publicado no artigo “Crime da Vale em Mariana: muita propaganda, mas nenhuma casa”, no site Brasil de Fato.
“As empresas criaram um esquema de propaganda para dizer que está tudo bem, que está tudo feito, que já indenizou todo mundo e isso é mentira”, denunciou Andrioli, coordenador do Movimento Revida.
Luta por direitos acontece neste fim de semana em Brasília
A Jornada de Lutas do MAB pela garantia de direitos e reparação para as vítimas das barragens em todo o país começa neste sábado, 4, até 7 de novembro em Brasília, onde devem acampar cerca de 2500 pessoas em caravanas de 22 estados do Brasil. O objetivo é a aprovação da Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB) para que o país tenha um marco regulatório que garanta os direitos dos atingidos por barragens.
“A aprovação da PNAB é reconhecer que os atingidos são sujeitos de direito. Ainda não somos porque estamos à mercê da vontade das empresas mineradoras. A PNAB é importante demais também porque cria mecanismos de responsabilização”, ressaltou Maria José Sodré, uma das coordenadoras do MAB em entrevista ao Jornal PT Brasil dia 01 de novembro.
Com informações do PT Org
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