Não se trata aqui de reproduzir o discurso do tio bolsonarista que chama de “alienado” e “cria do demônio” quem está acompanhando o Big Brother. Mas sim de parar de romantizar esse programa e ver como essa emissora está se aproveitando da enorme ânsia da juventude de discutir política, antirracismo e feminismo, só que apresentando essas questões (que são ultraprofundas) de forma absolutamente rebaixada, torta e pautada na prática do cancelamento. Análise a partir do livro “Rituais de sofrimento”, de Silvia Viana.
Desde o anúncio dos participantes, vimos a enorme repercussão nas redes, e até mesmo em sites do progressismo, apontando como uma vitória do movimento antirracista a questão de metade dos participantes da casa serem negros, no sentido de comemorar o fato de que isso fomenta na população uma discussão sobre antirracismo. Não vou entrar aqui nos meandros de cada discussão que ocorreu na tal “casa mais vigiada do país”, mas nem é preciso aprofundar muito para ver que esse anseio não foi correspondido, pelo contrário.
Na verdade, para a população, o que realmente tem se mostrado no programa é uma visão torta de que ser militante feminista e antirracista é “cancelar”. Em vez de reforçar a importância da luta contra o racismo e o patriarcado que é travada há centenas de anos por milhares de guerreiras e guerreiros negros e seus aliados brancos ao longo da história, na realidade o Big Brother tem feito com que milhões de espectadores achem que “militar” é isso: é questionar cada microatitude mas sem questionar em nada a raiz dessa atitude, e portanto, não resolver em nada o micro nem o macro; ou com que se pense que “militar” é sair por aí eliminando um e outro até que restem só os poucos e bons “desconstruídos”, sem mudar efetivamente nada no problema estrutural que gera as opressões.
Muitos que estão despertando sua consciência política agora, podem tirar dessa suposta ideia de “militância” a conclusão de que atuar politicamente, ser um ativista político contra esse sistema de opressão e exploração, é na verdade essa coisa ridícula (“tóxica” como se tem dito muito por aí), e que o melhor é viver a vida sem pensar politicamente. Ou seja, em vez de reforçar nossa luta, esse tipo de programa só nos enfraquece.
E o problema não está só no fato de que as pessoas escolhidas para representar essa luta no BBB não foram corretas, mas sim na própria estrutura do programa. No livro “Rituais de Sofrimento”, Silvia Viana traz uma análise sobre como a estrutura de realities shows como o Big Brother reproduzem a mesma forma que a vida produtiva sob o capitalismo e nos mostra o que ela chama de “real falsificado”. Enquanto Boninho defende que o programa apenas aflora a verdadeira essência humana, Viana vai discutir como na verdade com seus jogos de tortura, provas de resistência, deixando sem cama, sem comida, em meio a fofocas, intrigas, isolamentos, festas fúteis e muita edição e efeitos especiais, cria-se todo um ambiente de competição que repõe o sistema em que vivemos. Nas palavras dela, “Realities shows não simulam o mundo vivido, eles o repõem. Pois efeitos especiais também costuram nosso cotidiano e também aí agimos como se fossem reais: nós disputamos, eles selecionam”.
É isso que os realities vendem: a competição entre os “brothers”, a “estratégia” pra se dar bem no jogo, pensar em si acima de tudo, fazer amizade por conveniência, ser proativo… Tudo isso é “real”, acontece aqui fora também. Mas acontece exatamente porque somos bombardeados de ideologia burguesa que diz que essa é a conduta certa a se seguir, é a “essência do ser humano”, que se você não segue está de “fora do jogo”. Só que essa não é nossa essência, é a essência do capitalismo.
Só porque agora as polêmicas do BBB são mais entre “feministas” e “machistas”, “antirracistas” e “racistas” e não entre quem pegou quem, isso não significa que a essência do programa mudou. Significa só um novo ângulo de marketing que vai trazer audiência e de quebra levar uma discussão rebaixadíssima sobre o que supostamente seria o feminismo e o antirracismo pra a população.
Traduzindo de forma boba: se fizéssemos um BBB com Marx, Zumbi dos Palmares, Rosa Luxemburgo, Aqualtune, Trotski e outros grandes revolucionários negros e brancos de todos os tempos, ainda assim seria problemático porque a questão não é apenas os jogadores, mas o próprio jogo. Na verdade, imagino que esses revolucionários tomariam o poder do programa para acabar com ele (num lance meio Jogos Vorazes talvez?). Brincadeiras à parte, com certeza em vez de fazerem parte e reforçarem esse tipo de programa, eles estariam buscando organizar a nossa classe, os trabalhadores e trabalhadoras, que são em sua maioria mulheres, negros e negras, imigrantes, que sofrem na pele todos os dias as mazelas da opressão e da exploração. Estariam nas fábricas, escolas, universidades, telemarketings e tantos outros locais de trabalho organizando a luta destes trabalhadores contra os ataques dos patrões e o racismo e o patriarcado, que são sustentados pelo capitalismo, a quem é extremamente vantajoso lucrar mais rebaixando salários e direitos das mulheres negras, as colocando como inferiores, controlando seus corpos… A razão histórica dessas opressões, a estrutura de onde emanam, é essa. Se organizar para lutar contra isso precisa ser nosso papel.
O que a Globo está fazendo é se aproveitar da enorme ânsia da juventude de discutir política, antirracismo e feminismo, só que apresentando essas questões (que são ultraprofundas) de forma absolutamente rebaixada, torta e pautada na prática do cancelamento. No limite, estão desviando as forças de uma batalha contra as opressões e o conservadorismo, contra Bolsonaro e Mourão e todos os demagogos como Dória. Uma luta que deveria estar acontecendo nas ruas e nos locais de trabalho (com os métodos da classe trabalhadora de greves, manifestações, etc.). Fazem isso se aproveitando inclusive da enorme paralisia de partidos como o PT e os sindicatos que dirige, como a CUT, que deveriam estar organizando essa batalha, entretanto apostam todas as cartas em uma saída institucional e parlamentar contra o Bolsonaro, através de um impeachment que ameaça colocar Mourão, um militar (!), na presidência. É urgente rompermos com essa lógica e unificarmos nossas forças para exigir que não mudemos só as peças, mas sim todas as regras desse jogo.
Para saber mais: A Revolução e o Negro.
Ps: deixo aqui um vídeo clássico em que Boninho, diretor do Big Brother, junto com outras socialites, mostra seu hobbie, que é jogar ovos da janela de seus apartamentos na cabeça da população que passa na rua. No vídeo, Boninho afirma que “adora acertar uma vagabunda”. Bastante ilustrativo.
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