Especialistas alegam que, apesar de o Brasil ser um país sem histórico de conflitos, tema não pode ser ignorado no debate da PEC das Praias
A proposta de emenda à Constituição (PEC) que pretende retirar da União áreas litorâneas e transferi-las para o controle de estados e municípios tem ignorado, até o momento, uma das razões pela qual essas regiões foram colocadas sob o guarda-chuva do governo federal: a segurança nacional. Especialistas ouvidos pela coluna pontuaram que haverá risco ao território se o controle sair das mãos da União.
A PEC começou a ser discutida na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado e está sendo relatada pelo senador Flávio Bolsonaro, do PL do Rio de Janeiro.
De acordo com o advogado Antônio Carlos de Freitas, mestre em direito constitucional pela USP, a regra determina que terrenos em até 33 metros, contados a partir da faixa da água, pertencem à União. Ele diz que a lei, criada ainda na época do Império, levou em consideração apenas o interesse da defesa nacional, uma preocupação que, segundo outros especialistas, ainda se mantém atual.
Apesar de a legislação ser antiga e o Brasil ser um país sem histórico recente de guerras, o professor de geopolítica da Escola Superior de Guerra Ronaldo Carmona lembrou que desembarques por litoral são usados em confrontos modernos. A faixa de 33 metros, segundo ele, é o tamanho ideal para o deslocamento de tropas.
“Do ponto de vista atual, essa faixa continua sendo fundamental para a defesa nacional. Hoje, as guerras modernas não fizeram retroceder a importância dos desembarques anfíbios dentro das estratégias de guerra. Na guerra da Ucrânia, vimos os desembarques anfíbios. E não por acaso mais de uma centena de países mantêm corpos de fuzileiros navais ativos, que são o instrumento prioritário para esse tipo de guerra”, explicou Carmona, que não vê como desassociar o interesse da defesa nacional da discussão da PEC.
A professora Danielle Ayres, diretora do Núcleo de Pesquisa em Política Internacional, Segurança e Defesa da Universidade Federal de Santa Catarina, acredita que a maior preocupação na discussão da PEC é a ambiental. Mas concorda que é essencial que o controle da região seja da União para garantir a soberania em casos de conflitos.
“Como o Brasil tradicionalmente nos últimos anos não é um país com conflitos armados inerentes na sua região, de fato isso tem uma proporção menor na comparação com a questão ambiental, mas o Estado pode ser atacado, então é importante ter controle sobre essa área para garantir soberania frente a conflitos que possam surgir”, defendeu.
PEC das Praias versus segurança nacional
Doutora em estudos estratégicos da defesa e segurança pela Universidade Federal Fluminense (UFF), Carolina Ambinder lembrou que o conceito de segurança nacional é amplo e engloba tanto a integridade do território quanto da população. Ou seja, uma vez que o acesso a espaços públicos pode ser dificultado, a proteção do território e da população também pode ser prejudicada.
Procurada, a Marinha informou que “o debate em torno da proposta de emenda constitucional nº 03/2022, que prevê a transferência de domínio da faixa costeira, é essencial para compreender o valor dos terrenos de marinha”. “Essas áreas são pilares essenciais para a defesa da soberania nacional, o desenvolvimento econômico e a proteção do meio ambiente, tendo em vista a diversidade de ecossistemas, a importância das atividades econômicas relacionadas aos ambientes marinho e fluviolacustre (que diz respeito aos rios e lagos), além da necessária proteção de 8.500 km de litoral”, disse a nota.
Com informações do Metrópoles
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