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“É algo inacreditável, lamentável, e que, ao vir agora à tona, deixa perplexa não só a comunidade jurídica nacional, mas a sociedade brasileira como um todo. Não são possíveis mais tantos desmandos. Precisamos reagir e acreditar que ainda é possível vivermos num Estado Democrático de Direito”, diz o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, o comentar os abusos da Lava Jato

O advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, condenou duramente os abusos cometidos por Deltan Dallagnol na Lava Jato. “O que é o mais grave, quase humilhante, é ver este senhor, certamente junto com seus asseclas, ter a ousadia de se insurgir contra esposas de Ministros do Supremo. Aqueles Ministros que tiveram a coragem de conceder decisões garantindo direito constitucional não só foram perseguidos em conluio, em compadrio com parte da mídia, como também as suas esposas foram investigadas de forma absolutamente criminosa e vergonhosa”, escreveu. Abaixo, a íntegra de seu artigo:

Basta! “até quando , Catilina, abusarás da nossa paciência , … não vês que tua conspiração foi dominada pelo que a conhecem ? “

Cícero 

Há mais de três anos tenho corrido o país denunciando os inúmeros abusos da força-tarefa da Lava Jato e do chefe dessa força-tarefa, o então juiz Sérgio Moro, hoje Ministro da Justiça. À época, havia relativamente pouco eco ao que eu dizia, pois a imprensa estava contaminada. Mas era interessante notar que, mesmo com o expressivo apoio incondicional da imprensa à operação, em todos os lugares nos quais estive as minhas críticas eram de alguma forma ouvidas e faziam as pessoas pensarem sobre os enormes excessos e abusos cometidos por aqueles que então tinham a unanimidade do país.

Eu sempre ressaltei, quando fazia minhas críticas, a grande importância da Operação Lava Jato, operação que desvendou um grau de capilaridade de corrupção que nenhum de nós poderia imaginar, nem o jornalismo investigativo, nem a Polícia Federal séria, nem o Ministério Público digno, nem a advocacia criminal. Porém, como trabalhamos desde o primeiro momento na Operação, sabíamos que existiam excessos evidentes e que cresciam no dia a dia: o uso demasiado das prisões preventivas, a destruição de um importante instituto que é a delação premiada, o uso indevido da mídia para pressionar o Poder Judiciário, a espetacularização do processo penal e a instrumentalização de parte do Ministério Público Federal e parte do Judiciário, comandada por este ex-juiz que pretendia não o Supremo Tribunal Federal, mas, sim, a Presidência da República, para atingir objetivos políticos, e não para fazer aquilo que nós advogados, procuradores e juízes sérios pretendemos e devemos fazer.

porém, que há uma diferença enorme entre tudo aquilo que sabíamos existir e o fato de ler e ouvir esses excessos sendo cristalizados, materializados. A matéria de hoje da Folha de São Paulo e do Intercept é chocante. É a prova incontestável de que este senhor, tido por chefe da Operação Lava Jato, mas que servia a um outro chefe, o ex-juiz responsável pela Operação, instrumentalizava, de forma vergonhosa, o poder do Ministério Público. Imagino a reação da quase totalidade dos membros do MP, que é séria e trabalha dentro dos limites constitucionais, ao se deparar com o fato de que um procurador com atuação em primeira instância explicita que coordenava uma investigação contra um ministro do Supremo Tribunal Federal, chegando a pedir ao chefe de gabinete do então Procurador-Geral que fornecesse o endereço da residência do Ministro para poder, certamente, encetar uma investigação que ele coordenava.

O que é o mais grave, quase humilhante, é ver este senhor, certamente junto com seus asseclas, ter a ousadia de se insurgir contra esposas de Ministros do Supremo. Aqueles Ministros que tiveram a coragem de conceder decisões garantindo direito constitucional não só foram perseguidos em conluio, em compadrio com parte da mídia, como também as suas esposas foram investigadas de forma absolutamente criminosa e vergonhosa.

Mais do que nunca, mostra-se adequada a decisão do Supremo Tribunal Federal quando determinou a paralisação das investigações que foram usadas com o ilegal, inconstitucional e abusivo uso dos órgãos estatais como COAF, Receita Federal, pois agora fica claro, para aqueles que não queriam ver, sem a menor sombra de dúvidas: procuradores, como esse que agora está exposto, usavam o COAF de forma agressiva para fazer uma perseguição pessoal, uma persecução criminal baseada no interesse pessoal, político, de um procurador chefe da força-tarefa. O que é a força-tarefa? Qual o seu sentido? Por que existir uma “equipe” que é privilegiada na imprensa, na divisão financeira interna do MP? Alguns procuradores são ungidos por um projeto político?

Da mesma forma, hoje se mostra de forma inquestionável que, 10 dias após a decisão do Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal, que fundamentadamente deu a liberdade a um ex-ministro do governo anterior, começou-se uma determinação interna de fazer uma devassa na vida do Ministro Toffoli e de sua esposa. Isso é inadmissível. Não há nenhuma sociedade organizada que possa suportar tal disparate, tal desfaçatez.

Hoje, imagino eu, mesmo dentro do MP, do Poder Judiciário, dos advogados, da sociedade civil organizada, será difícil encontrar quem permita a continuidade desse escárnio com a Constituição Federal.

