O ministro da Justiça, Sergio Moro, divulgou, através do Ministério da Justiça, uma nota nesta sexta-feira (5) em resposta à reportagem de capa da revista Veja, realizada em parceria com The Intercept Brasil, e que corrobora às acusações de que, quando juiz, Moro atuou como chefe da força-tarefa da Lava Jato.
Na tentativa de se defender, o ministro acabou confirmando mais uma vez que trocou mensagens com procuradores. Ao mesmo tempo em que o Ministério da Justiça chama as revelações de “supostas mensagens obtidas por meios criminosos”, alega também que elas “podem ter sido adulteradas total ou parcialmente”.
Moro ainda reclama do fato de a Veja ter se recusado a encaminhar cópia das mensagens antes da publicação, e que a revista lhe impôs, como condição, a concessão de uma entrevista antes de divulgar a matéria.
Ao final da reportagem, a redação da Veja disse que procurou o coordenador da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, e Moro. “Ambos gostariam que os arquivos fossem enviados a eles de forma virtual, mas, alegando compromissos de agenda, recusaram-se a recebê-los pessoalmente, uma condição estabelecida por VEJA”.
O Ministério da Justiça prossegue na nota oficial defendendo Moro de cinco acusações levantadas pela reportagem. A primeira delas é sobre uma mensagem do então juiz para Dallagnol, em 17 de dezembro de 2015. A matéria Veja/Intercept aponta que Moro acelerou o MPF ao dizer que precisava da manifestação dos procuradores, no pedido de revogação da prisão preventiva do pecuarista José Carlos Bumlai, “até amanhã meio dia”.
“A prisão preventiva de José Carlos Bumlai foi decretada em 19 de novembro de 2015. Houve pedido de revogação da prisão ao final do mês de dezembro. O recesso Judiciário inicia em 19 de dezembro. Então, a manifestação do Ministério Público era necessária, como é em pedidos da espécie, para decidir o pedido da defesa”, confirma o Ministério da Justiça a troca de mensagens, dizendo, entretanto, não se tratar de “quebra de parcialidade”. Ao mesmo tempo, a pasta aponta o diálogo como “suposta mensagem na qual [Moro] teria solicitado manifestação urgente do Ministério Público”.
Em seguida, o MJ nega que o então juiz quebrou sua parcialidade “por suposta mensagem de terceiros” no caso da denúncia do MPF contra Zwi Skornicki e Eduardo Musa.
O diálogo em questão, segundo Veja/Intercept, aconteceu no dia 28 de abril de 2016, quando Moro orientou os procuradores para tornarem mais robusta uma peça. Depois de conversar com o então juiz, Dallagnol avisou à procuradora Laura Tessler que Moro alertou sobre a falta de uma informação na denúncia de Zwi Skornicki, representante do estaleiro Keppel Fels, que tinha contratos com a Petrobras para a construção de plataformas, e virou réu de uma das ações da Lava Jato sob a acusação de operar propinas. Skornicki tornou-se delator na Lava-Jato depois de confessar o crime envolvendo outros funcionários da Petrobras, entre eles Eduardo Musa.
“Laura no caso do Zwi, Moro disse que tem um depósito em favor do Musa e se for por lapso que não foi incluído ele disse que vai receber amanhã e da tempo. Só é bom avisar ele”, escreveu Dallagnol. No dia seguinte, em 29 de abril de 2016, o MPF incluiu um comprovante de depósito de 80 mil dólares feito por Skornicki. Em seguida, e no mesmo dia, Moro aceitou a denúncia e mencionou o documento na sua decisão. “Ou seja: ele claramente ajudou um dos lados do processo a fortalecer sua posição”, escreveu a reportagem
Na nota, o Ministério da Justiça (Moro) rebate: “Não tem o ministro como confirmar ou responder pelo conteúdo de suposta mensagem entre terceiros. De todo modo, caso a Veja tivesse ouvido o ministro ou checado os fatos saberia que a acusação relativa ao depósito de USD 80 mil, de 7 de novembro de 2011, e que foi incluído no aditamento da denúncia em questão, não foi reconhecido como crime na sentença proferida pelo então juiz em 2 de fevereiro de 2017, sendo ambos absolvidos deste fato”, assim, conclui o ministro, a absolvição revelaria por si só “a falsidade da afirmação da existência de conluio entre o juiz e procuradores ou quebra de parcialidade”.
Moro também se defende sobre a acusação de que teria “escondido fatos” do ministro Teori Zavascki. O caso em questão é relacionado a Operação Radioatividade, sobre pagamento de propinas feitas pela Andrade Gutierrez, durante a construção da usina de Angra 3.
