Circula de maneira viral pelas redes sociais uma foto da loja “Tião Material de Construção, Bar e Sorveteria”. Quem com meme ferra, e ferra um país, com meme será zombado: trata-se de uma troça com o ministério de Jair Bolsonaro. Na verdade, sobre os chamados “superministérios” do Capitão em Chefe, que vêm sendo formatados desde já e a título de combater a “crise ética, moral e econômica”.
Na imagem, a do boteco de departamentos do Tião, aparecem duas cadeiras de plástico para acomodar seus três discrepantes tipos de fregueses. Ou para um jogo de dança das cadeiras, já que, por matemática básica, alguém não poderá se acomodar.
“Eu tenho a impressão que vai aparecer dinheiro”, disse o general Augusto Heleno, futuro ministro da Defesa, sobre a decisão de Bolsonaro e equipe de promover fusões e aquisições no alto escalão do governo federal. Além de deixar aquela “impressão” de austeridade, tudo isso tem objetivos políticos de maior envergadura, e que não têm a menor graça.
A fusão do Ministério da Fazenda e do Ministério do Planejamento no Superministério da Economia, por exemplo, é a própria objetivação do espírito (como talvez dissesse um Hegel de Havaianas), da essência econômica do fascismo: um ordenamento político de atenções voltadas quase que exclusivamente para azeitar a concentração e a centralização capitalistas, por meio do capitalismo monopolista de Estado, ou seja, do absoluto domínio dos monopólios em um país – e, num país com as caraterísticas do Brasil, do latifúndio também.
Do latifúndio também: se a fusão de Fazenda e Planejamento espelha o paraíso dos monopólios, a aquisição dos biomas pelo “agronegócio”, operação batizada de “Superministério da Agricultura”, reflete um outro éden, ainda que sem jardim…
Mas o superministério da Justiça é aquele que vem causando maior frisson. O superministério dado a “Super Moro” irá incorporar à pasta da Justiça a recém-criada pasta da Segurança Pública, a Controladoria-Geral da União e o Conselho de Controle de Atividades Financeiras, órgão hoje subordinado ao Ministério da Fazenda.
A nota de Sergio Moro anunciando-se como superministro, dizendo que aceitou o cargo “para afastar riscos de retrocesso, por um bem maior”, indica que sua superpasta irá incorporar também a epígrafe extraoficial da operação Lava Jato: “was nicht passt, wird passend gemacht” (“Se não se encaixa, use um martelo maior”).
Se o TRF-4, lá atrás, decidiu que Moro não precisava seguir regras comuns, dada a “situação excepcional” da Lava Jato, o Capitão em Chefe parece ter acabado de anunciar Moro titular do Superministério de Varrer os Vermelhos, ou de Metralhar a Petralhada.
De modo que surpreende que “Super Moro” não tenha requisitado de lambuja para o superministério plasmado das suas costelas a incumbência de distribuir medalhas do Pacificador com Palma, glória distinguida no passado a Carlos Alberto Brilhante Ustra, Paulo Malhães e Sergio Paranhos Fleury.
“O extremista de direita eleito presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, ofereceu um cargo no novo governo ao juiz cuja investigação anticorrupção levou à prisão seu adversário político”, resumiu o jornal britânico The Times essa nossa apoteose do cinismo.
“Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará”, disse, em línguas, Jair Bolsonaro em seu primeiro pronunciamento como presidente eleito. Mas o que ocorre agora mesmo no Brasil, hoje, diante dos nossos olhos, é que, como já disse alguém, as verdades passam a morrer, sistematicamente, pregadas na cruz da utilidade circunstancial que o cinismo dos fascistas encontra para elas.