Às vezes é necessário que tenhamos acesso à crueza de um diálogo exposto para entender a gravidade do que se fez com a República Brasileira. Nós, que somos críticos dos excessos, que são postos em petições com arrogância nessas operações, complementadas com as coletivas de imprensa, nas quais, sem a menor sombra de dúvida, a mídia nacional é usada, não só para expor e fragilizar o cidadão que está sendo investigado visando a uma delação futura, mas também para pressionar o Poder Judiciário para que todas as medidas coercitivas sejam deferidas, da mesma forma para tornar heróis esses então semideuses que coordenavam o Poder Judiciário e o Ministério Público Nacional.

Nós sabemos que isso era fruto de um projeto político. Basta ver que o verdadeiro Chefe da Força Tarefa, aquele que coordenava o Sr. Deltan, o ex-juiz Sergio Moro, hoje é Ministro do Governo que ele ajudou a eleger, que foi, na verdade, o principal cabo eleitoral ao decretar a prisão do principal opositor a esse presidente demente que hoje está exposto ao ridículo e expondo ao ridículo o Brasil frente aos fóruns internacionais.

Ouso chamar a atenção das pessoas, do cidadão brasileiro, para o seguinte fato: se tem esse grupo político do Ministério Público e do Poder Judiciário a ousadia de fazer o que está sendo explicitado de forma inequívoca com ministros do Supremo Tribunal Federal, com o Presidente do Supremo Tribunal Federal, o que não farão, e o que não fizeram, e o que não estão a fazer com o cidadão brasileiro, a fim de atingir seus objetivos políticos, seus objetivos escusos.

Há que se colocar um basta nisso, tudo tem limite! A Procuradoria-Geral da República deve se manifestar de uma forma independente e lembrar aqueles que ousam infringir de forma obscena a Constituição Federal de que nós ainda estamos num Estado Democrático de Direito.

Talvez os fatos ocorridos nos últimos dias, onde as inúmeras insanidades verbais do senhor Presidente da República quase fizeram com que deixássemos de levar a sério um instituto tão importante na democracia que é a Presidência da República, talvez esses excessos pareçam que vão obnubilar a realidade nacional. É difícil ser lúcido no país, é difícil acreditar nas instituições quando se tem o principal cargo do Brasil ocupado por alguém que ostensivamente despreza a Constituição, o bom senso, a razão, o decoro e a dignidade.

Mas isso não pode fazer com que fechemos os olhos para a necessidade de preservar outras instituições, como é o Ministério Público Federal, a quem devemos tanto, uma instituição tão séria composta certamente por 99% de abnegados brasileiros que se dedicam a cumprir a Constituição; e o Poder Judiciário, que não pode ser atingido por essa sanha obscena coordenada por juízes de menor valor intelectual, e por procuradores do mesmo naipe. Esperemos uma reação à altura de tantos abusos.

A politização do Sr. Deltan chega a tal ponto que ele pede para haver interferência junto ao Procurador-Geral da República e junto ao Supremo Tribunal Federal para impedir que um ministro do Superior Tribunal de Justiça, que estava sendo cotado pela mídia como indicação para ministro do Supremo Tribunal Federal, viesse a ser o indicado. É algo teratológico!

Apenas na cabeça de um procurador de primeira instância que se julgava dono do Ministério Público pelo poder excessivo que obteve junto à mídia nacional que ele pudesse ter a ousadia de tentar impedir que um nome de ministro do Superior Tribunal de Justiça fosse levado à consideração para ser examinado como ministro do Supremo. Até porque não havia absolutamente nada contra esse ministro, apenas aquilo que, no conhecimento do submundo da operação da lava-jato, no submundo da força-tarefa, os delatores e os coordenadores das delações premiadas, e os procuradores que coordenavam aquilo que interessava às delações e aquilo que queriam filtrar para as colaborações. Isso é muito grave!

Esses procuradores tinham um poder soberano sobre o Poder Judiciário, sobre o Ministério Público e até mesmo sobre o Brasil. Incentivavam delações premiadas contra determinadas pessoas, obrigavam os delatores a dizer tal ou qual nome, condicionavam aos delatores a falar de ciclano ou beltrano para que o acordo da delação pudesse avançar.

Aquilo que falávamos há 3 anos atrás de “ouvir dizer”, hoje está explicitado nas revelações feitas pelo Intercept e pelos valorosos jornalistas brasileiros que não se curvaram à pressão de uma imprensa que ainda está subjugada a este grupo. Isso é importantíssimo! Eles estavam manipulando os nomes que seriam submetidos ao Supremo Tribunal Federal a seu bel prazer. Uma delação que de fato não existia; que, se existisse, não estava homologada, mas eles já se pressupunham os donos até mesmo das indicações para o Supremo Tribunal Federal.

É algo inacreditável, lamentável, e que, ao vir agora à tona, deixa perplexa não só a comunidade jurídica nacional, mas a sociedade brasileira como um todo. Não são possíveis mais tantos desmandos. Precisamos reagir e acreditar que ainda é possível vivermos num Estado Democrático de Direito.

Antonio Carlos de Almeida Castro, Kakay

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