A reportagem conta que o ministro do STF, Teori Zavascki, recebeu uma reclamação da defesa de Flávio David Barra (ex-presidente da AG Energia, do grupo Andrade Gutierrez), em 25 de agosto de 2015, de que Moro não tinha competência para julgar o caso porque havia indícios do envolvimento de parlamentares. Por conta do foro privilegiado, a Corte é que deveria julgar os casos. Zavascki cobrou explicações do então juiz da 13ª Vara de Curitiba e este (no caso Moro) negou saber sobre o envolvimento de parlamentares.
Veja/Intercept mostram ainda que, dezoito dias depois, em uma conversa com o procurador Athayde Ribeiro Costa, a delegada Erika Marena, da Polícia Federal, disse que havia sido orientada pelo juiz para não ter pressa em protocolar no processo uma planilha que tinha o nome de políticos envolvidos.
Em nota, Moro confirma que prestou esclarecimentos ao STF em 17 de setembro de 2015, “tendo afirmado que naquela data não dispunha de qualquer informação sobre o registro de pagamentos a autoridades com foro privilegiado.” Sobre a acusação da reportagem de que, dezoito dias depois (em 23 de outubro de 2015), a conversa entre a delegada Marena e o procurador Ribeiro Costa confirmava que ele tinha conhecimento do envolvimento de parlamentares, o Ministério da Justiça disse que “não há qualquer elemento que ateste a autenticidade das supostas mensagens ou no sentido de que o então juiz tivesse conhecimento da referida planilha mais de 30 dias antes”.
O MJ afirma também que Moro não obstruiu o processo para um acordo de colaboração premiada entre o ex-deputado Eduardo Cunha e o MPF. “O ocorre (sic) que eventual colaboração de Eduardo Cunha, por envolver supostos pagamentos a autoridades de foro privilegiado, jamais tramitou na 13ª Vara de Curitiba ou esteve sob a responsabilidade do ministro, então juiz”
A matéria de Veja/Intercept mostra que Moro entrou em contato com Dallagnol após rumores de que o MPF iria fechar um acordo de delação premiada com o ex-deputado. “Espero que não procedam [com o acordo]”, disse o então juiz.
Por fim, o Ministério da Justiça diz que o chefe nunca interferiu na definição de datas da Lava Jato “para operações de cumprimento de mandados de prisão ou busca e apreensão”.
“Ocorre que, quando se discutem datas de operações, trata-se do cumprimento de decisões judiciais já tomadas, sendo necessário que, em grandes investigações, como a Lava Jato, haja planejamento para sua execução, evitando, por exemplo, a sua realização próxima ou no recesso Judiciário”, acabou confirmando a pasta. (Do GGN)
Veja a nota na íntegra
Brasília, 05/07/2019 – Sobre a reportagem da Revista Veja:
O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, não reconhece a autenticidade de supostas mensagens obtidas por meios criminosos e que podem ter sido adulteradas total ou parcialmente. Lamenta-se que a Revista Veja se recusou a encaminhar cópia das mensagens antes da publicação e tenha condicionado a apresentação das supostas mensagens à concessão de uma entrevista, o que é impróprio. De todo modo, alguns esclarecimentos objetivos:
1 – Acusa a Veja o ministro, então juiz, de quebra de parcialidade por suposta mensagem na qual teria solicitado manifestação urgente do Ministério Público para decidir sobre pedido de revogação de prisão preventiva de José Carlos Bumlai. A prisão preventiva de José Carlos Bumlai foi decretada em 19 de novembro de 2015. Houve pedido de revogação da prisão ao final do mês de dezembro. O recesso Judiciário inicia em 19 de dezembro. Então, a manifestação do Ministério Público era necessária, como é em pedidos da espécie, para decidir o pedido da defesa. A urgência decorre da natureza de pedido da espécie e, no caso em particular, pela proximidade do recesso Judiciário que se iniciaria em 19 de dezembro. Então, a solicitação de urgência, se autêntica a mensagem, teria sido feita em benefício do acusado e não o contrário. Saliente-se que o ministro, como juiz, concedeu, em 18 de março de 2016, a José Carlos Bumlai o benefício de prisão domiciliar para tratamento de saúde, o que foi feito em oposição ao MPF. Os fatos podem ser verificados no processo 5056156-95.2015.4.04.7000 da 13ª Vara Federal de Curitiba.
Comentário: neste trecho Sérgio Moro confirma interferência nas ações do Ministério Público – grifo nosso.
