Cristiane Sampaio, Brasil de Fato – As articulações em torno da compra de uma vacina contra a covid-19 para a população brasileira se intensificaram nesta terça-feira (3), em Brasília (DF). Em reunião com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), governadores das cinco regiões do país reforçaram o coro pela necessidade de aquisição de um imunizante que possa proteger as pessoas do novo coronavírus e ajudar na retomada econômica.
Na sequência, eles foram recebidos também pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), após uma solicitação do coordenador do Fórum de Governadores do Brasil e governador do Piauí, Wellington Dias (PT).
“A defesa que nós governadores fazemos — e, digo aqui, também as entidades dos municípios – é de que a primeira vacina que tiver autorização, que tiver aprovação científica é ela que o Brasil tem que adotar. Se a vacina é feita no Butantan ou na Fiocruz, se ela foi desenvolvida nesse ou naquele país, neste instante isso é irrelevante em relação à principal prioridade, que é salvar vidas”, afirmou Dias.
Na pauta, os governadores debatem atualmente com o Congresso a Medida Provisória (MP) 994/20, que libera um crédito de quase R$ 1,995 bilhão para a compra de tecnologias e a fabricação de uma vacina contra a covid-19. “A discussão passa pela Câmara e pelo Senado na definição dos valores e também de uma parte das regras”, disse Wellington Dias nesta terça, ao afirmar ainda que a medida pode assegurar os recursos necessários para o Plano Nacional de Imunização em relação à covid-19.
A companhia AstraZeneca, por exemplo, desenvolve um produto em parceria com a Universidade de Oxford, do Reino Unido. O imunizante está entre as principais expectativas de vacina para o Brasil, onde a substância pode ser fabricada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz).
Paralelamente, as negociações políticas envolviam também a CoronaVac, produzida pelo laboratório chinês Sinovac, mas o produto foi vetado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), que rejeita a China por motivos ideológicos e doutrinários. O mandatário chegou a chamar o imunizante de “vacina chinesa de João Doria”, em referência ao governador de São Paulo, com quem alimenta rixas políticas permanentes.
Além de Doria e outros governadores, entidades civis e autoridades que acompanham o desenrolar da produção das vacinas têm feito coro pela importância da aquisição da substância. Nesta terça (3), por exemplo, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) expediu uma recomendação no sentido de que o país adote medidas capazes de garantir o acesso à imunização contra o novo coronavírus.
O documento pede ao governo Bolsonaro que “cumpra o disposto nos compromissos internacionais assumidos e acordados, que evidencie para além do compromisso com a saúde no Brasil, o envolvimento com a saúde mundial, buscando parcerias adequadas e viáveis, científicas e tecnológicas, de forma tal que reflexos negativos para o Brasil possam ser eliminados ou minimizados, tanto na relação social quanto econômica”.
A recomendação se dirige ainda aos Poderes Legislativo e Judiciário pedindo que “sejam tomadas as providências cabíveis para proteger a população brasileira de decisões da Presidência da República baseadas em crenças ideológicas”, entre outras coisas. Ao Ministério da Saúde, o CNS pede uma série de providências relacionadas à compra da vacina e à garantia de uma cobertura vacinal contra a convid-19.
Resistência
O movimento dos governadores contrasta com a resistência de Bolsonaro em acelerar o debate sobre os trâmites relacionados à aquisição da substância. No último dia 26, por exemplo, o presidente chegou a criticar a corrida em torno da produção da vacina, que mobiliza laboratórios e diferentes atores políticos em todo o mundo. Diversas companhias farmacêuticas estão com o imunizante em fase de estudo.
“Todo mundo diz que a vacina que menos demorou até hoje foram quatro anos. Eu não sei por que correr em cima dessa”, ironizou Bolsonaro, sem mencionar a quantidade de mortos e infectados no país. O Brasil já soma mais de 160 mil óbitos provocados pela doença e ultrapassa a marca de 5,5 milhões de pessoas contaminadas.
Com a pandemia em descontrole e a resistência do presidente em agilizar a compra de uma vacina, não só os governadores intensificam a pressão e se unem ao Legislativo, mas também começam a surgir propostas que ensaiam a construção de outras possibilidades. É o caso do Projeto de Lei (PL) 5017/2020, que prevê a liberação de verbas da União para estados e municípios para que estes possam adquirir vacinas contra a covid-19 por conta própria, desde que a substância seja aprovada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) ou tenha a distribuição comercial liberada por autoridades sanitárias estrangeiras de referência.
De autoria do líder do PSB, Alessandro Molon (RJ), a proposta prevê a destinação de R$ 2,6 bilhões por parte do governo federal ainda este ano para que se possa garantir a compra da substância no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).
“Bolsonaro continua espalhando paranoia e desinformação enquanto a pandemia do coronavírus devasta a vida de milhões de brasileiros. É necessário criar mecanismos pra garantir que os estados não fiquem reféns dos desmandos e da irresponsabilidade do presidente da República e tenham condições de vencer a covid-19”, afirma o deputado.
O projeto também altera a Lei 13.979, de 2020, para permitir aos estados a compra, a importação e a distribuição de vacinas, iniciativas que hoje são liberadas apenas para o governo federal. Pelo PL, o dinheiro para a aquisição dos produtos viria na forma de um auxílio financeiro e seria liberado a partir da abertura de créditos extraordinários. A proposta prevê a devolução da verba para a União em caso de não utilização por parte dos estados e municípios. A medida não tem previsão de votação na Câmara dos Deputados.
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