2 – Acusa a Veja o ministro, então juiz, de quebra de parcialidade por suposta mensagem de terceiros no sentido de que teria solicitado a inclusão de fato e prova em denúncia do MPF contra Zwi Skornicki e Eduardo Musa na ação penal 5013405-59.2016.4.04.7000. Não tem o ministro como confirmar ou responder pelo conteúdo de suposta mensagem entre terceiros. De todo modo, caso a Veja tivesse ouvido o ministro ou checado os fatos saberia que a acusação relativa ao depósito de USD 80 mil, de 7 de novembro de 2011, e que foi incluído no aditamento da denúncia em questão, não foi reconhecido como crime na sentença proferida pelo então juiz em 2 de fevereiro de 2017, sendo ambos absolvidos deste fato (itens 349 e 424, alínea A e D). A absolvição revela por si só a falsidade da afirmação da existência de conluio entre juiz e procuradores ou de quebra de parcialidade, indicando ainda o caráter fraudulento da suposta mensagem.
Comentário: Pelo contrário, a absolvição pode confirmar também a preocupação do juiz que, apesar de sua interferência, não conseguiu fazer com que o MPF fizesse uma prova robusta capaz da condenação, mas confirma que permitiu a aceitação da denúncia.
3 – Acusa a Veja o ministro, então juiz, de ter escondido fatos do ministro Teori Zavascki em informações prestadas na Reclamação 21802 do Supremo Tribunal Federal e impetrado por Flávio David Barra. Esclareça-se que o então juiz prestou informações ao STF em 17 de setembro de 2015, tendo afirmado que naquela data não dispunha de qualquer informação sobre o registro de pagamentos a autoridades com foro privilegiado. Tal afirmação é verdadeira. A reportagem sugere que o então juiz teria mentido por conta de referência a suposta planilha constante em supostas mensagens de terceiros datadas de 23 de outubro de 2015. Não há qualquer elemento que ateste a autenticidade das supostas mensagens ou no sentido de que o então juiz tivesse conhecimento da referida planilha mais de 30 dias antes. Então, é evidente que o referido elemento probatório só foi disponibilizado supervenientemente e, portanto, que o então juiz jamais mentiu ou ocultou fatos do STF neste episódio ou em qualquer outro.
Comentário: a interferência mostra que ele agiu para esconder os nomes. Sem resposta para essa questão, Moro diz que não “há elemento que ateste a autenticidade das mensagens”. Ou seja, Moro diz que as mensagens são falsas.
4 – Acusa a Veja o ministro, então juiz, de ter obstaculizado acordo de colaboração do MPF com o ex-deputado Eduardo Cunha. O ocorre que eventual colaboração de Eduardo Cunha, por envolver supostos pagamentos a autoridades de foro privilegiado, jamais tramitou na 13ª Vara de Curitiba ou esteve sob a responsabilidade do ministro, então juiz.
Comentário: a resposta de Moro a essa questão mostra sua atuação política muito além da competência da 13ª Vara de Curitiba. Ou seja, aqui Moro não desmente a mensagem e confirma que atuava sorrateiramente interferindo na política nacional, beneficiando um condenado. Faltou dizer que absolveu Cláudia Cruz.
5 – Acusa a Veja o ministro, então juiz, de ter comandado a Operação Lava Jato por conta de interferência ou definição de datas para operações de cumprimento de mandados de prisão ou busca e apreensão. Ocorre que, quando se discutem datas de operações, trata-se do cumprimento de decisões judiciais já tomadas, sendo necessário que, em grandes investigações, como a Lava Jato, haja planejamento para sua execução, evitando, por exemplo, a sua realização próxima ou no recesso Judiciário.
Comentário: aqui Moro não desmente e diz o óbvio ululante: toda ação do MPF precisa de autorização do juiz, mas não é o juiz que define quando e como. Ou seja, ele confirma que ajudava no planejamento das ações do MPF.
O ministro da Justiça e da Segurança Publica sempre foi e será um defensor da liberdade de imprensa. Entretanto, repudia-se com veemência a invasão criminosa dos aparelhos celulares de agentes públicos com o objetivo de invalidar condenações por corrupção ou para impedir a continuidade das investigações. Mais uma vez, não se reconhece a autenticidade das supostas mensagens atribuídas ao então juiz. Repudia-se ainda a divulgação distorcida e sensacionalista de supostas mensagens obtidas por meios criminosos e que podem ter sido adulteradas total ou parcialmente, sem que previamente tenha sido garantido direito de resposta dos envolvidos e sem checagem jornalística cuidadosa dos fatos documentados, o que, se tivesse sido feito, demonstraria a inconsistência e a falsidade da matéria. Aliás, a inconsistência das supostas mensagens com os fatos documentados indica a possibilidade de adulteração do conteúdo total ou parcial delas.
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